28.9.21

LIVROS DE JUNHO A SETEMBRO


Aqui estão os 18 livros lidos entre Junho e Setembro deste ano. No mesmo período no ano passado li 18 livros e no anterior foram 17.

Este ano, somando os 20 lidos de Janeiro a Maio já são 38 livros.

1 - A PEQUENA CAIXA DE GWENDY – Seguindo a meta de ler os 80 livros do mestre Stephen King, aqui mais um que se passa na pequena Castle Rock, onde King situa várias das suas obras (A Amazon tem uma ótima série com o nome Castle Rock). Acompanhamos a história de Gwendy Peterson, que aos doze anos recebe de um misterioso homem uma caixinha que realiza os seus desejos fazendo com que toda a sua vida se modifique.

2 - 68 CONTOS DE RAYMOND CARVER – Coletânea do autor americano que morreu em 1988 e que era saudado como o novo Tchekhov pela maestria na arte do conto. Alguns foram adaptados para as telas como as dez histórias de Short Cuts – Cenas da Vida,  de Robert Altman e o filme Birdman, do mexicano Alejandro Iñárritu, Oscar de melhor filme, que gira em torno de uma adaptação para o teatro do conto “Do que estamos falando quando falamos de amor”.

3 - DEPOIS – Mais um herói de Stephen King com talentos incomuns. Aqui temos o jovem James Conklin que desde criança vê gente morta, com o detalhe de que os mortos são incapazes de mentir para ele. Sua mãe, uma editora lésbica, faz de tudo para que o filho não espalhe esse segredo, mas a policial que é companheira da sua mãe tem outros planos e vai colocar o rapaz em perigo para desvendar o segredo de um terrorista morto.

4 - A MONTANHA MÁGICA – Este foi o terceiro e mais célebre livro que li do prêmio Nobel Thomas Mann e sua obra-prima, que segue a tradição do Bildungsroman (ou romance de formação), contando a experiência do jovem engenheiro Hans Castorp em sua passagem de sete anos por um sanatório para tuberculosos nos Alpes da Suíça e onde ele se relaciona com uma série de personagens que encarnam os conflitos espirituais e ideológicos que antecederam a Primeira Guerra Mundial.

5 - QUANDO A LUZ DO SOL DESAPARECER – Crônicas do baiano João Mendonça que aborda com suavidade memórias em torno da infância e das perdas. Há passagens inspiradas, como a do casal que se apaixona quando um deles se delicia ao sentir cheiro de manjericão quando estavam juntos até que passou a sentir enjôo desse cheiro e se intefressar pelo cheiro de jasmim, o que fatalmente levou ao fim do namoro.

6 - BATTLE ROYALE – Livro de Koushun Takami desclassificado do Japan Grand Prix Horror Novel pela excessiva violência. Há um filme japonês homônimo considerado por Quentin Tarantino como seu filme favorito. A adaptação americana foi cancelada pela semelhança com Jogos Vorazes. 24 casais de adolescentes são monitorados pelo governo totalitário numa ilha deserta para se matarem até que só sobreviva um. Derivou para série de jogos eletrônicos e mangás de sucesso.

7 - TRIPULAÇÃO DE ESQUELETOS – Outro livro de contos de Stephen King. Este tem 22 histórias e foi um dos poucos livros que me deram realmente medo. Destaques para O Nevoeiro, sobre pessoas que fogem de criaturas mortais de uma misteriosa neblina com duas adaptação para as telas. O Macaco é arrepiante e adaptado para a série Arquivo X. A Balsa está disponível como episódio da série Creepshow. O Processador de Palavras dos Deuses foi adaptado para a série Tales From the Darkside e Vovó foi o que me deu mais calafrios e a adaptação, disponível no Youtube, está à altura, é assustador.

8 - FELIZ ANO NOVO – Livro com 14 contos do premiadíssimo Rubem Fonseca, de 1975, que teve circulação proibida em todo Brasil e que foi recolhido pela Polícia Federal por supostamente ser contrário à moral e aos bons costumes. A linguagem crua do autor com personagens marginais, traições e muito sexo foram demais para um regime autoritário. O conto que dá título ao livro retrata a invasão de uma festa numa mansão, com direito a estupro e um final amoral.

9 - NOITES BRANCAS – Livro do período romântico de Dostoiévski anterior à sua prisão na Sibéria, o que se tornou um marco para a mudança do estilo do autor. A história se passa durante quatro noites em São Petersburgo quando um casal jovem se encontra numa ponte. Adaptada para o cinema pelos diretores Luchino Visconti e Robert Bresson. O final é romantismo puro na veia com este final lírico: “Meu Deus! Um momento pleno de felicidade! Será que isso é pouco para preencher uma vida humana?”       

10 - ZONA MORTA – Livro já adaptado como filme e depois como série. História de John Smith que, acorda de um coma causado por um acidente de carro depois de cinco anos com poder de ver o futuro apenas tocando em alguém o que o torna famoso levando a desvendar crimes e prever aparentemente o fim do mundo por conta da eleição de um político ambicioso. Ele fará de tudo para evitar que esse homem seja eleito.

11 - DECLÍNIO E QUEDA DO IMPÉRIO ROMANO – Obra espetacular e clássica que foi originalmente publicada em seis volumes, entre 1776 e 1778, Conta com riqueza de informações o período de Roma desde a época de Trajano e dos Antoninos no primeiro século depois de Cristo até a extinção do império romano do Ocidente, com a invasão de Roma no quarto século. A edição moderna foi editada focando nos aspectos mais relevantes. O autor definia a História como "pouco mais do que o registro dos crimes, loucuras e desventuras da humanidade".

12-ESCURIDÃO TOTAL SEM ESTRELAS – Quatro excelentes contos de Stephen King. O primeiro é 1922 (um filme ótimo na Netflix) mostrando a escolha trágica de um fazendeiro e seu filho sobre as terras e a vida da sua mãe. O conto Gigante do Volante fala da vingança de uma escritora após ser estuprada. Extensão Justa fala do pacto de um paciente com câncer que para se salvar destrói a vida de outra pessoa. O quarto conto, Um Bom Casamento, adaptado para o cinema mostra a descoberta de uma dona de casa de que seu marido é um serial killer perigoso.

13-PAPERBOY – Adaptado para o cinema com um superelenco e com o nome de Obsessão, (com John Cusack, Matthew McConaughey, Zac Efron e Nicole Kidman) mostra a história de um homem preso pelo homicídio de um xerife inescrupuloso. No corredor da morte recebe cartas de uma mulher que acredita na sua inocência e busca dois repórteres de um jornal que tentam provar que houve racismo na condenação. Muito intenso e violento.

14 – MATADOURO 5 – Um clássico moderno de Kurt Vonnegut que o tornou um dos escritores mais importantes da literatura norte-americana. A história da terrível destruição da cidade alemã de Dresden no fim da Segunda Guerra Mundial. Uma escrita criativa, às vezes muito divertida e psicodélica sobre Billy Pilgrim que sobreviveu à guerra, mas o que deixou com profundas marcas psicológicas. Obra publicada em 1969, em plena guerra do Vietnã e que tornou um marco da contracultura.

15-AS METAMORFOSES - Uma das obras mais famosas da literatura, considerada a magnum opus do poeta latino Ovídio. Li a tradução em Português em e-book do poema narrativo publicado originalmente no ano 8 d.C. Um verdadeiro compêndio de mais de 250  mitos gregos e romanos, tornando-o uma das obras mais influentes da cultura ocidental, tendo inspirado poemas, romances, óperas, peças de teatro, pinturas, esculturas e as mais variadas composições musicais.

16-MERIDIANO DE SANGUE - Obra prima de Cormac McCarthy, terceiro livro que li do autor após A Estrada e Onde os Velhos Não Vez. Escrevi um texto específico sobre o livro aqui no blog. Para o crítico e ensaísta Harold Bloom, em seu livro sobre os cânones literários mundiais, nenhum romancista norte-americano vivo oferecia um livro tão marcante e memorável como este.

17-OS CRIMES DO MONOGRAMA – Livro que resgata, pelas mãos da escritora Sophie Hannah, o detetive mais famoso da literatura, o belga Hercule Poirot, criado pela escritora inglês Agatha Christie. Toda o desenrolar da história é um novelo intrincado com três assassinatos num luxuoso hotel. Na boca de cada uma das vítimas o mesmo monograma. Só não dou 5 estrelas porque o investigador da Scotland Yard e narrador Edward Catchpool não precisava ser tão obtuso para destacar as famosas células cinzentas de Poirot.

18 - EU ROBÔ – Coletânea de 10 contos publicado em 1950 por Isaac Asimov que se tornou um marco da ficção científica introduz o universo da robótica que será adotado pelo autor ao longo de dezenas de obras clássicas. Os contos giram em torno da psicologia dos robôs.  O livro traz pela primeira vez, as célebres Três Leis da Robótica: os princípios que regem o comportamento dos robôs e que mudaram definitivamente a percepção que se tem sobre eles na literatura e na própria ciência.

18.9.21

MERIDIANO DE SANGUE

         Depois de ter lido dois livros de Cormac McCarthy (A Estrada e Onde os Velhos Não Têm Vez) tomei coragem para enfrentar o livro mais famoso do autor: Meridiano de Sangue, exemplar do puro estilo gótico sulista norte-americano, no qual também se encaixam os geniais William Faulkner e Herman Melville. 

           O crítico e ensaísta Harold Bloom, em seu livro sobre os cânones literários mundiais, diz que nenhum romancista norte-americano vivo oferecia um livro tão marcante e memorável como Meridiano de Sangue.

    Enfrentei uma das jornadas mais violentas, na verdade a mais sangrenta que já encarei num livro, acompanhando por quase 400 páginas a trajetória de um órfão de 14 anos (identificado no livro apenas como Kid) que foge de casa e, após inúmeros transtornos, adere ao grupo do violentíssimo caçador de índios John Joel Glanton, personagem histórico real que no século XIX era pago pelo governo para matar e escalpelar índios. A partir de certo ponto, os assassinos não fazem mais diferença entre índios e brancos e o número de escalpos cresce geometricamente.

      O caminho dos personagens pela fronteira Oeste dos EUA e o México é descrito com muitos detalhes pelo autor, levando-nos a mergulhar naquele ambiente desértico que se assemelha a um inferno na terra, com direito à companhia de um dos personagens mais enigmáticos e asquerosos de toda a literatura mundial: o albino juiz Holden, uma espécie de representação pura do mal.

          Se existe um demônio na literatura, o juiz Holden foi seu professor, um homem perigoso, com quase dois metros de altura, fortíssimo, inteligentíssimo, poliglota, sem um único pelo no corpo e capaz de matar cãezinhos ou estuprar crianças sem piscar um olho.

        Se algum leitor se assustou com as mentes distorcidas de personagens como o Capitão Ahab, de Moby Dick de Herman Melville ou o Coronel Kurtz de Coração das Trevas, de Joseph Conrad, deve multiplicar isso ao infinito para chegar perto do juiz Holden para quem “Tudo que na criação existe sem meu conhecimento existe sem meu consentimento” e “A lei moral é uma invenção da humanidade para destituir de seus direitos os fortes em favor dos fracos”.

          O livro é difícil, não pela sua linguagem que é linear, mas que pode ser estranha a princípio, mas o leitor logo se acostuma com a estrutura de diálogos diretos e sem travessões ou aspas para indicar a interlocução e que lembra o estilo de José Saramago. A real dificuldade está em encarar cenas de violência extremamente gráficas e de uma brutalidade atroz.

          Engana-se, entretanto, quem pensa que a violência do livro é gratuita. Muito forte, sim, mas jamais gratuita. Estamos no meio de homens capazes de tudo, embrutecidos pelo ambiente hostil em que vivem ou sobrevivem, sem qualquer resquício de humanidade ou empatia, enfronhados na sede e fome; na seca ou na lama; no frio e calor extremos. Matar e morrer são meros detalhes.

      Mesmo com a violência gráfica e descrição de massacres, o livro consegue alternar momentos do lirismo mais puro. E consegue também um misto das duas coisas, como na passagem: “Cavalgaram pela estrada norte como qualquer grupo com destino a El Paso, mas antes até que chegassem a sumir de vista da cidade desviaram suas montarias trágicas para o oeste e seguiram insensatos e meio desatinados em direção ao término vermelho daquele dia, em direção às terras crepusculares e ao distante pandemônio do sol”.


11.9.21

EU ME IMPORTO

         Este filme da Netflix é daqueles em que você percebe exatamente em que momento a história desandou. Tinha tudo para ser nota dez, mas em certo momento, o diretor se perdeu ou, como dizia minha avó: “o fubá encaroçou”.

O elenco é de primeira: Rosamund Pike (eterna Garota Exemplar) como a protagonista/vilã, o que é a sua zona de conforto, e Peter Dinklage (eterno Tyrion Lannister) como anti-herói de caráter suspeito, que é a sua praia também, convenhamos. E no em meio dessa guerra de titãs temos Dianne Wiest, coadjuvante de luxo que poderia ser mais aproveitada com a personagem com mais nuances e menos caricaturas.

A arapuca do filme está justamente no momento em que, para uma solução do roteiro, a personagem de West dá uma sumida....É aí que o filme desanda e o que seria um plot twist vira uma barriga. Não é mais o filme que queríamos ver nem o que estávamos esperando.

         Veja bem, nada tenho contra os plot twists, pelo contrário, se bem usados podem ser o oxigênio de um filme, mas também podem matar a história. O filme é vendido como comédia, mas tem tantos elementos de drama que está mais para um thriller psicológico.

         O filme me causou muito incômodo e a personagem monolítica e amoral de Rosamund Pike chegou a me despertar nojo de tanto que fiquei perplexo com suas manobras. Ou a atriz não conseguiu furar a casca grossa da personagem ou não se esforçou para conseguir dar um pouco de nuance a alguém tão vil que vive de destruir vidas e economias de velhinhos indefesos sem demonstrar qualquer arrependimento ou empatia.

Uma das coisas que mais abomino em qualquer filme ou livro é o recurso mais manjado de todos os tempos: o Deus ex machina, artifício originado no teatro grego, literalmente “deus surgido da máquina”, como solução fácil de roteiro para terminar uma obra fugindo da responsabilidade de resolução do drama com recursos dos conflitos internos do próprio texto. Aqui temos esse final preguiçoso.

         O filme me ganhou até a metade, me perdeu no meio e me irritou no fim.