29.12.21

LEITURAS DE OUTUBRO A DEZEMBRO

Há três anos resolvi anotar os livros lidos no ano. Sempre fui rato de bibliotecas, livrarias e sebos e maníaco por comprar livros. 

Adoro a textura do papel e o cheiro do exemplar novo. Após o Kindle, passei a consumir avidamente livros digitais que têm a vantagem da leveza e por não ter mais espaço na minha casa para livros que passaram de mil.

Em 2018 li 40. Em 2019 foram 68 exemplares e em 2020, 61 livros. Publiquei todos no blog. 

Aqui estão os 17 que li de Outubro a Dezembro. Foram 20 de Janeiro a Maio e 18 de Junho a Setembro. Total: 55 livros em 2021.

CRÔNICA DA CASA ASSASSINADA- Há anos tentava ler este livro de Lúcio Cardoso, escrito em 1958 e fora de catálogo há anos. Em 2021 a Companhia das Letras relançou a obra que se tornou o melhor livro brasileiro que li na minha vida, empatado com Grande Serão, Veredas e desbancando Dom Casmurro e Memórias Póstumas de Brás Cubas. Escrevi uma elogiosa resenha no blog sobre a história que gira em torno de uma família decadente no interior de Minas com ecos do romance gótico norte-americano O Som e a Fúria, de William Faulkner e de O Morro dos Ventos Uivantes, de Emily Brontë.

BILLY SUMMERS – A história de um matador de aluguel decidido a encerra sua carreira foi o último romance lançado pelo mestre do terror Stephen King. Dos 34 livros que li do autor, este é o mais fraco. Escrevi uma resenha no meu blog. O livro se arrasta com inúmeros detalhes desnecessários que em literatura tem o horrível nome de reiteração, um pecado a ser evitado pelo mais primário dos escritores, o que dirá de um mestre. Até a tradução foi lamentável. Publiquei num grupo de fãs de King no Facebook e recebi elogios (privados) e críticas raivosas (públicas) dos fãs que disseram não ver diferença entre as palavras fãs e fanáticos.

O HOMEM BICENTENÁRIO Baixei todos os livros que pude de Isaac Asimov, conhecido como “O Bom Doutor”. Tenho planos de ler o máximo de obras dele, o que é impossível já que o autor publicou quase 500 livros de vários gêneros. Ainda não li sua obra máxima, Fundação, composta de sete volumes, mas já li Eu, Robô, coletânea de 10 contos. Este é composto de 12 contos, incluindo o que dá título ao livro, e também adaptado para o cinema que conta a história de um robô que deseja ser um ser humano e utiliza-se de todos os recursos da psicologia robótica e das brechas das 3 Leis da Robótica, criações do próprio Asimov.

O ESPELHO E A LUZ – Terceiro livro da britânica Hillary Mantel sobre o sombrio Thomas Cromwell, homem de confiança máxima do rei Henrique VIII. Já havia lido as duas primeiras obras dessa série (Wolf Hall e Tragam os Corpos). A autora conquistou o prêmio mais importante da língua inglesa, o Booker Prize,  a única mulher a ganhá-lo duas vezes e com romances históricos. Acompanhamos a vida de Cromwell desde a infância miserável até ser o segundo homem mais influente do reinado de Henrique VIII. Poucos personagens históricos foram tão astuciosos e enigmáticos. Este volume tem 768 páginas (os outros têm, juntos 890).

ESTE LADO DO PARAÍSO Romance de estreia de F. Scott Fitzgerald. A obra fez enorme sucesso ao ser publicado em 1920 e retrata uma geração jovem desiludida. O personagem principal é um jovem bem-nascido cercado de privilégios, mas com uma obsessão por prestígio. O livro tem forte tom autobiográfico com a fina ironia, marca registrada de Fitzgerald. Já havia lido dele o livro de contos O Diamante do Tamanho do Ritz e a edição que reúne 24 dos seus melhores contos. A melhor leitura foi a do seu romance O Grande Gatsby, adaptada para o cinema duas vezes (com Robert Redford e Leonardo Di Caprio no papel-título).  

O ADULTO Livro com o conto vencedor do disputado prêmio Edgar Alan Poe Award em 2015 da autora Gillian Flynn, de quem já li os excelentes A Garota Genial e Objetos Cortantes, o primeiro adaptado para o cinema com grande sucesso e o segundo uma série premiada da HBO. Conta a história de uma jovem que ganha a vida com pequenos roubos até migrar para o trabalho como vidente quando se envolve com uma família estranhíssima em uma casa supostamente assombrada.  Quem gosta da Gillian Flynn romancista tem a chance de conhecê-la como contista. Pretendo ler da autora o livro Lugares Escuros, que já foi adaptado para as telas.

A MORTE DE IVAN ILITCH – Novela de Liev Tolstói publicada em 1886 e considerada uma obra-prima da literatura, conta a história de um juiz na Rússia e seus sofrimentos e morte por uma doença dolorosa. Uma poderosa reflexão sobre a morte. Já havia lido esta novela, mas não me lembrava de muita coisa e foi um dos raros livros relidos na vida ao lado de O Perfume e Memórias de Adriano. Só havia lido de Tolstói o seu clássico Anna Karenina, várias vezes adaptado para o cinema e ainda tenho planos de ler o tijolaço Guerra e Paz num dia em que tiver coragem suficiente.

SONATA A KREUZTER - Depois de reler A Morte de Ivan Ilitch, peguei o embalo de ler Tolstói e emendei com outra novela célebre, homenagem à Sonata para Violino e Piano de Beethoven. Um curto romance focado no diálogo de dois homens numa viagem de trem abordando as relações entre homem e mulher. Uma das obras mais controversas do autor, em que um personagem homicida e absolutamente repugnante é usado para dar voz aos sentimentos misóginos de Tolstói que considerava as mulheres como criaturas superficiais e manipuladoras.

SENHOR E SERVO Não sei o que aconteceu comigo que esqueci os contos de Tolstói. Reli este terceira novela que se passa na Rússia czarista. Um rico e avarento proprietário de terras parte numa curta viagem de trenó com um servo altamente submisso durante uma fortíssima nevasca. Ambos de perdem no caminho e desorientados veem-se à beira da morte por hipotermia e neste momento as relações sociais são expostas no limite.

A FELICIDADE CONJUGAL - A quarta novela de Tolstói que reli. Na primeira parte, uma rica jovem de 17 anos descreve sua descoberta do amor por um homem vinte anos mais velho e na segunda parte, casados, percebem que as diferenças entre eles ganham força e começam a prejudicar a relação com a esposa querendo frequentar a corte e a metrópole e o marido preferindo uma vida simples no campo. Lembra a história de Madame Bovary de Flaubert, publicada poucos anos antes, mas Tolstói dá outro rumo à sua “heroína”.

 

ONDE ESTÁ O AMOR DEUS AI ESTÁ Uma história curta de Tolstói que não havia lido ainda. Um conto sobre Martyn Avdeitch, um sapateiro velhinho conhecido por sua honestidade e que, ao perder esposa e todos os seus filhos, vê-se sem vontade de viver e começa a reclamar contra Deus e a perder o pouco de fé que tinha até descobrir o valor da caridade e da Bíblia. Um contraponto extremo ao conto de outro autor russo, Dostoévski: A Árvore de Natal de Cristo.


A ESTRADA DA NOITE O segundo livro que li do autor Joe Hill (após NOS4A2, código de Nosferatu, já adaptado para série) e que tem a carga de tensão dos livros do pai Stephen King. História de um roqueiro decadente que coleciona objetos ligados a mortes violentas. Um assessor compra um paletó que vem acompanhado de um fantasma. A partir dessa premissa aparentemente boba, o livro se desenvolve numa tensão de perseguição frenética recheada de mortes e assombro. A descoberta do passado brutal do fantasma, aos poucos mostra que a história é muito mais perigosa do que pensávamos. Excelente enredo que também merece virar série.

A PALAVRA QUE RESTA Romance de estreia do cearense Stênio Gardel de uma sensibilidade acachapante História do amor proibido de dois rapazes no interior do Brasil. No começo do livro, conhecemos Raimundo, analfabeto, aos 71 anos, que carrega por décadas, a carta do seu único amor, o amigo de infância Cícero, de quem teve que se separar de forma abrupta e violenta quando os pais descobrem o romance. Acompanhamos o que levou Raimundo a aprender a ler para descobrir as últimas palavras do seu amor. Belo e tristíssimo, um libelo contra o preconceito.

A ABADIA DE NORTHANGER – Primeiro livro que li de Jane Austen, autora que é uma unanimidade, vide o belíssimo filme “O Clube da Leitura de Jane Austen”. Não sei por que não li ainda suas obras primas como Orgulho e Preconceito, Mansfield Park, Razão e Sensibilidade, Emma e Persuasão, todos adaptados para o cinema. Uma sátira sutil inspirada na aristocracia inglesa. O enredo gira em torno da ingênua jovem Catherine, apaixonada por romances góticos. O livro é considerado o “Dom Quixote da literatura inglesa”, pela obsessão lunática do personagem de Cervantes pelos romances de cavalaria.

O MÉDICO E O MONSTRO – Clássico livro de mistério do escocês Robert Louis Stevenson publicado em 1886, está entre os maiores exemplos de literatura vitoriana. O puritano Dr. Jekyll busca experimentar o que a sociedade conservadora não permitia e cria o Sr. Hide, até não conseguir se livrar do monstro, como se viver o proibido incapacitasse alguém de voltar ao armário do puritanismo (há uma avaliação sobre a possível homossexualidade do Dr. Jekyll. O livro gira em torno da figura do duplo, tema abordado por Freud e visto em obras com referências na cultura pop como O Clube da LutaO Homem Duplicado (de José Saramago), O Retrato de Dorian Gray (de Oscar Wilde) e até O Incrível Hulk.

JOGO PERIGOSO - O 35º livro de Stephen King que li e está entre os mais angustiantes que já li na vida, ao lado de Quando os Adams Saíram de Férias e Johnny Vai à Guerra. Originou filme homônimo com a história de Jessie, que durante uma brincadeira sexual com o marido Gerald é algemada à cama. Subitamente, ele morre de ataque cardíaco deixando Jessie presa sem qualquer esperança de liberdade. São mais de 300 páginas de pura aflição em que Jessie sente sede, terror e todas as dores possíveis de câimbras devido à longa imobilidade — quem já teve câimbras sabe a dor que causam. Não é um livro para estômagos fracos. 

SEREI SEMPRE O TEU ABRIGO O primeiro livro que li do premiado autor português Valter Hugo Mãe. Publicado num belíssimo projeto gráfico, papel de qualidade e lindas ilustrações . Com extrema sensibilidade, Valter Hugo Mãe nos faz acompanhar o amor dos avós pelo neto e um pelo outro. Um belo trecho diz: “Alguém disse que, em segredo, exatamente deitada para dormir, a avó chorou uma lágrima apenas, e de imediato floriu em seu olhar. Uma flor azul que se levantou do rosto, como a própria lua em redor da cabeça. Tanta coisa era mágica na sua vida. Até a tristeza. Eu nunca duvidei”. 

30.11.21

LEITURAS ABANDONADAS - 2ª PARTE

 

Há algum tempo escrevi um texto com o nome de Leituras Abandonadas, sobre cinco livros cuja leitura não conclui. Não são muitos os que abandonei, não somente porque resisto em largar uma obra pelo meio, acreditando que a leitura vai me seduzir em certo momento, mas por um faro para identificar bons livros a partir de autores ou temas que me interessam.

Há tempos meu ritmo de leitura tem sido intenso. Há quatro anos leio, em média, quatro livros por mês. Mas no meio do caminho.... Como disse, no primeiro texto, havia Ulisses  (de James Joyce), O Pêndulo de Foucault (de Umberto Eco), Carol (de Patricia Highsmith), O Som e a Fúria (de William Faulkner) e Orientalismo (de Edward Said). Falei dos motivos pelos quais abandonei cada um naquele post.

Mas, à medida que o número de livros lidos aumentou, também aumentaram os abandonos. Eis os cinco novos abandonados. Quatro viraram filmes e dois dos filmes me fizeram largar os respectivos livros.

ENTREVISTA COM O VAMPIRO - Primeiro e único livro que tentei ler da autora Anne Rice que tem uma série de livros sobre vampiros, algo que em si já me agrada. O filme é excelente (com Tom Cruise, Brad Pitt, Christian Slater, Antonio Banderas e direção do genial Neil Jordan) e tive o privilégio de assistir no cinema pela primeira vez em São Francisco, onde foi filmado. A tradução é de ninguém menos do que da divina Clarice Lispector. Tinha como ser ruim?  Não tinha. Mas detestei. Dei uma segunda chance e retomei a leitura depois, mas a linguagem excessivamente barroca me deu até enjoo. Se depender de mim, Anne Rice não passa na minha porta!

BUTCHER BOY – INFÂNCIA SANGRENTA – Primeiro livro e único que tentei ler do irlandês Patrick McCabe. Ao contrário do barroco Entrevista com o Vampiro, aqui a linguagem é crua e experimental, girando em torno do crescimento disfuncional de uma criança na tradicional Irlanda,  com generosas doses de violência, alcoolismo e doença mental. Tinha tudo para ser um ótimo livro, mas a narrativa construída como se estivéssemos dentro da cabeça da criança, com erros de concordância, tiques e repetições, me irritou. Talvez eu dê uma segunda chance ao livro que tem muitos admiradores, como Neil Jordan (diretor de Entrevista com o Vampiro), que o adaptou para o cinema no excelente Nó na Garganta.

CLUBE DA LUTA – Outro livro que virou filme e que não consegui gostar da leitura,  abandonada antes da metade, conta a história de um homem com insônia crônica e que finge ser alguém com enfermidades graves em diversos grupos de apoio. De autoria do americano Chuck Palahniuk, talvez já saber o “segredo” da história através do ótimo filme com Brad Pitt e Edward Norton e direção de David Fincher (dos filmes consagrados Seven e Garota Exemplar) tenha me desestimulado. Já soube que há diferenças entre livro e filme e como tenho outros livros do autor talvez dê uma segunda chance no futuro, já que quero me aventurar mais pela sua escrita muito criativa com temas ousados.

GONE, BABY, GONE – O quarto livro desta série que também virou filme que foi dirigido por Ben Affleck, com Morgan Freeman e Ed Harris  no elenco e com  subtítulo no cinema de Medo da Verdade. Gosto muito do estilo do autor Dennis Lehane de quem já li o excelente Sobre Meninos de Lobos (também adaptado para as telas, assim como Ilha do Medo). Saber do final da história pelo filme me fez desistir da leitura logo no começo. O filme tem um final muito anticlimático e frustrante e imaginei que iria ler mais de 450 páginas para me irritar no fim. Ok, as histórias dos livros de Dennis Lehane não são exatamente chá com bolinho, mas já vi o filme. Então me basta de sofrer.

PORQUE LER OS CLÁSSICOS – Adoro os livros do cubano Ítalo Calvino e dois deles estão na minha lista de favoritos da vida (As Cidades Invisíveis e Se um Viajante Numa Noite de Inverno). Este aqui não é um livro de ficção, não virou filme e jamais viraria, por ser um livro que trata de outros livros clássicos. Apesar do bom humor do autor que diz que a razão definitiva para ler os clássicos é tão simples como as grandes verdades: lê-los é melhor do que não os ler", ainda não me sinto preparado para usufruir devidamente desta obra. Farei isso quando crescer. Doei meu exemplar para minha amiga Márcia Magalhães, que na primeira oportunidade, exibindo sua sapiência, jogou na minha cara: “Ah eu estou adorando, não sei por que você não gostou”!

4.11.21

DE VOLTA À MOSTRA INTERNACIONAL DE CINEMA DE SÃO PAULO

Após o lapso de um ano por conta da pandemia, estou de volta à Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, a 45ª Mostra e a minha 19ª. Comprei a credencial para 30 filmes por R$ 340,00, uma pechincha já que cada filme saiu por pouco mais de R$ 11,00. A inteira custa R$ 24,00 e R$ 30,00 (quinta a domingo). Dos quase 280 filmes disponíveis, vi 33.

Novamente constato que esta é a melhor parte do ano para mim, enfurnado numa sala escura de cinema, saindo de um filme para entrar em outro, me deliciando com películas do mundo inteiro e ainda sendo capaz de me surpreender, enternecer e até ter ânsias de vômito com cenas oriundas das mais diversas partes do mundo. Após tantos anos, ver um filme de países de onde jamais havia visto filmes antes, como neste ano, de Malta e do Quirguistão é sempre uma experiência única.

Aqui estão os que assisti neste ano, não na ordem em que vi, mas na ordem de preferências. Os iranianos como sempre espetaculares.

1- PEGANDO A ESTRADA- O  melhor filme que vi na Mostra. Uma produção iraniana sobre uma família caótica e muito afetuosa que viaja por uma paisagem acidentada. Aos poucos ficamos sabendo para onde eles vão. No banco de trás, o pai está com uma perna quebrada e engessada. A mãe tenta rir ao mesmo tempo em que não consegue conter as lágrimas. O filho mais novo, que rouba o filme, um ator mirim extremamente carismático faz todos rirem no carro. Todos eles estão preocupados com o cachorro doente e irritando uns aos outros. Apenas o misterioso irmão mais velho permanece quieto. A direção exibe ao mesmo tempo com maestria tanto o ambiente claustrofóbico de dentro do carro quanto cenas ao ar livre num campo aberto onde várias situações ocorrem ao mesmo tempo sem que a câmera mude o plano único. Extremamente sensível e emocionante.

2-SEM ESCOLHA – O segundo melhor que vi na Mostra este ano e também um filme do Irã que trata magistralmente dos conflitos e dramas sociais dos pobres daquele país. Golbahar é uma garota de 16 anos vendida pelo namorado marginal a um homem de meia-idade para ter um filho dele. Como ela não engravida, exames médicos são feitos e o casal descobre que as trompas da garota foram ligadas em uma cirurgia sem seu conhecimento, possivelmente resultado de um plano nacional não oficial de controle da crescente população sem-teto no Irã. A busca de Golbahar a levará à ginecologista responsável pela operação através de uma advogada obstinada em um processo judicial cheio de tensão. A direção faz excelentes contrastes das imagens que se passam na rua e as que se passam dentro de prédios públicos ou apartamentos.

3- GREAT FREEDOM- Uma coprodução da Áustria e Alemanha e vencedor do Prêmio do Júri da Seção “Um Certo Olhar do Festival de Cannes”. Na Alemanha do pós-guerra, Hans é constantemente preso por ser homossexual. Devido ao Parágrafo 175 do código penal alemão, que tornava atos homossexuais entre homens um crime, sua liberdade é destruída de forma sistemática. O único relacionamento estável em sua vida será com seu companheiro de cela de longa data, Viktor, um assassino condenado. O que começa como repulsa se transformará em amor. Um filme belo e triste.

4- O MENINO MAIS LINDO DO MUNDO- Documentário perfeito da Suécia. Cinquenta anos após a estreia como pré-adolescente em Morte em Veneza, Björn Andrésen, o antigo astro que interpretou o lendário personagem Tadzio na obra-prima de Luchino Visconti, nos conduz em uma jornada em que memórias pessoais, história do cinema, sucesso e tragédias se confundem, nesta que talvez seja a última tentativa de Björn de finalmente colocar a sua vida de volta nos trilhos.  Os dramas que o jovem ator passou após a retumbante estreia em Morte em Veneza são das coisas mais tristes possíveis e eu que adoro o filme nunca imaginei que isto tivesse acontecido com ele.

5- AO CAIR DO SOL - Com Tim Roth e Charlotte Gainsbourg. A morte da matriarca interrompe as férias da rica família Bennett em Acapulco e os convoca de volta ao Reino Unido, as tensões latentes entre os irmãos descendentes Alice e Neil aumentam e o delicado equilíbrio da família, aparentemente unida, é perturbado de maneira irrevogável. É muito interessante acompanhar o desenvolvimento da trama uma vez que não se sabem as motivações do personagem de Tim Roth para não acompanhar os familiares de volta a Londres e para permanecer em Acapulco, trocando o resort de luxo por um hotel chinfrim e se embriagando sem parar. Ao descobrirmos a razão não há como não considerar a história espetacular. Infelizmente tenho uma antipatia ancestral pela atriz Charlotte Gainsbourg que para mim faz sempre o mesmo papel em todos os filmes.

6- SEM ABAN – Mais um filme do Irã. Aban é um guarda florestal com o casamento programado. Enquanto persegue contrabandistas de madeira, encontra o cadáver de uma garotinha. Todos suspeitam de que ele seja o responsável por essa morte, mas Aban nega. Mesmo assim, admite ter matado uma garota 15 anos atrás numa situação semelhante, enterrando o corpo em segredo. A polícia pede provas ou documentos, mas ele não tem nada para apresentar e o local onde teria enterrado a menina se transformou numa rodovia.

7- UM HERÓI – Produção do Irã e da França que foi Vencedor do Grand Prix do Festival de Cannes.  Rahim está na prisão por causa de uma dívida que não conseguiu pagar. Durante uma licença de dois dias, ele tenta convencer o seu credor a retirar a reclamação contra o pagamento de parte da quantia. Mas as coisas não saem como o planejado. O filme mostra como uma mentira mesmo que aparentemente com boas intenções e inocente pode gerar outras mentiras maiores e ter consequências dramáticas. Fico sempre de queixo caído com a capacidade do cinema iraniano em ser tão pulsante,  autoral e surpreendente.

8- A PORTA AO LADO – Filme da Alemanha dirigido e estrelado pelo ator Daniel Brühl (de Capitão e Adeus Lênin). Ele interpreta um astro do cinema alemão acostumado ao sucesso. Seu apartamento é estiloso, assim como sua esposa. Ele está prestes a fazer um teste em Londres para um papel importante, mas entrando em um bar, encontra Bruno. Como transparece a cada minuto, Bruno espera por esse momento há muito tempo. E então esse homem, eternamente esquecido, um dos perdedores da reunificação e uma vítima da gentrificação do que uma vez foi Berlim Oriental, inicia sua vingança.

9- TRUMAN & TENNESSEE: UMA CONVERSA PESSOAL- Um documentário norte americano imperdível sobre o trabalho brilhante, as lutas pessoais e o impacto cultural dos escritores norte-americanos Truman Capote e Tennessee Williams por meio de uma colagem de entrevistas, depoimentos e fotos, além de trechos das adaptações cinematográficas mais memoráveis da dupla: Uma Rua Chamada Desejo, Gata em Teto de Zinco Quente, À Margem da Vida, Bonequinha de Luxo e A Sangue Frio. Com vozes dos atores Jim Parsons e Zachary Quinto, o filme mostra a amizade turbulenta dos dois homens e a maneira como suas identidades, enquanto sulistas e gays, influenciaram suas criações artísticas e seus relacionamentos.

10 - A CRÔNICA FRANCESA - Coprodução do Reino Unido, França e Alemanha- Na ocasião da morte do editor Arthur Howitzer Jr., a equipe da Crônica Francesa, uma revista americana de ampla circulação sediada numa cidade fictícia da França, se reúne para escrever o obituário do jornalista. Direção do sempre espetacular Wes Anderson e com elenco cheio de oscars como Adrien Brody, Tilda Swinton, Frances McDormand, Timothée Chalamet, Bill Murray, Owen Wilson, Christoph Waltz, Edward Norton e Anjelica Huston. Dá vontade de ver o filme uma segunda vez porque é impossível acompanhar os excelentes diálogos e a exuberante produção de cenários e direção de arte, marcas do diretor que se dá ao luxo de por atores como William Defoe para fazer uma ponta.

11-ESTRADA PARA O ÉDEN – Filme do Quirguistão que conta a história do velho escritor aposentado Kubat que está vivendo seus últimos dias de fama e pobreza em uma sociedade que se preocupa cada vez mais com riqueza. Viúvo e sem filhos, seu único desejo é que a literatura continue a iluminar seu pequeno e desiludido país. Ele vê a possibilidade da continuidade de seus ideais em Sapar, um jovem amigo e talentoso escritor que está muito doente e precisa de um tratamento caro. Quando Kubat decide vender seu apartamento para salvar a vida de Sapar, descobre que seu irmão mais jovem foi espancado por conta de suas dívidas. Kubat, então, fica dividido entre ajudar Sapar e proteger seu parente.

12-NA PRISÃO EVIN- Mais um filme do Irã. Amen é uma mulher trans. Após se mudar de uma pequena cidade para Teerã, ela está otimista com os planos de fazer uma cirurgia de redesignação de gênero. Ela, então, conhece um homem rico que promete pagar pelo procedimento. Mas, para isso, ele impõe uma condição, que acaba sendo pior do que Amen suspeita e que a coloca em meio às intrigas da elite do país.

13-UNCLENCHING THE FISTS- Produção da Rússia. No alto das montanhas da Ossétia do Norte, está uma cidadezinha mineira para onde um pai se muda com os filhos. O velho impõe uma disciplina que nao vê diferença entre cuidado e superproteção.  O filho mais velho fugiu para trabalhar numa cidade grande, o irmão mais novo não sabe o que quer da vida, enquanto a irmã, Ada, planeja escapar desse ambiente. Embora seja uma mulher adulta, seu pai a trata como uma criança. Ela logo percebe que será muito difícil se desvencilhar dos laços paternos para começar sua própria vida. Vencedor da Seção “Um Certo Olhar do Festival de Cannes”

14-ZALAVA- Mais um ótimo filme do Irã. Em 1978, os habitantes de uma pequena cidade chamada Zalava acreditam que um demônio ronda a região. O jovem sargento que investiga o caso encontra um exorcista tentando expulsar o tal demônio da cidadezinha. Ele prende esse homem por suposta fraude, mas subitamente se encontra preso numa casa amaldiçoada com a mulher que ama. Os moradores acreditam que os dois estão possuídos e decidem matá-los. Vencedor da Semana da Crítica do Festival de Veneza.


 

15-O ATLAS DOS PÁSSAROS - Produção da Republica Tcheca. O sumiço repentino de uma grande quantidade de dinheiro em uma empresa multimilionária cria uma cadeia de suspeitas entre os membros da família que dirigem o negócio. Enquanto o longevo CEO da companhia, e sua família procuram o culpado, Marie, uma de suas funcionárias de maior confiança, desaparece. Um plano de vingança, sabotagem corporativa ou uma eficiente fraude virtual? Uma coisa é certa: alguém entre eles não é confiável.

16-IRMÃS SIAMESAS- Filme da Argentina. Clota e Stella são mãe e filha. Elas moram sozinhas em uma antiga casa da família, confinadas a uma rotina particular. Um dia, Stella recebe a notícia de que seu pai morreu e ela herdou dois pequenos apartamentos localizados em uma desolada cidade litorânea. Stella decide, então, fazer uma viagem para descobrir esse milagre, que aparece como sua última chance de finalmente se tornar independente. Clota, porém, enxerga nessa situação uma assustadora possibilidade de separação.

17-A VINGANÇA É MINHA, TODOS OS OUTROS PAGAM EM DINHEIRO- Produção da Indonésia e Singapura. Ajo é um lutador que não teme nada, nem mesmo a morte. Sua fúria em lutar é impulsionada por um segredo: a impotência. Quando seu caminho cruza com o da lutadora Iteung, ele é espancado de maneira humilhante mas ambos se apaixonam.  Essa escolha não o fará ter uma vida feliz e encontrar sua própria paz de espírito facilmente. Vencedor do Leopardo de Ouro no Festival de Locarno.

18-ANTÍGONA 442 a.C – Filme brasileiro com a atriz Andréa Beltrão, adaptação para as telas a partir do texto teatral levado pela atriz aos palcos contando a história da princesa filha de Édipo e Jocasta que na Grécia antiga enfrenta a ordem do rei, que determina que um de seus irmãos que lutou na guerra fique sem sepultura. Antígona enterra o irmão e, por isso, paga com a própria vida. O ato de Antígona é sagrado, obedece à lei humana de cuidar dos nossos mortos. Inspirado na peça teatral de Sófocles.

19-ENTRE ÁGUAS - Primeiro filme que vi de Malta. Vencedor do prêmio especial de melhor atuação no Festival de Sundance. O excelente e belíssimo ator premiado Jesmark Scicluna interpreta um pescador maltês que sofre com um vazamento em seu barco. Com dificuldades financeiras, ele vê seu trabalho que é tradição familiar estar em perigo devido às safras ruins de peixes, à impiedosa indústria pesqueira e a um ecossistema fragilizado. Desesperado e precisando sustentar a esposa e o filho recém-nascido com necessidades especiais para alimentação e tratamento, ele acaba ingressando no mercado da pesca ilegal para sobreviver.

20-ANNETTE - Produção da França e EUA. Um musical vencedor do prêmio de melhor direção no Festival de Cannes. Um elenco formado por nomes conhecidos (Adam Driver, Marion Cotillard) são um casal aparentemente perfeito e no auge do sucesso. Ele é um provocador comediante de stand-up e ela uma cantora de ópera famosa internacionalmente. Ambos têm uma vida glamourosa numa Los Angeles contemporânea. No entanto, o nascimento de Annette, a filha dos dois, e o surgimento dos misteriosos dons da garotinha mudarão para sempre a trajetória dessa família. Seria perfeito se as músicas fossem melhores já que num musical a trilha sonora é praticamente o principal como em filmes como Hair, Chicago, Mamma Mia e Moulin Rouge.



21-TITANE- Filme da França que foi o grande vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes sendo a primeira vez que um filme dirigido por uma mulher ganhou esse prêmio. Uma jovem com o rosto ferido é descoberta em um aeroporto. Ela afirma ser Adrien, uma criança que desapareceu há dez anos. No momento em que ele finalmente reencontra o pai do menino, terríveis assassinatos se acumulam na região. Filme muito forte com cenas de revirar o estômago de tão cruas e violentas.

22-AUSÊNCIA- Produção do Irã, República Tcheca e Eslováquia- Rouzbeh viaja de Teerã até Praga para desvendar o passado do pai, um expatriado comunista na Tchecoslováquia. Ao visitar o apartamento onde o pai morou há 50 anos, ele se depara com uma policial que investiga um acidente envolvendo o homem que vivia no local e caiu da janela do apartamento. Rouzbeh começa a desconfiar da história familiar que ele pensava conhecer.

23-ILHAS - Vencedor do Prêmio Especial do Júri no importante Festival South by Southwest. Produção do Canadá sobre Joshua, um tímido imigrante filipino de 50 anos que passou a vida inteira na casa dos pais idosos. Com medo de ficar sozinho para sempre, ele implora a Deus para encontrar uma esposa. Quando sua mãe morre de forma inesperada, ele abandona o emprego e passa a cuidar do pai em período integral. Mas ele não tem experiência em tomar conta das pessoas, incluindo de si mesmo. Eis que aparece uma prima filipina que oferece ajuda dando nova vida à casa e desperta o amor de Joshua.

24-NOITE PASSADA EM SOHO – Filme inglês. Um thriller psicológico sobre uma jovem apaixonada por design de moda que, misteriosamente, consegue voltar para a década de 1960 e encontra uma aspirante a cantora por quem tem forte admiração. Mas a Londres dos anos 1960 não é o que aparenta, e o tempo começa a desmoronar, desencadeando consequências assustadoras.

25-LA TRAVIATA, MEUS IRMÃOS E EU – Produção da França com uma história que lembra um pouco o filme Billy Elliiot. Aqui, a história de Nour, um garoto de 14 anos que aproveita o começo do verão no sul da França junto com seus três irmãos mais velhos. Eles moram juntos em um conjunto habitacional, e se revezam nos cuidados com a mãe em coma. Como ela gostava de ópera, Nour coloca música para ela ouvir e acaba se apaixonando pelo gênero. Entre as tarefas comunitárias e as tensões crescentes em casa, Nour sonha em fugir para um lugar distante. Quando conhece Sarah, uma cantora de ópera que ministra um curso de férias, ele finalmente encontra a oportunidade de se expressar e explorar novos horizontes.

26-A NOVA GAROTA- Filme da Argentina. Jimena viaja até Rio Grande, uma pequena localidade na ilha da Terra do Fogo, no extremo sul da Argentina, para reencontrar seu meio-irmão, Mariano. Ela mal tem dinheiro para a passagem, mas consegue chegar lá, com a esperança de encontrar algum emprego nessa região operária. O vento, o frio e a complexa crise econômica se tornam o cenário no qual Jimena desenvolve uma relação com as pessoas e com o lugar, e é quando, finalmente, ela começa a compreender e aceitar a si mesma.




27-AS VERDADES - Filme brasileiro com direção de José Eduardo Belmonte (de Alemão e Carcereiros). O policial Josué (Lázaro Ramos) precisa resolver um crime contra um empresário num pequeno município baiano. O filme foi rodado nas cidades litorâneas da Bahia de Maraú e Itacaré. A história é contada por meio de três pontos de vista: o de Cícero, matador de aluguel; o de Francisca, noiva do empresário; e o de Valmir, a vítima. Drica Moraes, sempre tão boa atriz, neste filme emula todos os trejeitos de Fernanda Montenegro, parece uma cópia mais jovem da veterana atriz, e isso não é um elogio.

28-A MULHER QUE FUGIU – Filme da Coréia do Sul vencedor do prêmio de melhor direção no Festival de Berlim de 2020. Uma mulher encontra três amigas enquanto seu marido está em uma viagem de negócios. A primeira é divorciada e gosta de cuidar de seu jardim. A segunda se sente atraída pelo vizinho e é perseguida por um jovem poeta. A terceira, sua amiga menos próxima, trabalha em um pequeno cinema. A conversa entre elas é agradável, mas existem muitas coisas acontecendo além da superfície dessas histórias.

29-IMACULADA- Filme da Romênia. Vencedor do prêmio Luigi De Laurentis e do prêmio de direção da Jornada dos Autores no Festival de Veneza. Dariavai vai para uma clínica de reabilitação para largar a heroína. Ser desejada e protegida por todos faz com que Daria se sinta especial pela primeira vez na vida. Um novo detento  a coloca em conflito com seus desejos, e desperta uma violenta competição entre esses homens.

30-FILHO DAS MONARCAS – Filme do México que foi o vencedor do Prêmio Alfred P. Sloan no Festival de Sundance. Após a morte da avó, um biólogo mexicano que vive em Nova York retorna à sua cidade natal, situada nas majestosas florestas de borboletas-monarcas. Essa jornada o obriga a enfrentar traumas do passado e a refletir sobre sua nova identidade híbrida, lançando-o em uma metamorfose pessoal e espiritual. Não sei porquê, mas acho que o filme se perde do meio para o fim.


31-LUZ NATURAL – Produção conjunta da Hungria, Letônia, França e Alemanha que venceu o prêmio de melhor direção no Festival de Berlim. Na União Soviética ocupada durante a Segunda Guerra Mundial, István é um fazendeiro húngaro que serve como cabo em uma unidade especial de reconhecimento de grupos da resistência. Após a morte do comandante, Semetka vai precisar superar seus medos e assumir a liderança do grupo, enquanto é arrastado para dentro de uma sucessão de eventos caóticos que fogem do seu controle. Eu só consegui assistir o filme até a metade, pois depois de uma hora nada acontecia, então deixei o cinema.

32-HIGIENE SOCIAL – Filme do Canadá. Antonin é uma espécie de dândi que poderoa ser um escritor famoso mas que usa a habilidade para livrar-se de problemas. Seu charme e sua inteligência serão desafiados por cinco mulheres que estão prestes a perder a paciência com sua maneira de lidar com a vida. Melhor direção na seção Encontros do Festival de Berlim mas achei chato com imagens sem nenhum movimento de câmera e diálogos empolados.

33-MADALENA – Filme brasileiro - Entre Luziane, Cristiano e Bianca, há pouca coisa em comum além do fato de viverem em uma cidadezinha cercada por plantações de soja no Centro-Oeste do Brasil. Embora não se conheçam, os três são afetados pelo desaparecimento de Madalena. Em partes diferentes da cidade, cada um deles encontra seu modo de responder a essa ausência. O diretor estava na sala e apresentou o filme junto com dois atores. Ao final a plateia aplaudiu e eu confesso meu desejo sincero de gostar do filme, mas alguma coisa não funcionou. Suspeito que tenha havido certa pretensiosidade na produção com um roteiro fraco, imagens vagas e repetitivas e diálogos banais.