31.12.20

LEITURAS DE OUTUBRO A DEZEMBRO

Li 61 livros em 2020. Não bati meu recorde de 2019 (68 livros). Em 2018 foram 40.

Em 2020 foram 22 lidos de Janeiro até Maio; 18 de Junho a Setembro; e 21 lidos de Outubro a Dezembro.  Publiquei em dois posts os títulos até Setembro. Aqui vão agora os últimos do ano.

1 - SAPIENS – Segundo livro que li do badalado escritor israelense Yuval Harari após “21 Lições para o Século 21”. Este é um seus best selles com quase 500 mil exemplares vendidos, o que tornou Harari um fenômeno. Aqui um debate sobre o que fez nossa espécie subjugar as demais, capaz de criar obras de arte e avanços científicos enquanto gerou terríveis guerras. Ele explica porque o capitalismo é a mais bem-sucedida religião, o imperialismo é o sistema político mais lucrativo e porque não somos mais felizes hoje do que antigamente.

 

2 - HOMO DEUS – Instigado pelo livro anterior, li o livro seguinte de Yuval Harari em que ele combina ciência, história e filosofia para entender nosso destino e os próximos passos da evolução humana além de entender quais caminhos tomamos para chegar onde estamos. “No século 18, Maria Antonieta aconselhou os pobres a comerem brioche. Hoje eles seguem seu conselho e se os ricos de Beverly Hills comem salada com tofu, nos cortiços e guetos se empanturram de bolinhos recheados, salgadinhos artificiais, hambúrgueres e pizzas. ”

 

3 - O HOMEM DO CASTELO ALTO – Este premiado livro de Philip K. Dick gerou uma série de tv já com quatro temporadas. Vários livros do autor já foram adaptados para o cinema como Blade Runner, O Vingador do Futuro e Minority Report. Nesta distopia, estamos em 1962, os EUA perderam a 2ª Guerra Mundial e os nazistas e japoneses dividem os Estados Unidos. Há diferenças entre livro e série. Apesar de muito elogiado, nem livro nem série me agradaram muito. 

 

4 - WILD CARDS 8 - LUTA DE VALETES – Na sequência de Wild Cards, incrível série de realidade alternativa. Editada  por  George R. R. Martin, acompanhamos o caos se instalar em Manhattan, quando aparecem os Saltadores, gangue com integrantes que transferem suas mentes a outros corpos. A série tem mais de 120 personagens e aqui conhecemos melhor alguns deles, o que não pode ser aprofundada nos livros anteriores como Estranheza, uma espécie de coringa monstro fortíssimo formado pela fusão de dois homens e uma mulher que estavam em uma relação sexual a três quando o vírus carta selvagem os contaminou.

 

5 - WILD CARDS 9 - GUERRA AOS CURINGAS – Até agora este foi o último volume da saga lançado no Brasil (a série tem mais de 20 volumes). Acompanhamos os conflitos criados pela gang do violento Blaise e seus saltadores, e Bomba, um coringa disforme que se alimenta de matéria orgânica em decomposição (com tubos de esgoto ligados ao seu corpo gigantesco para alimentá-lo continuamente). Bomba governa Ellis Island em Nova York e luta pelos direitos dos curingas. Vários personagens queridos da saga morrem neste volume e outros tantos têm destinos surpreendentes.

 

6 - IMPERIUM - Primeiro volume da Trilogia de Cícero, romance histórico do autor inglês Robert Harris (mais famoso pelos livros Pompeia e O Fantasma)
, é focado na figura do futuro senador e cônsul romano Marco Túlio Cícero. Narrado pelo seu escravo e biógrafo Tiro, introduz o talento extraordinário de advogado e orador Cícero. Com incrível verossimilhança, o livro nos conduz ao violento e traiçoeiro mundo da política romana. No primeiro volume vamos acompanhar os primeiros passos de Cícero ao defende uma vítima do corrupto e poderosos Verres, governador da Sicília.

 

7 - LUSTRUM - Segundo romance da Trilogia de Cícero, foca no período em que a República de Roma está expandindo sua influência pelo mundo. Vários homens lutam pelo poder, entre eles Cícero, o poderoso cônsul; César, seu jovem e cruel rival; Pompeu, o principal general; Catão, um político fanático; e o psicopata Catilina. Cícero precisa usar toda a sua astúcia para evitar que Roma mergulhe em uma ditadura. Aqui temos César eleito cônsul e sua polêmica proposta populista de reforma agrária nas terras públicas para legionários e pobres de Roma e a instalação do triunvirato César, Pompeu e Crasso.

 

8 - DICTATOR – Terceiro volume da trilogia mostra Cícero, com 48 anos, o maior orador de sua época, exilado e sem poder político. A única maneira de retornar a Roma é apoiando seu inimigo Júlio César se aproveitando da sua astúcia e habilidade retórica. Mas a união dos seus inimigos levará o notável senador à ruína. Cícero entrou para a História como um orador brilhante e um adversário temido pelos poderosos. Fez alianças e tramou contra homens inescrupulosos, o que o tornou um tipo de herói atemporal.

 

9 - MEMÓRIAS DO SUBSOLO
Otto Maria Carpeaux disse que Dostoiévski é o mais poderoso escritor do século XIX; ou do século XX, pois sua obra é o marco entre dois séculos de literatura. Aqui temos uma obra-prima, uma pequena e sombria novela que traz temas da fase madura de Dostoiévski. Seu protagonista, um funcionário que vive no subsolo de um edifício em São Petersburgo, expõe a sua visão de mundo num discurso explosivo. Já tem início com a frase: “Sou um homem doente…Um homem mau. Um homem desagradável”. 

 

10 - COM SANGUE – Dos quase 80 livros de Stephen King, 12 volumes são de contos e este é o mais recente lançado. O mestre do suspense aborda temas como amor, amizade, talento e justiça e suas deturpações em quatro contos com protagonistas, como sempre, complexos, com suas vidas comuns transformadas por elementos inexplicáveis. Num dos contos temos de volta a estranha detetive Holly Gibney, personagem intrigante do livro Outsider e da trilogia Mr. Mercedes.

 

11 - A DANÇA DA MORTE- Foram quase 1.250 páginas para vencer esse calhamaço de Stephen King sobre um vírus que mata 99% da população, destruindo instituições e gerando o caos. Os sobreviventes se dividem nos clássicos lados do bem e do mal. De um lado a frágil Mãe Abigail, de 108 anos. Do outro, o mal incorporado pelo terrível Randall Flagg, personagem também da saga A Torre Negra, de King, considerado um dos maiores vilões do autor. Há uma série na Amazon Prime com Whoopi Goldberg num dos papéis principais. Li com muita voracidade, mas achei excessivamente arrastado e com um final ao mesmo tempo preguiçoso e caudaloso, apesar da aparente contradição entre esses dois termos.

 

12-PRIMEIRO AMOR - Obra magistral de Ivan Turguêniev, autor do clássico Pais e Filhos que ainda não li e foi considerado o primeiro divulgador da literatura russa no Ocidente. A história é contada a um grupo de amigos por Vladímir Petróvitch sobre sua paixão de infância por uma exuberante Zinaida, filha de sua vizinha que usa a atração que exerce em vários homens para manipular as armas de sedução. O autor era publicamente admirado por escritores como Henry James e Gustave Flaubert.

 

13 - LADY MACBETH DO DISTRITO DE MTZENSK – O primeiro livro que li do russo Nikolai Leskov e considerada sua obra-prima. O autor era contemporâneo de Dostoiévski e Tolstói, tido como grande retratista dos costumes e da alma de seu povo. Nesta impressionante narrativa, acompanhamos a transformação de Catierina Lvovna, jovem e entediada esposa de um velho comerciante, em uma cruel assassina. Inspirada na história de uma das maiores vilãs da literatura, da peça Macbeth de Shakespeare.

 

14 - PÁSSARO DA TEMPESTADE - Primeiro volume da série sobre a Guerra das Rosas, do britânico Conn Iggulden. Acompanhamos o rei Henrique VI alçado ao trono da Inglaterra com o reino abalado pela saúde frágil e que decide se casar com uma nobre francesa para selar o armistício com a França pondo fim à Guerra dos Cem Anos. O acordo gera forte oposição de Ricardo Plantageneta, duque de York, que planeja destronar o rei e ocupar seu lugar. É o início de um período sangrento na Inglaterra, uma guerra civil com alianças e traições com vívidas descrições de batalhas que parecem ficção de tão ferozes e intrincadas, mas que foram reais.

 

15 - TRINDADE – O volume 2 da saga de quatro livros sobre a Guerra das Rosas volta a mostrar batalhas sangrentas e mostra que o duque de York assumiu o poder como protetor do reino após prender o rei Henrique VI. Com os condes de Salisbury e de Warwick, ele forma uma trindade com poder inigualável. A figura mais notável é a rainha Margarida de Anjou, que conduz batalhas sangrentas pelo poder e retorno do rei fazendo alianças quase impossíveis.

 

16-HERANÇA DE SANGUE- Terceiro volume da série Guerra das Rosas retrata a vitória do exército da rainha Margarida de Anjou e do rei Henrique VI contra os Yorks, mas com a morte do duque de York, seu filho invade Londres e se coroa rei como Eduardo IV, o primeiro da dinastia York. Há uma reviravolta que parece um romance de ficção se não fosse de fato História, quando a ambiciosa esposa do rei o joga contra os antigos nobres aliados Neville. O que se segue é a prisão de Eduardo e a Inglaterra se vê com dois reis no cativeiro. Há um quarto volume da série: A ascensão dos Tudors, mas ainda não li.

 

17-UMA CIDADEZINHA DISTANTE – Um livrinho da talentosa e premiada poeta americana Elizabeth Bishop, que viveu 15 anos no Brasil e traduziu o célebre volume de memórias de Helena Morley, Vida de Menina, também já adaptado para o cinema. Aqui Bishop narra sua viagem a Diamantina, Minas Gerais para conhecer de perto o cenário do livro que traduziu e tornou um sucesso internacional, revelando o olhar original de uma estrangeira que observou como ninguém o Brasil, nossos costumes e tradições.

 

18- MR MERCEDES – No primeiro volume da trilogia Bill Hodges, o mestre do terror Stephen King conta a história de um psicopata que atropela e mata diversas pessoas com um Mercedes roubado. Meses depois, o detetive agora aposentado Bill Hodges, atormentado pelo fracasso na resolução do caso, recebe uma carta de alguém que assume ser o Assassino do Mercedes. Hodges passa a investigar o crime novamente e acompanhamos uma caçada ao assassino. A série foi adaptada para a Amazon Prime com três temporadas.

19- ACHADOS E PERDIDOS
- Segundo volume da trilogia anterior. O trio Jerome, Holly e Bill Hodges enfrentam o assassino Morris Bellamy que matou o recluso escritor consagrado John Rothstein. Após roubar seus cadernos com produções inéditas do escritor, esconde-os antes de ser preso por outro crime. Décadas depois, um garoto de 13 anos encontra o tesouro enterrado. Morris sai da prisão, depois de 35 anos e busca vingança. Devorei o livro de 350 páginas em três dias para poder assistir às duas últimas temporadas da série e ler o volume três: Último Turno.

20 - O RETRATO
Nikolai Gogol é um dos autores mais admirados da literatura russa, combinando fantasia, realidade e toques de humor. Esta curta novela conta a história de um estranho quadro que desperta a perversidade e os piores sentimentos em todos os que entram em contato com ele . O pintor Tchartkov compra o estranho quadro com a imagem de um velho, pintado com grande talento. Com o tempo, o pintor passa a ter estranhas sensações e sonhos de horror. Na segunda parte, conhecemos a história do quadro misterioso, o homem pintado e quem o pintou. Este é o quarto livro que li de Gogol depois de Almas Mortas, O Capote e O Diário de um Louco.

21- A ÁRVORE DE NATAL DE CRISTO - 
Escrita muito breve do autor russo Fiódor Dostoievski, considerado um dos mestres da literatura mundial e um dos escritores mais instigantes da literatura. A história é simples, mas profunda, sobre um menino e sua mãe, mortos de fome, frio e mergulhados em imensas necessidades em pleno Natal na Rússia. Conhecido por seu niilismo e personagens imersos em culpa e angústia psicológica, o autor tem forte mensagem embutida no enfrentamento da miséria por uma criança pobre.

13.11.20

A BELEZA

 

A BELEZA

O corpo, vivo, respira

E rola sobre a grama morna.

Verde, grama e corpo, um só.

O sol conspira, o corpo cobre de luz,

E o corpo transpira...

Olhos, sobre o verde, buscam, vagabundos,

Buscam ao redor, 

Boiando em um mar de verde cobre,

Narinas e boca aspiram o aroma de papoulas onipresentes

Arrebentando em cor, 

Em luz e em cor.

Então a Beleza passa de colete e botas de couro preto,

A Beleza passa...

Olhos seguem quase cegos a Beleza

Que, bela, não se disfarça.

A boca se enche de saliva doce,

A boca, ou narinas, suspiram,

A Beleza para, senta-se na grama. Poucos metros.

Eis uma grama feliz!

Colete e botas de couro preto.

A Beleza tem dentes perfeitos, cílios longos, pele de bronze intocado

Nada mais adequado, vez que Beleza é,

Mas nem precisava ter esse peito tão belo.

A Beleza, esqueci de dizer, tirou o colete! 


26.9.20

Leituras de Junho a Setembro

 


Aqui estão as minhas últimas leituras nos meses de Junho, Julho, Agosto e Setembro. 

Foram 18 livros, 8 deles foram lidos em formato digital e 10 em formato físico. Somente 4 livros foram de não-ficção, sendo dois deles biografias.

Eis a lista:

1 - QUATRO ESTAÇÕES, de Stephen King - Dos quase 80 livros escritos pelo mestre do terror, cerca de 10 são de contos. Quatro Estações é um dos seus melhores livros de contos. Três deles foram adaptados com sucesso para o cinema: os filmes Um Sonho de Liberdade (com Tim Robbins e Morgan Freeman) baseado em "A Primavera Eterna – Rita Hayworth e a Redenção de Shawshank"; Conta Comigo (com River Phoenix e Kiefer Sutherland), baseado em "Outono da Inocência – O Corpo"; e O Aprendiz (com Ian McKellen), baseado em "Verão da Corrupção – Aluno Inteligente", além do excelente O Método Respiratório, que apesar de não ter virado filme é tão bom que merecia ter crescido para um romance tal seu fôlego.  

2- WILD CARDS 7-A MÃO DO HOMEM MORTO, série editada por George R R Martin (de Game of Thrones) e que dá sequencia às ótimas histórias dos volumes anteriores onde um vírus alienígena atingiu a Terra dando superpoderes a alguns indivíduos (os Ases) e provocando bizarras deficiências em outros (os Curingas). Esse volume transcorre em parte paralelamente ao livro anterior que se passa em Atlanta durante a campanha presidencial. Aqui, uma das curingas mais interessante da série, Chrysalis foi morta (tinha sido morta no livro anterior e aqui há a sequência da história) e um detetive e um policial caçam o assassino. A identidade do criminoso é uma baita surpresa.

 

3- CINCO ESCRITOS MORAIS, de Umberto Eco. Após ter lido quatro romances do autor (O Nome da Rosa, Baudolino, O Cemitério de Praga e A Ilha do Dia Anterior), estava na hora de ler uma das suas obras de não-ficção. Aqui ele reúne cinco ensaios em que discute questões atuais. Em “Pensar a Guerra”, põe em perspectiva as diferenças entre guerras atuais e passadas. Em “O Fascismo Eterno”, chama a atenção para as novas roupagens com que o fascista se apresenta. Em “Sobre a Imprensa” ele mostra como a informação escrita está a reboque da televisão. Em “Quando Entra em Cena o Outro”, discute como a crença na vida eterna condiciona os comportamentos. E no quinto ensaio, “Migrações, Tolerância e Intolerável” trata do racismo e da xenofobia.


4- O CEMITÉRIO, de Stephen King. Também publicado no Brasil com o título O Cemitério Maldito, ficou famoso pelas suas três adaptações para o cinema, mas com abordagens diferentes entre si e também em relação ao livro que as originou. A história do médico Louis que se muda de Chicago com a esposa e o casal fofo de filhos (e um gato. O gato é importante) para uma pequena cidade do Maine (cenário de grande parte das obras de King). Apesar do lugar idílico, a sua bela casa fica num terreno onde existe um cemitério indígena antigo e misterioso que trás de volta à vida entes queridos mortos ali enterrados. Um dos livros mais angustiantes do autor.

5- COLUNA DE FOGO, de Ken Follet. Fechamento da trilogia iniciada com Os Pilares da Terra e que continuou com Mundo Sem Fim. Os três livros são tijolos de quase mil paginas cada. Os dois primeiros foram adaptados para premiadas minisséries. Vários dos romances policiais de Follet já viraram filmes, como O Buraco da Agulha, Na Toca do Leão, a Chave de Rebeca, mas ele não se prende a narrativas policiais, como demonstra esta trilogia histórica que se inicia no reinado de Henrique II, o primeiro rei plantageneta inglês, continua no período de Eduardo III durante a Guerra dos 100 anos e termina na disputa entre as rainhas Mary Stuart e sua prima Elizabeth I.

6- A GAROTA MARCADA PARA MORRER, de David Lagercrantz - Esse é o sexto e último volume da série Millennium e o mais fraco de todos, o que é uma grande pena, pois sou fã da hacker Lisbeth Salander, já vista nas telonas em duas adaptações para o cinema. A série originalmente foi criada por Stieg Larsson que escreveu os três primeiros livros antes de morrer (seriam dez). O trabalho foi assumido depois por David Lagercrantz que concluiu a sequência. Aqui temos uma intrincada história fracamente desenvolvida que começa com um homem encontrado morto num parque de Estocolmo e que desperta o interesse do jornalista Mikael Blomkvist, personagem que divide com Lisbeth o protagonismo de todos os livros. Aqui Salander vai finalmente acertar suas diferenças com a sua perigosa irmã Camilla.

7- OS TRES IMPERADORES, de Miranda Carter. Uma biografia fascinante de mais de 600 páginas sobre três governantes das grandes potências europeias: Grã-Bretanha, Alemanha e Rússia, comandadas por três primos: Jorge V (rei-imperador da Inglaterra, do Império Britânico e da Índia); Guilherme II (o último kaiser alemão) e Nicolau II (o último tzar russo). Juntos, reinaram sobre os últimos anos da Europa dinástica, até a Primeira Guerra Mundial. A biógrafa recheou a obra com dezenas de fotografias da época e farta correspondência trocada entre os primos (netos da rainha Vitória). Para os três imperadores a guerra seria um desastre, acabando seu relacionamento familiar em traições, assassinatos e abdicações.

 

8- JOYLAND, de Stephen King. Livro diferente do que se costuma ler de Stephen King. História de um universitário que decide passar parte das férias em um trabalho temporário no parque de diversões Joyland para esquecer a namorada que partiu seu coração. Em Joyand, um parque no estilo dos anos 70, ele se envolve no mistério da vítima de um serial killer que foi morta ali há muitos anos, e cujo espírito assombra o trem fantasma. Um personagem que rouba a história é Mike, um menino com um dom especial e uma doença incurável. Um livro carregado com toques e nostalgia, drama e algum mistério. Em algumas partes chega mesmo a dar um nó na garganta. King mostra que não é craque apenas no terror puro.

9- A DIVINA COMÉDIA, de Dante Alighieri. Há anos, desejava ler a obra máxima de Dante, mas sempre pensei em qual o melhor momento. Até que uma pessoa próxima começou a se exibir dizendo que estava lendo a obra e tomei isso como um desafio pessoal. Decidi não só ler no formato original em versos traduzidos, mas descobri o incrível site do estudioso Helder da Rocha que fez uma adaptação em prosa com inúmeras notas explicativas muito úteis. Foi uma experiência muito particular e enriquecedora. A obra épica foi escrita no século XIV, não em latim, mas no italiano vulgar, o dialeto de Florença, o que popularizou enormemente o livro. Repleto de simbolismo, dividido em três partes (Inferno, Purgatório e Paraíso) e composto de 100 cantos e 14.233 versos, é considerado o maior poema escrito no Ocidente. Na história acompanhamos os poetas Dante e Virgílio no caminho do Inferno e do Purgatório até chegarmos ao Paraíso, onde Dante encontra sua musa Beatriz.

10- CLARICE, UMA BIOGRAFIA - de Benjamin Moser - A mais completa biografia da escritora Clarice Lispector, com quase 500 páginas e escrita com brilhantismo pelo norte-americano Benjamin Moser (que recentemente escreveu a biografia da genial Susan Sontag). Moser reconstitui a história de Clarice desde os tempo dos seus pais na Ucrânia, perseguidos por serem judeus e obrigados a fugir do país para não morrerem. É um privilégio acompanhar o brilhantismo de Clarice e sua vida difícil, sua personalidade complexa, o drama da esquizofrenia do filho, a sífilis da sua mãe, adquirida num estupro na Ucrânia, o incêndio que quase a matou, a sua dependência de remédios para dormir....A obra de Moser, que a considera a maior escritora judia depois de Kafka, foi responsável por divulgar enormemente o trabalho de Clarice no mundo inteiro. Ele coordena a publicação das suas antologias nos EUA.

       

11, 12 e 13 - O HEREGE, O ARQUEIRO e O ANDARILHO, de Bernard Corwnell. Li os três livros em sequência. Já havia lido do autor sua trilogia das Crônicas de Artur: O Rei do Inverno, O Inimigo de Deus e Excalibur, além das obras Stonehenge e Azincourt. Os três volumes que li agora são integrantes da trilogia: A Busca do Graal. Por ironia, resolvi ler outro livro antes: 1356. Mal sabia que estava lendo o quarto volume da trilogia (uma trilogia com quatro volumes?). Então, ao começar a história do arqueiro inglês Thomas de Hookton, já sabia o que havia acontecido com o Graal, objeto do quarto volume. Independente disso, a história é recheada de batalhas de tirar o fôlego e é tão boa quanto todas as obras do prolífico inglês Bernard Cornwell (tenho 25 livros dele para ler ainda, entre eles os 12 volumes da série das Guerras Napoleônicas e outros 11 das Guerras Saxônicas).

14- O VELHO E O MAR, de Ernest Hemingway – Foi o último livro publicado por Hemingway e o primeiro dele que li. É de uma novela de quase 130 páginas e que infelizmente já conhecia o final, não somente por já ter assistido ao filme adaptado a partir da obra (com a interpretação magnífica de Spencer Tracy), bem como porque no exemplar já se diz o que vai acontecer na história. Mesmo assim, não deixa de ser emocionante acompanha a luta do velho pescador cubano Santiago na sua tentativa desesperada de pescar o maior peixe da sua vida após uma maré de azar. O pequeno Manoin, menino que ajuda o velho pescador é o elemento de vida e emoção que faz um contraponto perfeito com a dureza e a secura do personagem principal. É uma obra que foi citada quando o autor ganhou o Nobel de Literatura em 1954.

 

 15- A MALDIÇÃO DO CIGANO, de Stephen King. Também lançado no Brasil com o título de A Maldição, este foi o 22º livro que li de King e de todos, o de que menos gostei. Tem menos de 300 páginas, mas é um tanto arrastado. Também já havia assistido ao filme que é muito datado. Assim, também já conhecia o final e não me emocionou nem assustou. O livro foi um dos escritos por King com o pseudônimo de Richard Bachman e o título original é “Emagrecido”, em inglês, “Tinner”. A história de um advogado obeso que após atropelar e matar a filha de um velho cigano recebe deste a maldição de emagrecer sem parar independentemente do quanto ele coma.

16- KAFKA À BEIRA-MAR, de Haruki Murakami. Uma decepção. Já li cinco livros de Murakami e gosto de todos, mas fiquei impressionado com a chatice dessa obra. O autor arrasta uma história boba por mais de 500 páginas, em que o excessivo detalhismo e os fracos diálogos chegam a ser constrangedores. Murakami está todo ano cotadíssimo para o Nobel de Literatura com fãs pelo mundo inteiro, inclusive eu, mas aqui achei uma tortura ler o livro até o fim e mesmo o realismo fantástico que sempre me agrada nos livros de Garcia Márquez e Salman Rushdie, aqui soa forçado. Ainda não entendo como esse livro tem mais de 90% de aprovação. Suspeito fortemente que há pessoas que não têm coragem de dizer que não gostaram e querem passar a impressão de descolados. Esse cara não sou eu.


17- EM NOME DE DEUS, de Karen Armstrong
. Após ler vários romances em sequência gosto de variar um pouco e ler uma biografia ou um livro de não ficção e há tempos este livro da ex-freira católica Karen Armstrong, considerada uma das principais autoridades em história das religiões estava na minha lista. Nesse livro ela analisa os movimentos fundamentalistas surgidos das três principais religiões monoteístas. Ela parte do ano de 1492, quando ocorreram episódios históricos decisivos para cristãos, muçulmanos e judeus. O livro se apoia em ampla documentação e bibliografia e a leitura flui facilmente. O tema da história das religiões me agrada muito. 

18 - DEUSES AMERICANOS, de Neil Gaiman. É pura coincidência ler um livro sobre deuses logo em seguida de outro. Há tempos me devia a leitura de uma obra de Neil Gaiman, um autor que tem uma legião de adoradores, mas sempre suspeitei que não era minha praia. Dito e feito: o livro é muito chato e a narrativa não me agradou. Isso parecerá heresia para muita gente, mas não comprei a história nem os personagens me agradaram, principalmente os dois principais. Como há uma série de tv aclamada baseada no livro, aproveitei o embalo para assistir à série também, mas se não fosse pela beleza da produção visual e da ótima trilha sonora o audiovisual não fica muito à frente do livro. Chatíssimos ambos. Acho que não pretendo ler mais nada desse autor. Só ficou uma frase na memória: “Todas as horas ferem. A última mata”.

21.6.20

Livros de Janeiro a Maio


Aqui estão os 22 livros lidos entre Janeiro e Maio deste ano
Estão na ordem em que aparecem na ilustração acima e na lista abaixo
No mesmo período, do ano passado, li 27 livros. Então, estou abaixo da média do mesmo período do ano passado.

1 - HOMEM COMUM – Este foi o quinto livro que li do escritor Phillip Roth após Adeus Columbus, Complexo de Portnoy, O Teatro de Sabbath e Humilhação. O prolífico autor de mais de 30 romances aqui conta uma história de perda e arrependimento do protagonista lembrando da sua infância despreocupada, as conquistas da idade adulta até a velhice quando seus amigos estão morrendo e ele se deteriorando fisicamente com filhos que o desprezam e três casamentos destruídos.

2 - A CONFRARIA DOS ESPADAS – Após ter lido o excepcional Agosto, vi uma lacuna na minha leitura de Rubem Fonseca. Decidi reiniciar por este livro de contos, gênero que era o ponto forte do autor, sem desmerecer seus ótimos romances. Mas, diferentemente de outros livros dele, este tem a marca do minimalismo e da concisão e não foi muito bem recebido pela crítica. Acho que não recomecei pelo melhor.

3 - BARTLEBY, O ESCREVENTE- O segundo livro que li de Herman Melville após vencer o calhamaço que foi Moby Dick. Trata-se de um quase conto e é mais leve e acessível, com humor, inclusive. A história de um advogado do século XIX que contrata um novo copista. E entra Bartleby em cena. O personagem é tão marcante que fascina até hoje leitores e críticos e filósofos contemporâneos como Gilles Deleuze e Jacques Derrida escreveram textos sobre ele.

4 - A LITERATURA COMO TURISMO – Antologia poética de João Cabral de Melo Neto organizada pela sua filha. São poemas feitos durante cinquenta anos como diplomata na Espanha, Inglaterra, Senegal, Equador e Honduras retratando a cultura e a paisagem de lugares que o marcaram, pincipalmente Sevilha a cidade mais cantada pelo poeta.

5 - SALEM –O segundo livro publicado por Stephen King, em 1975. É abertamente inspirado em Drácula de Bram Stoker e é ambientado na cidadezinha de Jerusalem's Lot, na Nova Inglaterra. Conta a história de três forasteiros: um escritor que viveu na cidade quando criança e quer acertar contas com o passado; um menino obcecado por monstros; e um homem misterioso que abre uma loja de antiguidades na cidade. Vários assassinatos medonhos passam a acontecer e um grupo de sobreviventes decide fugir mas precisa livrar a cidade de vampiros.

6 - 1.356 –O sexto livro de Bernard Cornwell que li após Stonehenge, Azincourt e os três volumes das Crônicas de Artur (O Rei do Inverno, O Inimigo de Deus e Excalibur). O título evoca um dos anos mais devastadores da Idade Média após a peste negra assolar a Europa. É o quarto volume da série A Busca do Graal (precedida por O Arqueiro, O Andarilho e o Herege, que não li ainda). Passa-se no meio da Guerra dos Cem Anos entre a Inglaterra e a França. Aqui o arqueiro inglês Thomas de Hookton disputa da posse de la Malice, a espada usada por São Pedro para defender Jesus Cristo. Crê-se que quem possuir a espada vencerá qualquer guerra.

7 - OUTSIDER – Talvez o mais recente livro de Stephen King (ele tem mais de 60) e adaptado para uma série de tv. A partir da morte brutal de um menino, as testemunhas e digitais levam a autoria a um treinador de beisebol infantil. Após sua prisão, descobre-se que ele estava bem longe da cidade no momento do crime. É possível uma pessoa estar em dois lugares ao mesmo tempo?  O mestre Stephen King adiciona à trama uma criatura sobrenatural (o Forasteiro) que se alimenta dos terrores das suas vítimas, sem deixar de discutir um dos fenômenos mais atuais da sociedade, as fake news e suas consequências terríveis.

8 - OS SERTÕES –Um dos meus orgulhos: ter lido na íntegra a obra prima de Euclides da Cunha. A leitura é difícil. As duas primeiras partes têm parágrafos inteiros com termos científicos de botânica e geologia e muitas pessoas não conseguem ir adiante na leitura. Há edições que só trazem a terceira parte que é a luta em si. A história sobre a conquista do arraial de Canudos no sertão baiano foi publicada em 1902 é o primeiro livro-reportagem do Brasil. Foi adaptado para o cinema e também é tema de outro livro maravilhoso: A Guerra do Fim do Mundo, do peruano Mario Vargas Llossa.

9 - A CIVILIZAÇÃO DO OCIDENTE MEDIEVAL – Livro de Jacques Le Goff, um dos maiores medievalistas do mundo e traduzido em mais de 20 países. É um dos livros mais importantes sobre a Idade Média e trata dos principais aspectos daquele período como os religiosos, políticos, econômicos e sociais do ocidente medieval. Para quem gosta dessa parte da História (eu adoro), é um livro essencial e saboroso.

10 - A VOLTA NO PARAFUSO – Eu já havia lido três outros livros excelentes do autor Henry James (Retrato de uma Senhora, A Fera na Selva e Lady Barberina). Esse foi um dos maiores sucessos do autor que, ao contrário das obras anteriores, é uma história de terror com uma preceptora lidando com um casal de crianças possuídos por dois espíritos de ex-funcionários de um casarão da Inglaterra. Há um subtexto de exaltação sexual reprimida da era vitoriana. Já foi adaptado para o cinema, inclusive com o filme brasileiro Através da Sombra.

11 - BAGAGEM- O primeiro livro da excepcional poeta Adélia Prado que li e também seu livro de estreia. Já havia lido diversas poesias dele pela internet, mas aqui tive o prazer de ler o livro na íntegra. Foi publicado em 1976 sob recomendação de ninguém menos do que Carlos Drummond de Andrade

12 - MISERY – Famoso livro de Stephen King, adaptado com sucesso para o cinema como Louca Obsessão, rendeu à atriz Kate Bates, no papel da enfermeira Annie Wilkes, o Oscar, o Globo de Ouro e a 17ª honrosa colocação entre os 100 maiores vilões do cinema, lista organizada pela  American Film Institute (bem à frente de Drácula, Freddy Krueger e Coringa). História de desespero onde um escritor é sequestrado pela sua maior fã, a psicopata Annie Wilkes, que o obriga na base de tortura, a reescrever seu último livro onde ele matara a heroína Misery.

13 - WILD CARDS 5- JOGO SUJO – No quinto volume dessa coleção de contos de ficção organizada por George R. R. Martin estamos 40 anos depois da disseminação de um vírus alienígena que contaminou parte da população da Terra e transformou parte da população mundial em super-humanos (Ases) e outra parte em deformados terríveis e párias (Coringas). No Bairro dos Coringas em Nova York, esse volume mostra uma violenta guerra de rua entre a Máfia e a gangue Punhos Sombrios. No meio dessa guerra um grupo de heróis permanece nas sombras em guerra contra os poderes do submundo.


14 - DIAS DE ABANDONO – O 7º livro que li da italiana Elena Ferrante após sua Tetralogia Napolitana adaptada para série de tv (A Amiga Genial, História do Novo Sobrenome, História de Quem Foge e de Quem Fica e A História da Menina Perdida), além dos livros A Filha Perdida e Um Amor Incômodo. Os temas dela são muito do universo feminino, o que nunca foi meu forte. Aqui ela retorna a esse universo com uma mulher traída e abandonada que tem que lidar com questões que a destroem psicologicamente como a administração da casa, doenças das crianças, a péssima relação com a filha birrenta e a solidão. Foi difícil para mim ter empatia pela personagem que me pareceu existencialmente uma vítima rejeitada.

15 - A HISTÓRIA SECRETA DE PARIS – São mais de 580 páginas para atravessar, mas este é um livro encantador com um subtítulo:  “Como ladrões, vigaristas, cruzados, santas, prostitutas, déspotas, anarquistas, poetas e sonhadores transformaram um povoado gaulês na cidade luz da Europa”.  O jornalista Andrew Hussey apresenta uma infinidade de personagens que originaram a Paris que conhecemos hoje, desde as tribos que viviam na região antes da chegada do império romano até os intelectuais e poetas atuais, passando pelos reis, imperadores e incontáveis massacres, guerras, revoluções, pestes e combates intermináveis. Uma obra fundamental para quem quer realmente saber sobre Paris.

16 - WILD CARDS 6 – ÁS NA MANGA – Todo esse volume se passa em 1988 em Atlanta, ao contrário dos outros volumes que basicamente são em Nova Yorque. Aqui o livro inteiro ocorre durante a convenção do partido democrata que definirá quem irá ser indicado à para concorrer à presidência: o senador Hartmann (apoiado pelos Curingas) ou o pastor Barnett (que prega que os Curingas carregam um vírus demoníaco e devem ser presos em campos de concentração).

17 - A DITADURA ACABADA – Finalmente encerrei a série sobre a ditadura brasileira do jornalista Elio Gaspari interrompido há anos. Havia encerrado a leitura dos quatro primeiros volumes (A Ditadura Envergonhada, A Ditadura Escancarada, A Ditadura Derrotada e A Ditadura Encurralada). O último volume demorou anos para sair e recebeu Grande Prêmio da Crítica de Literatura da APCA e mostra o período de 1978 a 1985, o final do governo Geisel, a posse de Figueiredo, a eleição de Tancredo Neves, a abertura política e o fim do AI-5 com manifestações pela anistia e pelas eleições diretas.

18 - A COLEIRA DO CÃO – Se no começo do ano eu disse que tinha recomeçado a ler Rubem Fonseca após o romance Agosto e não escolhi seu melhor livro de contos com A Confraria dos Espadas, agora acertei. Este foi o segundo livro de Rubem Fonseca, lançado em 1965 e é composto de oito contos que são a síntese das melhores qualidades do contista. O primeiro conto: “A Força Humana”, foi tido pelo crítico Wilson Martins como um dos melhores da literatura não apenas brasileira como da literatura universal. Ele integra o livro “Os Cem Melhores Contos Brasileiros do Século XX”

19 - NOVEMBRO DE 63 – Mais uma obra magistral do mestre Stephen King. Também foi adaptada para uma série de tv como inúmeros outros livros do autor. Escrevi no blog uma resenha completa sobre o livro e vou apenas resumir: espetacular. A série é estrelada pelo ator James Franco.

20 - COMPLÔ CONTRA A AMÉRICA –Sexto livro de Phillip Roth que li. Diferente de todos os seus outros livros, que abordam temas reais com uma pegada naturalista, aqui o autor cria uma ficção baseada na premissa de que o herói americano Charles Lindbergh, primeiro homem a cruzar o Atlântico em um voo sem escalas, em 1927, é eleito presidente e, ao apoiar Hitler e o nazismo, leva terror à comunidade judaica. Adaptado para uma série de tv com Winona Ryder e John Turturro.

21 - VARIAÇÕES ENIGMA – O segundo livro que li de André Aciman após o retumbante sucesso de Me Chame Pelo Seu Nome, adaptado para o cinema. Esta não é a continuação do romance anterior, que está em outro livro que ainda não li. Este é dividido em cinco partes, cada uma contando um episódio da vida amorosa de um rapaz bissexual chamado Paul, um jovem italiano que vive nos Estados Unidos.

22 - DÁLIA NEGRA – Romance de estreia do autor James Ellroy e início da brilhante carreira de um autor de ficção policial moderna. Aqui ele narra os bastidores da investigação de um crime real ocorrido em Los Angeles em 1947 quando o corpo torturado e estuprado de uma bela jovem é encontrado num terreno baldio. Trata-se de um romance noir clássico com todos os ingredientes do gênero. Foi adaptado para o cinema por Brian de Palma em 2006 com Scarlett Johansson e Josh Hartnett.

8.5.20

NOVEMBRO DE 63


O Passado é Obstinado!”

Em torno da frase acima se desenrola a trama do excepcional livro “Novembro de 63”, obra de quase 730 páginas do mestre do terror Stephen King, que acabei de devorar.

Quem gosta do estilo do autor vai encontrar quase tudo que ele aborda nas suas obras. Digo quase tudo porque não estarão aqui monstros perigosos ou psicopatas assustadores que fizeram a fama do mestre e deliciaram os leitores dos livros de King. No entanto, há uma pitada saborosa para os fãs do universo do autor: parte da obra se passa na cidadezinha de Derry, cenário de medonhas cenas descritas por King, inclusive com a citação de um certo palhaço matador de crianças.

Aqui o universo é outro e tem como base a Teoria do Caos, segundo a qual uma pequena variação nas condições em determinado ponto de um sistema dinâmico pode ter consequências de proporções inimagináveis. Em termos mais gerais e que tornaram famosa a teoria, o bater de asas de uma borboleta na China pode provocar um furacão no México.

Nosso protagonista é Jake Epping, professor de uma pequena cidade do Maine (cenário de quase todos os livros de King), uma pessoa comum que é convencido por um amigo a voltar no tempo para impedir o assassinato do ex-presidente John Kennedy. Segundo esse amigo, muitas das piores coisas que ocorreram no mundo se deram em razão da morte de JFK.

Aqui, se você quer realmente apreciar uma boa história, vai ter que lançar mão do que é conhecido como: “Suspensão voluntária de descrença”, que tem esse nome porque se requer de um leitor ou espectador aceitar como verdadeiras as premissas de uma obra de ficção, mesmo que elas sejam fantásticas. Aceita-se a suspensão do julgamento em troca da premissa do entretenimento.

Você precisa então aceitar a premissa do livro que é a existência de um portal misterioso que leva Jake, nosso herói, do ano de 2010 até 1958, cinco anos antes da morte do ex-presidente Kennedy. Jake terá como missão abortar esse crime, mudar o passado e, por consequência, o futuro.

Mas as coisas não serão fáceis quando ele descobre que o passado não quer ser mudado e assim Jake encontra uma série de dificuldades Quanto mais mudanças possivelmente forem geradas, mais problemas Jake terá para conseguir alterar o passado. Assim, tempos como verdadeiro antagonista neste inspirado livro, não um indivíduo monstruoso ou um psicopata assassino. O inimigo é o passado em si.

Apesar de Stephen King ter imensa facilidade em criar histórias, descrever cenários, situações e personagens, fiquei com a sensação de que o livro é excessivamente caudaloso. Demora pra chegar ao clímax, mas compensa quando após cinco anos de aventuras, nosso herói finalmente chega a Dallas, se aproxima do infame Lee Oswald, o assassino de Kennedy.

Mas não se esqueça: O Passado é Obstinado!

Durante a leitura, eu me perguntava como o autor resolveria o seguinte dilema: se ele não impedisse o assassinato de JFK, toda a trama seria em vão e anti-climática; mas se salvasse Kennedy da morte, como explicar que vivemos num futuro em que o presidente morreu de fato? A solução desse dilema é um primor de elegância. King demonstra mais uma vez porque é o mestre.

Uma passagem do livro me deixou especialmente emocionado:

“Na Carolina do Norte, parei para abastecer num posto e depois dei a volta para usar o banheiro. Havia duas portas e três placas. HOMENS estava escrito com letras cuidadosamente pintadas com estêncil numa das portas, DAMAS na outra.

A terceira placa era uma seta numa vara. Apontava a encosta coberta de mato atrás do posto. Dizia DE COR. Curioso, andei pelo caminho, com cuidado para contornar alguns pontos onde as folhas oleosas do sumagre-venenoso, num verde fugindo para o marrom, eram inconfundíveis. Torci para que os papais e mamães que pudessem levar os filhos até aquelas instalações lá embaixo soubessem identificar o que eram aqueles arbustos problemáticos, porque no final dos anos cinquenta a maioria das crianças usava calças curtas.

Não havia nenhuma instalação. O que encontrei no fim do caminho foi um riachinho estreito com uma tábua atravessada em cima, sobre dois suportes de concreto dilapidado. O homem que precisasse urinar podia apenas ficar à margem, baixar o zíper e deixar sair. A mulher poderia se segurar num arbusto (supondo que não fosse urtiga nem sumagre-venenoso) e se agachar. A tábua era onde a gente se sentava se tivesse de cagar. Talvez sob chuva torrencial.

Se lhe dei a ideia de que 1958 era perfeito como um seriado de televisão, basta lembrar o caminho, ok? Aquele ladeado de sumagre-venenoso. E a tábua sobre o riacho.”.

Não fosse por ser um grande escritor, eu teria extrema simpatia por Stephen King pela sua incansável crítica a Donald Trump, seu apoio a Obama e sua coragem quando defendeu um dos meus escritores favoritos, o premiadíssimo Salman Rushdie, britânico de origem indiana, quando ele foi perseguido com ordem de assassinato pelos aiatolás do Irã quando publicou Os Versos Satânicos.

Rushdie escreveu diversos livros maravilhosos e li todos, mas ao ler sua biografia, que descreve seu sofrimento durante mais de uma década escondido para não ser morto, proibido de viajar em quase todas as companhias aérea e com livros boicotados, quando vários intelectuais, editoras e políticos de todo o mundo lhe viraram as costas, quando ele precisava urgentemente publicar seus livros para conseguir se sustentar, vejo que veio exatamente de Stephen King, um autor que ele nem conhecia, uma ajuda fundamental. Rushdie narra o episódio na sua biografia.

“À época da publicação de Os Versos Satânicos, foi a colaboração dos escritores que possibilitou sua comercialização nas grandes redes de livrarias. Stephen King entrou em contato com as editoras e as ameaçou dizendo que, se o meu livro não fosse comercializado, seus títulos também não seriam. King ainda os advertiu dizendo que outros autores fariam o mesmo, e Os versos satânicos foi então distribuído nas redes.”