26.11.16

O BAIANO INTERATIVO NA BLACK FRIDAY

Todos têm uma história para contar sobre sua experiência com a Black Friday, todos pegaram uma fila gigante em promoções. Também tenho minha história e ela está cercada de baianos interativos, aqueles seres peculiares que habitam esse universo paralelo quântico chamado Salvador.

Deixem-me guia-los até a cena. Lá estava eu após duas horas na fila das Lojas Americanas do Salvador Shopping, um dos tops da capital baiana. Nas mãos cds, dvds e blurays pela metade do preço que para um fanático por música e promoções é algo irresistível ao ponto de aguentar torturas medievais.

Devidamente justificada a minha presença naquele insólito território de horrores, passo a narrar os fatos que sobrevivi para contar. Podem parecer não crível para almas nobres, mas garanto que tudo é 100% verdadeiro.

Veja a cena. São 5 da tarde e a fila não dá sinais de vida. Apenas um caixa funcionando para o pagamento de cds, dvds e livros. E pensava eu que ali seria mais rápido por ser exclusiva para o pagamento desses itens enquanto quinze outros caixas eram utilizados para o pagamento dos outros dez milhões de itens à venda. Ledo engano, pois se o caixa único era exclusivo para os itens seletos, alguém esqueceu de avisar isso à atendente a aos clientes que escolheram aquela fila, usando-a, indiscriminadamente para pagar de fraldas descartáveis a panelas de pressão, de lençóis a caixas de absorventes.

O cheiro de gente suada impregna o ar mesmo com o ar condicionado no máximo, as pessoas se esbarram, se espremem, se esfregam, trocam odores enquanto coisas caem no chão com estrondo e o alto falante da loja grita os itens “por apenas R$ 9,90. Isso mesmo, R$9,90!”. Tudo isso narrado por alguém que precisava urgentemente de um fonoaudiólogo.

A trilha sonora do terror não poderia ser mais adequada: Em decibéis perigosos para a saúde e que fariam inveja a um fã do Iron Maiden, As Coleguinhas Simone e Silmara cometiam Se o nosso amor se acabar eu de você não quero nada/Pode ficar com a casa inteira e o nosso carro/Por você eu vivo e morro/Mas dessa casa eu só vou levar/ Meu violão e o nosso cachorro”.

O que pode ser pior do que ouvir essas moças gritando tal pérola do cancioneiro sertanejo num disco? Sim. Pode ser pior, meu amigo: ouvir a versão ao vivo com a plateia das Coleguinhas cantando e gritando junto. A ninguém ocorreu chamar a vigilância sanitária para combater tal atentado aos nossos tímpanos e à nossa saúde mental.

Se a fila parecia amorfa, não se engane, é apenas aparência. Enquanto a moça do caixa demonstra sua agilidade típica de um Barrichello baiano, com o pensamento nefelibata de alguém que já não está mais nesse mundo há semanas, as pessoas na fila praticam o seu esporte favorito: a interatividade.

Ninguém querendo perder seu lugar, as pessoas já estão íntimas depois de duas horas. De fato, já estavam íntimas mesmo nos primeiros 20 minutos.

Um moça atrás de mim me explica, sem que eu pergunte, porque comprou tantos boxes de dvd: “Ah, eu comprei mesmo! Quer saber? (era uma pergunta meramente retórica), comprei todos os Harry Potter e Jogos Vorazes! Todos! Tá pela metade do preço. No ano passado não comprei e me arrependi. Comprei todos! Comprei mesmo!”.

Balancei a cabeça, concordando educadamente, esperando não dar sinal de muito estímulo para que ela continuasse a mostrar quantos boxes havia comprado.

Após duas horas a gente fica sabendo que tem um grupo de pessoas na fila que chegaram à porta do Shopping cinco horas antes da sua abertura. O grupo veio em uma caravana de Conceição de Maria, cidade no interior e estavam todos com caixas cheias de compras para revender. Viajaram a noite toda e manifestavam preocupação com a hora do ônibus. “Se demorar muito a gente vai perder o transporte”, dizia um. “Vira essa boca prá lá, Agnaldo, dizia outro”. Alguém que não pertencia ao grupo viu a oportunidade para falar sobre o maravilhoso assunto dos transportes intermunicipais e outro falava da aprazível Conceição de Maria....ahhh que linda cidade.

De tudo se vê nessa vida numa fila de Black Friday. Imaginava que se aquilo acontecia no Salvador Shopping, num dos melhores da cidade, o que não estaria acontecendo no Piedade e no Lapa? Minha imaginação não dava conta.

A fome. Depois de tantas horas, as pessoas já se empanturram de amendoins, biscoitos recheados e guloseimas diversas que aparentemente estavam sendo levadas ao caixa para serem compradas. Após tanto tempo esperando, o povo parecia achar justo devorar tudo e entocar depois a embalagem em algum desvão.  Ninguém tem tempo pra punir essas transgressões e um frenesi de comilança se abate sobre a fila. As pessoas já nem se envergonham de conversar entre si com as bocas cheias de balas, cocadas e deliciosos pés-de-moleque. Recomendo os pés-de-moleque.

A fome também bate nos bebês e uma moça com uma criança feia e mirrada no colo resolve amamentá-la ali mesmo na fila. Senta-se num tamborete de plástico (um dos itens da sua compra), tira o seio para fora do vestido e o enfia na boca do menino que mama voraz. O pai da moça olha a cena com uma naturalidade de que já viu aquilo vezes sem fim. O menino mama com os olhos arregalados e atentos a tudo.

Ahhh o belo esporte da paquera entre baianos interativos. O ambiente vira um terreno ideal para as tentativas de prévias de acasalamento entre os indivíduos da espécie. Enquanto um rapaz até bem ajeitadinho reclama que se ficar na fila muito tempo vai perder o emprego e a mulher, uma abordagem pouco original e uma vã tentativa de fazer-se interessante para uma moça, esta mesma jovem replica em um baianês castiço: “Ôôôôxxxi. Tu não tá pegando nem gripe quanto mais mulé”.

O que poderia ser um diálogo mais da esfera do íntimo, torna-se assunto saboroso para as pessoas próximas e as não tão próximas na fila, tornando o infeliz rapaz alvo de zombarias dos demais. A moça percebe que mandou mal, pois o rapaz não era desinteressante, e tenta se emendar, mas o outro já não dá mais bola. Ela se arrepende, dá pra ver a expressão no seu rosto. Um futuro casamento acaba ali antes de começar.

As Coleguinhas Simone e Silmara se calam. O disco acabou. Então o que parecia ser um alívio para os ouvidos revela-se outra coisa: o som bruto da multidão.

Suprimida pela gritaria das Coleguinhas, nem havíamos notado quão alto as pessoas falavam. Sabemos que o baiano interativo definha com o silêncio, então aquela voz no alto falante da loja diz: “Liu, se dirija à sessão de cd! Liu, à sessão de cd!. Fred, aperta o play aí pra gente ouvir mais”.

E o sacana do Fred põe de novo pra tocar As Coleguinhas ao vivo que, a cada refrão, bradam sua marca registrada: “Chora, miséra!”. Se eu não fosse uma pessoa adulta choraria.

Então ficamos sabendo por que Liu foi chamada à sessão de cds. É que o caixa travou no momento em que um senhorzinho passava suas compras de mais de R$ 1 mil. Sacolas e mais sacolas já estavam cheias quando a máquina travou.

Atrás de mim uma baiana interativa, vamos chamá-la de Jurema, pois seu nome jamais será conhecido, há duas horas se queixava da fila, todo o tempo reclamando: “É hoje que eu sou demitida. Fechei meu consultório pra vir aqui pra esse inferno. Isso aqui não anda”.

Jurema reivindicava atenção e exortava os demais da fila para que reclamassem junto com ela: Anda aí, minha senhora! Ô moço, tira essas mulé desse som. Affff Maria, a gente tem que aguentar essas putas gritando Chora miséra. Até de miséra a gente é chamada aqui.”

Quando Jurema percebe que o caixa travou com as compras do senhorzinho, vai à beira da loucura: “Ô meu tio, prá que comprou tanta coisa! Não tinha mais fralda não?”

O homem tinha aproveitado a imperdível promoção de fraldas descartáveis pela metade do preço, o que metade da fila também tinha feito. A outra metade, que não sabia as delícias do cocô e do xixi infantil, pilheriava. Alguém gritou: “Vai ter menino assim prá mijar lá na Baixa da Égua”. Outro aproveitou pra perguntar se o colega não ia levar fraldas pra Conceição de Maria.

O velhinho sacava item por item das inúmeras sacolas, coisas que já estavam registradas para passar tudo de novo pelo caixa. A baiana Jurema explodia indignada e pediu, nervosa, para passar na minha frente pois, certamente já teria perdido o emprego.

Cedi e ela ficou exatamente atrás do velho reparando item por item que ele comprara. Comentava sobre cada um.“Esse lençol foi que travou o caixa, meu tio. Não leva isso mais não senão pode travar de novo!”.“Esse Exu dessas mulé não sabe cantar outra coisa não? Troca essa música aí, seu erê”.

O velhinho, envergonhado, baixa os olhos. A neta pré-adolescente, ao seu lado, tapa os ouvidos com os dois dedos com força tentando não ouvir os petardos da baiana que agora exatamente atrás dele insistia em comentar cada item da sua compra.

Depois do que parecia ser um tempo infinito, a compra foi aprovada  e toda a fila aplaudiu exortada por Jurema: “Minha gente, parece que o lençol passou”.

Quando chegou a vez de pagar, o velhinho digitou a senha do cartão com todo cuidado. Pegou os óculos no bolso para não errar.

Jurema não ajudava em nada gritando: “Não me erre essa senha, meu tio. Olha lá hein?”

A neta queria se afundar no chão enquanto o velhinho digitava. Alguém lá atrás gritou: “Vai dormir em lençol novo hoje, hein papá?

Então a senha passou. A fila inteira aplaudiu. Houve assobios. O velhinho, aliviado, acenou como quem tinha cruzado a linha de uma maratona.

O monitor do caixa, estranhamente voltado para o público, como para expor a todos a vida alheia, finalmente apresentou o valor das compra. 

Foi quando Jurema gritou: Porra, meu tio. Em 10 vezes?

24.11.16

KILL BILL - VOLUME 2

O cineasta Quentin Tarantino é mesmo um cara de talento indiscutível. O homem tem a cultura pop que beira as raias do absurdo. Acompanhar o ritmo do seu talento nas telas é um exercício constante de admiração e deleite.

Em Pulp Fiction, um dos seus primeiros longas, contou com um baita de um elenco e inovou a maneira de contar uma história, filmar e editar em cinema, um feito até para quem já havia detonado no ótimo Cães de Aluguel, onde Tarantino continuou a nos surpreender com diálogos aparentemente banais, mas que ficavam realmente interessantes na boca de um grupo de assassinos. Já é clássica a cena em que os bandidos discutem a letra de Like a Virgin antes de partirem para um assalto de resultado trágico.

           Tragédia e comédia se inserem em doses extremamente equilibradas nos filmes de Tarantino. Outro elemento que surpreende é a enorme cultura musical do homem. Seus filmes tem trilhas sonoras que são verdadeiros achados. Comprar um CD com a trilha sonora é quase um gesto automático dos fãs que saem de um dos seus filmes.

            Kill Bill - Volumes 1 e 2 são mais uma prova do fôlego indiscutível de Tarantino. Os dois filmes foram feitos como se fossem um só e depois divididos a pedido da produtora e com o aval do diretor. Essa foi uma decisão mais do que certa, pois os dois são como duas peças complementares.  Em Kill Bill volume 1 vemos uma feérica demonstração de agilidade, violência extrema (um dos elementos mais caros ao diretor) e trilha sonora arrebatadora.

            A continuação traz a noiva: Uma Thurman, continuando a sua vingança. Alguém já disse que se você sai para uma vingança deve abrir duas covas (obviamente uma para si própria). Tarantino, como sempre, subverte essa ideia e as covas são abertas (literalmente) para muito mais gente.

            Em Kill Bill, Tarantino faz uma verdadeiro épico e também uma declaração de amor à sua estrela favorita, a bela e talentosa Uma Thurman. A ideia do filme surgiu de uma conversa do diretor com a atriz quando ainda estavam no set de Pulp Fiction: uma assassina decide largar a vida de crimes para se casar e o s seus cúmplices revoltados decidem matá-la no dia do casamento.

            Uma Thurman é A Noiva. Após sair de um coma prolongado, no volume 1, ela parte de cara para a sua vendetta pessoal, viaja para o Japão, aprende diversas lutas como um samurai de verdade, produz uma carnificina maravilhosamente filmada com uma trilha sonora arrebatadoramente coreografada como uma homenagem magistral aos grandes e antigos filmes japoneses de lutas marciais (outra paixão declarada do diretor) e ainda se dá ao luxo supremo de contar parte da história em animação, no estilo mesmo das animes, historias de desenhos japoneses para adultos, mas que são adoradas por adolescentes também (se continuar a enumerar mais paixões do diretor não paro mais).

            O filme não é contado em um único formato de película, nem com o mesmo tipo de fotografia e nem com narrativa linear convencional, ora, estamos falando do gênio Tarantino. Há uma sequência claustrofóbica dentro de um caixão enterrado, uma outra genial com a participação de um dos autores mais lendários do cinema oriental (Gordon Liu Jia-hui no papel de Pei Mei).

            A mitologia de Kill Bill conta que Tarantino chegou ao requinte de esperar dois anos para filmá-lo, pois não o faria sem Uma Thurman e como ela estava grávida de verdade (a gravidez da atriz no filme é falsa), ele aguardou a estrela estar pronta.

            A atriz conta que foi o trabalho mais difícil de sua carreira pela necessidade de tremendo preparo físico para as lutas. Nesse volume 2, a Noiva ainda precisa matar três membros da antiga quadrilha.  No volume 1 ela já fez uma carnificina mas só matou duas das antigas colegas (Lucy Liu e Vivica A. Fox). Nesse segundo filme, a Noiva precisa se vingar dos personagens de Michael Madsen (Budd) e de Daryl Hannah, interpretada por uma ameaçadora e ao mesmo tempo sensual Hannah com tapa-olho. Há duas cenas já antológicas da atriz: a primeira quando ela, calmamente, lê num papel as consequências de um envenenamento por uma cobra enquanto um dos personagens agoniza. A outra cena é ultra-hiper-cool luta com a Noiva dentro de um trailer.

            E, finalmente, faltava a Noiva matar Bill, o chefão interpretado por David Caradine. Não dá para não torcer pela bela Thurman um minuto sequer. É emocionante o seu encontro com a filha que ela julgava morta ao som de Malagueña Salerosa.  Um filme belo, rico, violento, pop, cult, épico, moderno, clássico, enfim, mais um Tarantino para a nossa coleção.



11.11.16

A PROFECIA

Vamos falar claro. Há apenas uma razão para um filme ser feito: ganhar dinheiro! Tudo bem que existem uns poucos gatos pingados, diretores e roteiristas, que ainda têm um resquício de ilusão de que se pode utilizar a selva do cinema para transmitir um conceito, projetar uma ideia, criar uma obra de arte em plena era da reprodutibilidade globalizada. Estamos falando de uma indústria, bem entendidos?

Ideias? Bem, reciclagem é mais barato e tem retorno garantido. Exemplos desse raciocínio de mercado: “O Código da Vinci”, “X-Men 3” e “A Profecia”. O primeiro, adaptação para o cinema de um best seller arrasa-quarteirão; o segundo, uma coisa que no cinema quase sempre dá certo, continuação; o terceiro uma praga chamada remake. Nos três casos, vemos o enorme poder da mídia na divulgação de um filme. O que se gasta em publicidade tem retorno praticamente garantido na bilheteria. O público é muito previsível e os estúdios sabem disso muito bem. É como tirar pirulito de criança e por isso investem maciçamente em divulgação. Ou seria lavagem cerebral? A estratégia de marketing deste remake foi muito criativa. O estúdio lançou o filme, internacionalmente, no dia 06/06/06, a marca que o filho da besta traz no corpo. Boa sacada!

A Profecia segue a mesma básica trilha batida dos remakes, quase um gênero à parte. Pergunta inocente: por que ver a copia se o original, melhor, está à nossa disposição? A Profecia, o filme original de Richard Donner, de 1976, não envelheceu nada, conseguiu manter o mesmo frescor de quando foi feito e isso não é pouca coisa para um filme de qualquer gênero.

No original havia uma trilha sonora espetacular ganhadora do Oscar. A canção “Ave Satani”, arrepiante, praticamente fica gravado no inconsciente de quem alguma vez viu o filme. No papel do Damien original tínhamos o garotinho Harvey Stephens, assustador e que até recebeu uma indicação ao Globo de Ouro, como Revelação Masculina.

A história é muito boa, um dos melhores filmes de terror já feitos. Um diplomata adota um bebê após a esposa perder o filho no parto, ele esconde o fato dela até que seis anos depois o menino passa a se revelar o Anti-Cristo. Liev Schieber (“Pânico 1, 2 e 3”) e Julia Stiles (“A Supremacia Bourne”) substituem os grandes Gregory Peck e Lee Remick no papel dos pais do diabólico Damien, mas eles não são páreo para os originais. No papel-chave da babá do filho da besta, está a ótima Mia Farrow, que antes já havia estrelado o cult “O Bebê de Rosemary”, onde interpretava, justamente, a mãe do filho do diabo.

O ator mirim Seamus Davey-Fitzpatrick, fica no chulé do pequeno e elogiadíssimo menino do filme de 76. O olhar gélido, misterioso e sombrio do garoto original nem de longe são atingidos por esse segundo Damien que se limita a franzir o cenho e piscar os olhinhos. Isso não assusta nem uma freira.

O elenco de apoio é um luxo, mas, infelizmente, não consegue carregar o peso do filme inteiro. Os três mais importantes são Pete Postlethwhaite (Oscar por “Em Nome do Pai”), no papel do atormentado padre Brennan, David Thewlis (de “Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban”), como o fotógrafo, e Michael Gambon, o arqueólogo (você o viu como Dumbledore em “Harry Potter e o Cálice de Fogo”).

Os efeitos especiais dessa segunda filmagem se limitam mesmo a dois bons sustos (a plateia grita nos dois), mas que são devidos muito mais ao som altíssimo da sala de cinema nas duas cenas do que propriamente pela criatividade delas. 

Mas uma coisa não se poder negar nesse tipo de filme, o público gosta mesmo de levar uns sustos e está disposto a pagar tem por velhas novidades requentadas. O original, de 30 anos atrás, é 30 vezes melhor, mas quem está interessado nisso?

FAHRENHEIT 11 DE SETEMBRO

Uma das minhas atividades favoritas é ir a cinemas e festivais de cinema, onde já cheguei a assistir cinco filmes seguidos e 50 filmes em 15 dias mas aplausos no final de filmes vi poucas vezes. Não é sempre que se ouve aplausos no final de um filme, em Salvador, então, é raríssimo. Isso aconteceu ao final do filme “Fahrenheit 11 de Setembro” , de Michael Moore.

“Fahrenheit 11 de Setembro” é um documentário-libelo extremamente critico ao governo Bush e teve ótima bilheteria no Brasil, país considerado em pesquisa da BBC como dos que mais odeiam os Estados Unidos. Os aplausos do espectadores refletem o espírito antiamericano raivoso que envolve as plateias não somente brasileiras, mas também mundiais.

O filme superou as estimativas, já elevadas para um documentário, com mais de 91 mil espectadores no final de semana de estreia do Brasil. Nos EUA, foi o primeiro documentário a ultrapassar a marca de US$ 100 milhões de bilheteira e ganhou a Palma de Ouro no Festival de Cannes. O documentário anterior de Michael Moore, o excelente “Tiros em Columbine”, já havia ganhado um Oscar. 

Vai me doer muito dizer que o que vou dizer aqui, pois sou fã de Michael Moore, mas “Fahrenheit 11 de Setembro” não é tão bom e não merecia a Palma de Ouro. Ele, na verdade, se revela uma peça de propaganda com qualidades e defeitos. Mesmo a gente gostando do diretor, tendo simpatia e torcendo por ele na sua ferrenha luta contra Bush, o filme não é uma obra-prima e, falando a verdade, seu sucesso deve-se muito ao seu co-protagonista, nosso inimigo favorito, George W. Bush.

Há filmes-propaganda que são artisticamente inovadores, como os que a diretora Leni Riefenstahl fez para o Congresso Nazista de Nuremberg (Triunfo da Vontade) e para as Olimpíadas de 1936 em Berlim (Olympia). A qualidade daquelas películas resistiu aos anos de execração da crítica e hoje são peças de arte que não perderam a aura de beleza nem ficaram datadas. 

Um dos seus principais defeitos é que, diferentemente de “Tiros em Columbine”, ele parece ter sido feito as pressas para aproveitar as eleições americanas. Há muitos momentos desiguais, alguns engraçados e inspirados, outros sensacionalistas e cansativos.

Toda a parte dos votos fraudados da Flórida é ótima e a sequencia de Bush numa sala de aula infantil, por intermináveis sete minutos, abobalhado após receber a notícia do segundo avião (ele já sabia do primeiro) é divertida e, ao mesmo tempo, chocante. A narrativa de Moore ao fundo é deliciosa.

Mas o filme fica didático quando esmiúça as relações da família Bush com os Bin Laden e os sauditas. Em seus livros: “Cara, Cadê O Meu País?” e “Uma Nação de Idiotas”, Best-sellers internacionais, Moore explica isso muito bem, mas a linguagem de cinema, mesmo documental, implica uma agilidade que um livro dispensa. Ser didático num livro-denúncia é mesmo um mérito, mas em cinema diferentes tipos de imagens com diversas texturas de películas para provar uma tese – fotos, jornais, TVs, VHS, 8 mm, 32 mm, infravermelho, etc. – cansam e confundem o espectador que não tem opção de fechar o livro para respirar, absorver as informações ou retornar ao parágrafo anterior.

O filme continua a se arrastar num longo e cansativo natal dos soldados americanos em Bagdá. Fica grotesco, mas ao mesmo tempo encorpado e forte quando mostra cenas chocantes de corpos de bebês iraquianos mutilados e a revolta de um pai segurando o corpo esfacelado da sua criança perguntando que culpa o garotinho tinha ou a revolta impotente da velha iraquiana, cuja casa foi destruída, chorando e gritando para o céu: “Onde você estava, Deus?”

As cenas da dupla de fuzileiros navais abordando jovens negros pobres para alistamento são tão surrealistas e imorais que merecia uma analise de um cientista social sobre o papel das forças armadas na sociedade americana. Os fuzileiros falam com a maior naturalidade sobre as abordagens como se planejassem um estupro. Moore, a seguir, reflete sobre como é extraordinário que justamente negros pobres, que sofrem com um governo discriminatório, aceitem ir a uma guerra em nome desse mesmo governo. Uma parte inspiradora do filme.

Alguns momentos são engraçados, mas constrangedores como as cenas em que Moore tenta convencer congressistas a alistar os filhos. O diretor informa que só um congressista tem filho na guerra, mas, infelizmente, essa é uma informação que esconde uma falsa estatística. Considerado o numero de famílias americanas, a percentagem de filhos de congressistas na guerra é maior do que nas famílias em geral. O que, obviamente, não torna essa guerra estúpida menos imoral.

A leitura feita por Moore do decreto patriótico, que os congressistas apoiaram sem ler, é uma imagem de propaganda que apesar de engraçada é inócua e apelativa. E é quase patética a cena da mãe do soldado morto chorando em frente à Casa Branca, bem como o uso que o diretor faz do soldado, que se recusa a servir no Iraque. O soldado faz uma pálida e triste figuração tornando-se mais um a ser usado por Moore. Por uma boa causa, mas usado.

Não estou entre os que se chocaram em ver Moore também usando e destroçando o já velho e encarquilhado Charlton Heston, presidente da conservadora Associação Nacional de Rifle dos EUA em “Tiros em Columbine”. Como já disse Nelson Rodrigues: “Os canalhas também envelhecem.”.


Apesar de tudo, “Fahrenheit 11 de Setembro” é um filme importantíssimo e necessário nestes tempos bicudos. Como diz na sua propaganda, não é um filme, é um evento. Mesmo com seus defeitos, o audacioso Moore tem já o mérito de erguer o gênero documentário, sempre relegado pelos estudos e espectadores, alçando-os as esferas dos grandes eventos cinematográficos.

O SEGREDO DE BROKEBACK MOUNTAIN

É difícil selecionar as imagens mais marcantes desse filme transbordante de silêncios eloquentes em planos abertos, diálogos densos e bela fotografia. Há muitas cenas fortes, como o embate sexual rude e brutal entre os homens em uma barraca ou quando o personagem-ilha-do-mar, Ennis Del Mar, vê seu mundo solitário ruir, ao se separar do companheiro após a descoberta do idílio de Brokeback Mountain e literalmente desabar, esmurrando uma parede, em desespero e abandono. Jamais o amor aparecera em sua vida e quando surge vem rompendo seu coração e entranhas. A dor, insuportável e desconhecida, até então, é tão real que ele precisa gritar.

Marcante também a sequência em que o personagem, Jack Twist, dirige a camionete com um radiante sorriso para, em seguida, encher a tela do cinema de tristeza com lágrimas sufocadas e partir em busca de uma autoestima esquecida e dar satisfação a um desejo físico, urgente, simulacro do amor.

A cena em que o pai leva os filhos para ver um homem castrado por ter um companheiro revela o cuidado do sensível diretor Ang Lee em contextualizar a atmosfera psicológica asfixiante que dominava o personagem-ilha, o que o levara a viver numa prisão de palavras. Ang Lee, utilizando-se de um econômico e bem sacado flash back, introduz na narrativa linear, um recurso que será, adiante, fundamental, em um segundo flash back, para a compreensão do destino do outro personagem.

Atordoante é a cena final, de uma desoladora promessa de redenção impossível. Um filme  divisor de águas, com uma mensagem de sutil desesperança. Ou talvez não! Um dos filmes mais políticos dentro de uma safra que tem uma marca não-alienante, como Crash, Capote, Munique, O Jardineiro Fiel, Marcas da Violência, Siriana, Boa Noite, Boa Sorte, Transamérica, Paradise Now.

Brokeback Mountain é um tapa na cara de uma América conservadora, de uma região de cowboys com preconceitos arraigados e que votou em massa em um presidente que luta de modo desigual contra todos os direitos das minoras. Não é a toa que o filme se passa no estado do Wyoming, onde o jovem Matthew Sheppard, foi espancado até morrer por ser gay, o que inspirou Annie Proulx, a autora do conto original.

Tratar, com sutileza, do embate entre o amor de dois homens – em que a única cúmplice é a montanha – e a vigilância severa da moral conservadora, mostrando, em uma obra prima, a derrota desse amor, deixa a todos nós também um pouco derrotados.

Ao final, o homem-ilha, insulado em seu trailler, solitário american white trash, sem futuro e perspectiva e que guardará apenas a memória de poucos momentos passados em uma bela montanha. Pouco, muito pouco para o que lhe fora oferecido e recusado. O destino não reserva beleza ou alegria para quem o teme. Não há redenção para quem tenta escapar da felicidade possível.

Isto, além de arte, também é política!

MÁ EDUCAÇÃO

Pedro Almodóvar poderia ser chamado de um diretor de grife “antigrife”. Dessa característica, resultam seus inúmeros fãs e suas maiores qualidades e charme: o anticonvencionalismo, o exagero, os arroubos de paixões, as cores berrantes, a irreverência, o kitsch, o histrionismo. 

Almodóvar ultrapassou uma fase inicial anárquica, teve um período intermediário onde foi firmando seu estilo debochado e intenso com melhora constante de qualidade em filmes, mas enveredou por novos caminhos e parece ter abandonado marcas que lhe pareciam caras.

Má Educação é o seu primeiro filme noir e assim difere substancialmente do padrão Almodóvar. O diretor nos acostumou com um estilo inconfundível, mas vários elementos a que nos acostumamos simplesmente desapareceram ou ficaram rarefeitos. Onde foram parar os vermelhos ardentes e os amarelos berrantes? 

O aspecto cromático festivo era um dos elementos fílmicos mais eloquentes do diretor. Era parte de sua narrativa como uma segunda linguagem, como as canções rasgadas que acompanham seus filmes.

As canções continuam presentes em Má Educação. A cena mais bonita, sem dúvida, é a do garotinho cantando Moon River. Quem lembrou de Audrey Hepburn em Bonequinha de Luxo, imagem já na história no cinema, o fez por uma associação sutil por demais. Almodóvar não sublinhou a cena com maiores referências, como era de se esperar dele, que nos acostumou às citações e homenagens ao cinema em seus filmes.

As cenas seguintes, em câmera lenta, de meninos nadando ao som de Moon River, não foi bem filmada, não tem boa fotografia, não emociona. É uma pena, um desperdício. A canção era tão bela, merecia tomadas menos distantes, fotografia mais bonita, angulações mais criativas, edição mais ousada... Teria Almodóvar receio de estimular a pedofilia? Um cineasta como ele está acima disso, afinal, este é um filme sobre pedofilia.

Mas Má Educação não fala só de pedofilia na igreja, fala de cinema também. Mas não parece falar com muita intensidade de nenhum dos assuntos, e perde várias chances de lançar sobre o cinema um olhar mais caloroso. O cineasta, interpretado pelo ator Felé Martinez, é tão frio e insensível que, como alter-ego do diretor, não parece sequer humano, não havia nele réstia alguma de alegria, nem durante o bloqueio criativo, nem quando dirigia ou finalizava seu filme.

Também há algo de não-almodovariano na escolha do astro Gael Garcia Bernal. Almodóvar é famoso por usar atores novos e depois torná-los conhecidos. Bernal não pareceu uma escolha muito acertada. Por melhor que seja o ator, e ele é ótimo, não é justo usá-lo nesse filme, não é justo para o próprio Almodóvar. A sexualidade em Má Educação é toda dolorosa, todas as cenas de sexo são roubadas, forçadas, compradas. O sexo, no filme, é uma ferida aberta. Óbvio que a sexualidade dos personagens gira em torno do drama da pedofilia, mas por que tanta frieza?

Seria injustiça, porém, não apontar uma característica positiva do filme: a corajosa narrativa metalinguística, mas as qualidades param por aqui, até porque é descuidada a edição das mudanças temporais e espaciais, sem recursos de amarração do roteiro. Nem sequer é justo exigir de Almodóvar um libelo anticlerical, ele tem razões pessoais e artísticas para escolher essa abordagem pacificadora. Aparentemente ele tinha fantasmas demais para exorcizar. Sabe-se que passou por episódios de pedofilia quando estudava num colégio de padres, mas o diretor não quis detalhar o seu papel nos eventos.


Almodóvar, em entrevista, na época do lançamento do filme, declarou: “Se eu tivesse rodado o filme há 15 ou 20 anos, ele seria um ato de vingança. Nessa altura da minha vida, terminá-lo foi uma liberação”. Isso mostra que o filme serviu ao diretor como uma terapia exorcizante e que tal catarse tornou-o mais livre. Má notícia. Enquanto prisioneiro dos velhos demônios, era a nós que ele libertava.

1.11.16

40ª MOSTRA INTERNACIONAL DE CINEMA EM SÃO PAULO

Mais um ano se passou e mais uma Mostra Internacional de Cinema em São Paulo está chegando ao fim. Este ano, mais uma vez cerca de 340 filmes para escolher e aquele dilema de saber que mais do que escolher aos que se vai assistir, vai-se escolher mesmo aqueles que vai perder...

Outro dilema dessa Mostra: assistir a 10 filmes seguidos do cineasta polonês Krzysztov Kieslovsky: Decálogo 1 a 10, cada um deles baseado em um pecado e cada um com uma hora de duração, ou ver cinco outros filmes inéditos que ocupam as mesmas 12 horas, todos com seus respectivos intervalos para xixi, café e pão de queijo. Optei por dispensar Kieslovsky, pois acho que não suportaria a pressão da sua densidade niilista pelo que já vi dele (A Trilogia das Cores: Igualdade, Liberdade e Fraternidade e as partes V e VI do Decálogo, respectivamente Não Amarás e Não Matarás).

Primeiro dia da Mostra já com o passaporte para 40 filmes na mão ao preço de R$ 340,00, me dava acesso a cada filme por R$ 8,50, valor mais barato do que eu pagaria com carteirinha de estudante: R$ 9,50 durante a semana e R$ 17,00 nos fins de semana. E se fosse para pagar inteira então seria o dobro, já que não sou estudante. Outra vantagem do passaporte é poder pegar os ingressos para os filmes com 3 dias de antecedência sem arriscar encontrar sala lotada, o que já me aconteceu em anos anteriores quando não pude comprar o passaporte. 

Teria eu assistido a 41 ou 42 filmes? Não sei responder pois deixei dois filmes pela metade de tão ruins que foram, então eles juntos (metade de cada um) somam um só? E depois que acabou meu passaporte ainda vi dois filme a mais. Conta 42?

Esse ano tive um exemplo vivo da capacidade alienante do cinema. No primeiro dia da Mostra, fominha como sou, decidi assistir a 5 filmes seguidos no Shopping Frei Caneca que tem 10 salas, cinco delas dedicadas a filmes da Mostra. Entro no shopping às 13:30 e saio às 23:30. Noto que o asfalto está molhado e penso: choveu. Na verdade a cidade de São Paulo passou enquanto eu estava no cinema por um dos maiores temporais, que derrubou dezenas de árvores, criou centenas de quilômetros de congestionamento, tumultuou os semáforos e a vida das pessoas por horas. Enquanto eu estava na bolha escura de uma sala com ar refrigerado.

Uma das coisas que tenho medo é parecer um dos loucos da Mostra. Frequentando o festival há 15 anos e vendo sempre as mesmas pessoas que aqui transitam todos esses anos, sinto que não sou uma pessoa mesmo muito normal. Honestamente não é normal uma pessoa ficar 15 dias só vendo filme e falando sobre esse único tema. Fico olhando pra essas pessoas que falam alto sobre os filmes, trocam opiniões aos berros com recomendações de filmes imperdíveis etc....Nessas horas agradeço a Steve Jobs pela invenção do I-Pod...

Essa gente é tão sem noção que tem uns caras que se julgam tão alternativos que só assistem a filmes que não têm previsão de entrar em cartaz por não terem ainda legendagem em português (as legendas em português são colocadas eletronicamente na hora do filme). São aqueles que curtem filmes filipinos de 5 horas (todo ano tem um filme assim) e detestam filmes norte americanos (é aquele tipo de gente que fala estadunidense pra não dizer norte americano). 

Este ano não encontrei Sérgio, aquele velhinho que em todas as Mostras marca presença. Nos últimos anos tenho visto ele se arrastando com um cheiro horrível de urina....uma incontinência óbvia. Como já disse uma vez, ele fede demais mas sabe tudo de cinema e então se uma sala cheira a urina é sinal de que o filme é bom pois Sérgio estará lá empestando o ar. Soube que ele foi proibido de frequentar as salas da Mostra. Nem sei se está vivo.

Outros diretores homenageados este ano junto com Kieslovsky foram o também polonês morto este ano Andrzej Wajda, com 17 filmes, o italiano Marco Bellocchio, com 12 longas e que inclusive assina o cartaz da Mostra que a cada ano é feito por um diretor diferente e o americano William Friedkin com 7 longas.


Mas aqui vai a lista dos filmes a que assisti este ano com suas classificações na minha opinião.

FILMES NOTA 10

CANASTRA SUJA - Um filme espetacular do diretor brasileiro Caio Sóh, que para mim fez o melhor filme que vi nessa Mostra e que me impressionou muito algumas mostras atrás com seu filme de estreia, o excelente Teus Olhos Meus. Aqui ele demonstra ainda maior maturidade na condução de uma história com roteiro muito bem amarrado, que prende o expectador num crescendo de tensão impressionante, atuações soberbas de toda a equipe com destaque para Adriana Esteves e Marco Ricca. Num subúrbio carioca, uma família disfuncional em que o pai tenta se recuperar do alcoolismo, a mãe vive uma vida sem graça mas com um caso tórrido com o namorado da filha, o casal de filhos mais velhos com pouca perspectiva de trabalho e uma filha caçula com autismo. A família se esfacela aos poucos e o drama parece se esgarçar até o limite máximo, mas o diretor consegue fechar a história com um final surpreendente e brilhante.


A GAROTA DESCONHECIDA – O novo filme dos irmãos belgas Jean-Pierre e Luc Dardene que já ganharam duas Palmas de Ouro por Rosetta e A Criança. Sempre é uma experiência fascinante assistir a um filme deles que já realizaram também os excelentes A Promessa, O Filho, O Silêncio de Lorna, O Garoto da Bicicleta e Dois Dias, Uma Noite. Aqui, a história de Jenny, uma jovem e competente médica com forte sentimento de culpa por não ter aberto a porta do seu consultório após o horário de expediente e, no dia seguinte, descobrir que a moça que a procurou foi encontrada morta ali perto. Jenny parte em uma busca pela identidade da morta, tentado se redimir, enfrentando ameaças de traficantes, agressões de suspeitos e o descaso da própria polícia por se tratar da morte de uma prostituta africana. Grande filme dos irmãos belgas que não fazem nada ruim. Uma bela viagem pela alma humana, mostrado com igual intensidade, tanto o seu lado mais perverso quanto o mais sensível.  

O APARTAMENTO - Ótimo filme iraniano vencedor dos Prêmios de Melhor Roteiro e Melhor Ator no Festival de Cannes.  Dirigido por Asghar Farhadi e que já dirigiu o ótimo À Procura de Elly (Melhor Diretor no Festival de Berlim), e A Separação primeiro filme iraniano a ganhar um Oscar. Conta uma história com ótimo roteiro sobre um casal obrigado a sair do apartamento onde vive por problemas na estrutura do prédio. No novo flat, um incidente ligado ao antigo morador vai mudar drasticamente a vida do jovem casal. A partir da busca por descobrir o que aconteceu com sua esposa, o marido busca vingança e não apenas justiça.

GLORY - Um dos melhores filmes a que assisti na Mostra. Na corrupta Burgária, um trabalhador ferroviário gago e aparentemente limítrofe, encontra uma enorme quantia de dinheiro nos trilhos e a entrega à polícia. Como recompensa, ele ganha um novo relógio de pulso, que logo para de funcionar e a chefe de relações públicas do Ministério dos Transportes, perde o antigo relógio do funcionário, uma relíquia de valor sentimental e única herança do seu pai. Ele começa uma luta desesperada para obter seu velho relógio de volta, assim como sua dignidade, enfrentando o descaso da burocracia e a insensibilidade da chefe de relações públicas. Um final que surpreende com uma reviravolta espetacular.


FILMES NOTA 9

SOLSTÍCIO DE VERÃO – Um excelente filme polonês. Em 1943 os alemães estão instalados na Polônia, uma ligação entre um rapaz polonês do interior, a filha de um fazendeiro local, um jovem oficial alemão e uma garota judia fugida de Varsóvia. Eles têm a oportunidade de se ajudarem mutuamente e o que os ameaça também os ajuda a fugir da dura realidade da guerra em que vivem: o amor. A improvável conexão entre os quatro, no contexto implacável de uma guerra, leva a uma série de tragédias.

LA VINGANÇA Coprodução Brasil-Argentina. Uma das comédias mais engraçadas que vi nos últimos tempos, uma das surpresas da mostra. Despretensiosa, leve e inteligente. Um humor a que não estamos muito acostumados no cinema brasileiro recheado de besteirol e comédias bestas. O filme é um road movie com os ingredientes típicos do gênero e se sai muito bem em todos os quesitos. A história de dois amigos que resolvem fazer uma viagem num opala amarelo para a Argentina. Para um deles a viagem objetiva reatar o romance com a ex que ele flagrou transando com um argentino. O outro amigo é o grande destaque do filme e rouba todas as cenas, o ótimo  Daniel Furlan, que busca vingar a traição ao amigo fazendo sexo com o maior número possível de argentinas. O filme brinca com a velha rivalidade entre brasileiros e argentinos e é extremamente divertido.

THE HANDMAIDEN - Em 1930, durante a ocupação japonesa na Coreia do Sul, uma jovem e bela ladra é contratada para ser criada de uma rica herdeira reclusa pelo tio dominador. Recrutada por um vigarista o objetivo é ajudá-lo a seduzir a herdeira, roubar sua fortuna e trancá-la em um hospício. Tudo parece correr conforme o previsto, mas várias surpresas aparecem mostrando que sempre há um golpe dentro de outro golpe e assim por diante. Tudo começa mesmo a dar errado quando a empregada e a herdeira se apaixonam e o filme exibe tórridas cenas de sexo lésbico que lembram o filme Azul é a Cor Mais Quente. O diretor sul coreano Park Chan-Wook é cultuado por uma legião de fãs que lotaram o cinema, famoso por quatro filmes premiados: Mr. Vingança, Lady Vingança e Oldboy (Grande Prêmio do Júri no Festival de Cannes) e Sede de Sangue (Prêmio do Júri em Cannes).

TEMPESTADE DE AREIA - Um filme israelense sobre uma família de uma aldeia palestina em que uma mulher se vê na embaraçosa posição de ser anfitriã do casamento do marido com uma segunda esposa mais jovem. Quando ela descobre o envolvimento da filha mais velha com um garoto da universidade e de outra aldeia, uma relação proibida, que envergonharia a família, a mãe tenta conter a situação, reprimindo a garota, mas a moça quer uma vida diferente para si. A escolha leva a uma sucessão de dramas envolvendo as famílias e a noção de honra e de dever. Um sacrifício da mãe leva a filha a avaliar sua escolha. Uma sociedade extremamente machista em que as mulheres não têm a menor chance de escolhas próprias. Venceu o Grande Prêmio do Júri no Festival de Sundance.


HEDI- Na Tunísia, o jovem e acomodado Hedi vai se casar e seguir o caminho traçado para ele pela família. Ele não espera muito do futuro e na semana anterior ao seu casamento, numa cidade litorânea acaba conhecendo uma dançarina de espírito livre que trabalha em um resort. A maneira como ela leva a vida o impressiona e os dois começam uma relação apaixonada. Com os preparativos do casamento a todo vapor, ele é forçado a finalmente fazer uma escolha por si próprio. O protagonista é interpretado pelo excelente Majd Mastoura, que transmite com brilho as angústias do personagem diante da vida e dos novos desafios cheios de promessa de felicidade e de riscos. O ator venceu o Urso de Prata de melhor ator e o filme, o Prêmio de Melhor Primeiro Longa no Festival de Berlim.

SOPHIE E O SOL NASCENTE - Em uma pequena e idílica cidade do sul dos Estados Unidos, com a 2ª Guerra Mundial destruindo a Europa, um oriental ferido é abandonado num ponto de ônibus. Confundido com um chinês, é cuidado por uma viúva que adora jardinagem e rapidamente demonstra ser um excelente ajudante para o jardim que fica cada vez mais belo. Quando o Japão ataca Pearl Harbor e os EUA entram na guerra o oriental, na verdade um americano descendente de japoneses, é perseguido e sofre ataques. Sophie, uma nativa solitária se encanta pelo forasteiro e uma amizade começa a partir de um interesse mútuo pela arte, tornando-se um namoro proibido e ameaçado pela violência. Um final de um lirismo extremamente poético com uma simples imagem de duas flores crescendo juntas em um jardim que só quem vê o filme capta.

FILMES NOTA 8

DIVINAS DIVAS - Um belo documentário dirigido pela atriz Leandra Leal sobre oito conhecidas transexuais e travestis, personagens icônicos da primeira geração de artistas transformistas do Brasil que desafiaram a moral de um país no auge da ditadura militar, nos anos 1960 e 1970, em apresentações no Teatro Rival produzidas pelo avô de Leandra Leal, herdeira do teatro. O documentário homenageia os 50 anos de carreira no palco do teatro e a luta pelos direitos humanos e pelas liberdades individuais no Brasil de ontem e de hoje. Na estreia no cinema do Shopping Frei Caneca uma multidão de transformistas e artistas gays conhecidos do cinema e da televisão.

HEARTSTONE - Em uma remota vila de pescadores na Islândia, os adolescentes Thor e Christian têm um verão turbulento. Enquanto um tenta ganhar o coração de uma garota, o outro descobre novos sentimentos pelo melhor amigo. Quando a estação termina e a natureza hostil da Islândia reassume seu lugar, chega o momento de enfrentar a vida adulta. A frieza das relações humanas e a aspereza do tratamento entre famílias e jovens é um retrato do clima inóspito e hostil onde a doçura e o sentimento de afeto, no caso entre dois rapazes, pode levar a uma repressão que descamba para a violência e a repressão brutal. Forte e com uma breve insinuação de esperança na cena final.

CONSPIRAÇÃO DA FÉ – Filme dinamarquês com boa produção, excelente iluminação e tomadas caprichadas sobre o desaparecimento de crianças em comunidades religiosas. Os irmãos Samuel e Magdalena são sequestrados na mesma semana em que a polícia de Copenhague encontra uma garrada no mar com um pedido de socorro escrito oito anos antes por um menino em cativeiro. A partir daí dois policiais (um ateu e um muçulmano) descobrem uma conexão entre as duas histórias e ao investigar a comunidade religiosa, encontram um longo rastro de sequestros e assassinatos. Numa Mostra recheada de cinema independente e com poucos recursos de produção mais caprichada, esse filme é uma boa exceção.

AMOR E OUTRAS CATÁSTROFES – Filme dinamarquês despretensioso mas muito humano e honesto. Um casal aparentemente perfeito e com dois filhos. A esposa, psiquiatra, quer ter mais um bebê e engravida sem contar ao marido e ele exige que ela aborte. Ao mesmo tempo, ele também engravida a amante, paciente da sua esposa e também exige dela um aborto. O filme aborda essa situação com realismo e sem máscaras. Uma situação de caos que exige maturidade para lidar com emoções tão intensas.

FILMES NOTA 7

BENCH CINEMA -  Filme iraniano que poderia ser mais bem produzido, pois traz uma ótima ideia. É aquele tipo de filme que praticamente está num subgênero “Filmes que falam sobre cinema”. Conta a história de um homem que após sair da prisão e sendo apaixonado por cinema, passa seu tempo assistindo a filmes e decorando todas as falas. Como o vídeo é proibido no Irã, ele decide viajar pelo país reencenando sozinho os filmes clássicos. Forma uma trupe itinerante com um violinista de rua, um artista visual insone e uma ex-atriz. O filme tem excesso de citações dos filmes e suas trilhas sonoras e talvez merecesse um tratamento mais artístico e menos precário. É bonita a ideia de mostrar pessoas simples sendo emocionadas por uma apresentação pobre mas bem intencionada diante da proibição do audiovisual pelo regime dos aiatolás, mas uma direção mais sensível poderia obter melhor resultado. Aplausos de um público um pouco condescendente ao final. Destaco uma cena em que o censor diz que mesmo o público não vendo os filmes, mas usando a imaginação, a interpretação é perigosa pois a imaginação deve ser controlada.

ARANHA VERMELHA - Em Cracóvia no final dos anos 60 o jovem Karol mora com  os pais e passa seu tempo praticando saltos ornamentais. Sua vida é insossa e sem emoções até que descobre um assassino em série que já matou mais de dez pessoas. O jovem se coloca no caminho do criminoso, no que parece ser a única maneira de sentir-se realmente vivo. O contato dessas duas personalidades tortuosas vai gerar consequências imprevisíveis. 

DESCONHECIDA - Um filme americano com aquele gênero mais independente e intelectual que o pessoal de Sundance adora. Com um elenco de força (Rachel Weisz, Kathy Bates e Danny Glover) se passa em Nova Yorque e conta a história de Tom que comemora seu aniversário com amigos, organizado por sua mulher quando a misteriosa Alice chega à festa e Tom tem certeza de que a conhece. O filme se transforma em uma jornada dupla de reconhecimento noite adentro. O que Tom e Alice buscam da vida são coisas opostas, enquanto um quer a estabilidade e a previsibilidade, a outra busca o desapego total, a liberdade e as novas experiências.

ELLE - Um filme do diretor Paul Verhoven com a diva do cinema francês, a sempre excelente Isabelle Huppert em um papel que parece ter sido feito para ela: uma executiva de jogos de videogame que parece ser indestrutível e implacável. Após ser estuprada em sua própria casa por um mascarado ela se recusa a denunciar o caso polícia e começa a seguir os rastros desse homem. Começa um jogo de poder que gira em torno de novos ataques e violência que a qualquer momento vai sair do controle. A forma como ela lida com a situação certamente deixa parte da plateia atordoada, mas apenas aquela parte que não sabe do que a dupla Paul Verhoven-Isabelle Huppert é capaz. Realmente o cinema francês não é sinônimo de uma boa digestão.

SÃO JORGE - Filme sobre os problemas recentes em um Portugal em uma crise grave de desemprego e depressão econômica. Afundado em dívidas, Jorge, um boxeador desempregado prestes a ser abandonado pela esposa brasileira e seu filho pequeno, aceita trabalhar em uma agência de cobranças que o arrasta para um mundo de violência e crime. O ator Nuno Lopes venceu o Prêmio de melhor ator no Festival de Veneza.

FILMES NOTA 6

MARGUERITE AND JULIEN Filme francês de época sobre dois irmãos se amam desde a infância e ao crescerem a paixão se torna voraz escandalizando a família e a sociedade. Eles são perseguidos e sofrem pelo amor fugindo para viver juntos enfrentando a todos. O tabu do incesto não é algo fácil de encarar e eles pagam um preço alto pelo amor. A antiga musa do cinema francês Geraldine Chapin faz uma participação especial.

LA MADRE - No interior da Espanha, um garoto de 14 anos, procurado pelo Serviço Social tem uma mãe desempregada e instável incapaz de cuidar dele. Ela o envia para se esconder na casa de um ex-namorado, um imigrante romeno. A situação se torna crítica quando a mãe desaparece e o garoto passa a depender demais da boa vontade de estranhos, causando conflitos por onde passa até que suas opções vão se acabando e ele tem que enfrentar seus piores medos.


TANNA - Uma coprodução da Austrália e Vanuatu sobre uma das últimas sociedades tribais do mundo na Oceania. Duas tribos rivais vivem se atacando e uma das formas de buscar a paz e a convivência é o casamento de jovens entre as duas tribos, mas num clássico argumento do cinema e da dramaturgia que é o amor proibido e que sempre rende boas histórias desde Shakespeare,uma jovem rompe com seu casamento arranjado para fugir com seu amante da mesma tribo, desencadeando uma guerra que ameaça o futuro de todos. Excelentes tomadas do alto de um vulcão ativo. Todos os atores eram amadores e integrantes da própria comunidade. Um final que surpreende mas que é organicamente inteligente. Nunca tinha visto um filme de Vanuatu


METEOR STREET - Um filme alemão sobre a relação conturbada e também afetuosa de dois irmãos palestinos em Berlim. Lakhdar, mais velho, e Mohammed, de 18 anos, após fugirem da guerra do Líbano. Com os pais ainda no Líbano, Mohammed tenta encontrar seu caminho em um mundo de homens rudes. A diretora Aline Fischer estava presente para apresentar o filme que não me encantou tanto assim, mas recebeu aplausos tímidos acredito que mais por contra da diretora que estava ali. Uma  história triste de busca angustiada de encontrar um significado para a vida, mas que promete algum sentido com um final simples mas honesto. 

NUNCA VAS A ESTAR SOLO - Um filme do Chile sobre violência contra os homossexuais. Baseado numa história real. Um senhor introvertido gerente que vive sozinho com seu filho Pablo, gay de 18 anos, que é vítima de um violento ataque homofóbico que o deixa em coma. Durante a luta do seu pai por justiça e assistência médica, ele percebe o quão distantes e estranhos ele e o filho se tornaram. A falta de testemunhas e as exorbitantes contas do hospital forçam o pai a deixar a estabilidade de sua vida para reposicionar-se em um mundo preconceituoso. 


MORTE EM SARAJEVO - Em Sarajevo, um hotel se prepara para a festa de gala da União Europeia em memória do centenário do assassinato do arquiduque Francisco Ferdinando, o que desencadeou a Primeira Guerra Mundial. Enquanto os funcionários do hotel planejam uma greve pelos salários não pagos, o hotel, hipotecado, está em vias de ser tomado pelo banco. Do telhado do imóvel até o porão, passando pela recepção, lavanderia e cozinha, as crescentes tensões transformam o Hotel Europe em uma panela de pressão ideológica retrato da eterna crise dos balcãs envolvendo sérvios, croatas, bósnios, cristãos e muçulmanos. O filme venceu o Grande Prêmio do Júri e o Prêmio da Crítica no Festival de Berlim.


FILMES NOTA 5

EL PRIMERO DE LA FAMILIA – Filme chileno que não deslancha. Em um subúrbio de alguma cidade do Chile, Tomás passa o último fim de semana com sua família antes de viajar à Europa para continuar seus estudos. Um problema com a encanação causa uma inundação na casa e o mau cheiro, segundo a sinopse, revelaria a verdadeira essência das relações familiares, mas não me pareceu que essa analogia fez sentido. Para mim, foi um filme com roteiro fraco e atuações rasas e pouco inspiradas.

ENCARANDO MEU PRATO - Filme croata sobre uma família disfuncional. Uma moça que sustenta uma família com um pai que era dominador e autoritário e que tem um derrame, uma mãe irresponsável e um irmão mais velho meio limítrofe. Essa nova posição da moça como mantenedora da casa permite que ela explore sua força e sexualidade. A família, percebendo que pode perder seu sustento não permite que a jovem se liberte.  Ela vai definir-se a partir das promessas vagas da liberdade e a prisão da família disfuncional

INVASÃO ZUMBI - Uma comédia-drama de zumbi, quase um subgênero, em que um misterioso surto viral ataca toda a Coreia do Sul e em um trem expresso todos estão tentando sobreviver à epidemia que atinge o país. No trem que segue para a única cidade que se defendeu da epidemia, os passageiros devem lutar pela própria sobrevivência. Uma produção de padrão médio para alto com algumas cenas inspiradas como a multidão de zumbis sendo arrastada por um trem. 


FILMES NOTA 4

O ANJO FERIDO - Filme do Cazaquistão que conta quatro breves histórias sobre quatro jovens tentando sobreviver em uma aldeia pobre do Cazaquistão: uma vítima de bullying que não pretende reagir; um garoto que terá que sustentar a família, pois seu pai acabou de sair da prisão; um menino que junta sucatas de metal e acha um tesouro guardado por três crianças desajustadas; e um rapaz que teme que seus estudos médicos sejam afetados quando sua namorada engravida. Não entendi o tal anjo ferido do título nem como as quatro histórias se amarram no final.


DEPOIS DA TEMPESTADE - Um filme japonês bem sem graça e que pelo timming de comédia arranca algumas risadas forçadas de uma plateia muito condescendente. É a história de um escritor em decadência que  trabalha como detetive particular e desperdiça em jogos o pouco dinheiro que ganha. Após a morte do pai, ele tenta retomar o controle de sua vida e reconquistar o amor e o respeito da mãe, do filho e da esposa. Durante uma noite de tempestade eles são obrigados a passar um tempo juntos e têm a oportunidade para reatar esses laços. Se não apelasse para o cômico poderia ser menos banal.

FILMES NOTA 3

DEPOIS DO AMOR - Filme grego sobre um músico falido de 30 anos que está tomando conta de uma casa luxuosa e sem conseguir superar o fim do namoro planeja prender a ex num final de semana na mansão e só deixá-la quando ela explicar o motivo do fim do relacionamento. Um casal que aparentemente tem uma sintonia ótima, ambos são meio maluquinhos e sexualmente têm uma química explosiva. A situação deles não corre o menor risco de dar certo.

O PLANO DE MAGGIE - Uma comedia romântica com pegada de cinema independente americano com elenco composto entre outros por Ethan Hawke e Julianne Moore - Maggie é uma jovem de 30 anos com histórias de insucessos amorosos e que decide ter um filho só e pede o sêmen de um ex-colega hipster. É quando ela se apaixona pela primeira vez por um professor de antropologia casado e infeliz no casamento com uma dominadora esposa. O filme dá um salto e quatro anos depois, com uma linda filhinha, o novo casal descobre que esse não era o final feliz que Maggie esperava. É quando ela cria um novo plano para ajustar as coisas.


FILMES NOTA 2

AS ASAS DO MEU PAI – Na Turquia no universo da construção civil um idoso trabalhador é diagnosticado com câncer e ele precisa deixar o trabalho para tratar o tumor, mas ele não tem o dinheiro necessário pois se parar de trabalhar perde sua dignidade. Também não tem direito a se aposentar ainda nem pode pagar o valor necessário para a aposentadoria. O drama pela busca da dignidade na sociedade turca moderna.

DECÁLOGO 7 -  Da série de Krzysztov Kieslovsky, mas não sei exatamente a qual dos dez pecados o filme alude. Enquanto era estudante do ensino médio, uma jovem teve uma filha que sua mãe criou como se fosse sua. Quando a jovem se sente pronta para a maternidade, a mãe se recusa a deixá-la levar a criança embora. Ela então sequestra sua própria filha, procura o pai da criança que não vê há anos e gera uma série de conflitos emocionais.


DECÁLOGO 8 - Krzysztov Kieslovsky: Uma professora de ética em Varsóvia é visitada por uma americana que pesquisa o destino dos judeus sobreviventes da Segunda Guerra Mundial. Elas duas descobrem que estão ligadas por uma decisão da professora que décadas afetou a vida da americana, salvando-a da morte e fazendo que fosse adotada por cristãos. Depois de tantos anos a procura pelas raízes e pela história pessoal não será tão simples.


FILMES NOTA 1

LAS PLANTAS - Um filme chileno pouco inspirado, um fiapo de roteiro sobre uma jovem de 17 anos cuja mãe está internada com câncer, o pai ausente e que precisa cuidar de seu irmão em estado vegetativo. Ela lê para o irmão uma história em quadrinhos chamada Las Plantas, sobre almas de vegetais que tomam conta dos corpos das pessoas durante a lua cheia. Nessa mesma época a jovem começa a explorar sua sexualidade, conhecendo estranhos por meio da internet.Foi considerado o melhor filme da seção Generation 14plus no Festival de Berlim. Imagino que os outros eram bem piores. De qualquer modo tem uns ingredientes juvenis como a descoberta do sexo, universos de cross players e algumas imagens de nudez explícita.

ANTES O TEMPO NÃO ACABAVA – Um filme brasileiro que faz a gente entender porque o cinema argentino dá de dez no cinema nativo. Um roteiro mal amarrado e uma história sem estofo e sem indicação mínima de sinal desfecho. Dois diretores para um filme que não diz muito, apesar de que os atores não são tão ruins, mas também estão longe de serem bons. Um filme com boas intenções. Um jovem índio em conflito com as tradições do seu povo, enfrenta os líderes da sua comunidade na periferia de Manaus para morar sozinho no centro da cidade. O fato de o jovem índio ser bissexual parece mais uma jogada do roteiro para atrair um certo grupo simpatizante de alguma questão de gênero que não vai muito além da simpatia pelo protagonista. No cinema em que vi o elenco e os diretores estavam presentes dando entrevista e apresentado o filme que esteve no festival de Berlim.


O ESTUDANTE -Filme russo que não me agradou como um todo e que mostra um adolescente em crise de fanatismo à Bíblia. Ele vira pelo avesso a vida da mãe, dos colegas e de todo o colégio devido aos seus questionamentos filosóficos e religiosos. Somente sua professora de biologia o desafia e esse embate não resulta satisfatório. Achei interessante quando as citações literais do rapaz são acompanhadas por transcrições na tela, mas depois de algumas vezes a sacada fica repetitiva e cansa. Além disso, a atuação do protagonista carece de  maior sutileza e torna-se inverossímil, a partir de certo ponto, a excessiva tolerância dos colegas e da escola com as maluquices do aluno. Não parece nem de longe crível que aqueles adolescentes permitiriam que um colega como aquele tivesse aquele nível de liberdade para pregar o que prega e muito menos que o colégio desse aquele espaço para isso. Não me pareceu honesto nem de longe.


LOBO E OVELHA – Um filme que parece não ter roteiro. Uma história no limite da banalidade. Na zona rural do Afeganistão, o pastoreio é feito por crianças, que dominam as montanhas e, apesar de não haver adultos por perto, conhecem todas as regras. Meninos e meninas não podem ficar juntos. O filme mostra o cotidiano dessas crianças. Tudo tem a profundidade de um pires e é impressionante que o filme tenha vencido o prêmio Art Cinema na Quinzena dos Realizadores no Festival de Cannes. Parte da plateia aplaudiu ao final. Acho que não pertencemos à mesma tribo.


FILMES NOTA ZERO

O QUARTO HOMEM - Filme holandês de 1983 do diretor Paul Verhovenn que dirigiu alguns dos mais importantes filmes do cinema holandês e também RoboCop, O Vingador do Futuro, Instinto Selvagem, Showgirls e Tropas Estelares. Aqui um filme meio datado, mal envelhecido com estética de filmes pornográficos dos anos 70/80 com imagens saturadas e com baixo contraste. Historia de um escritor bissexual e alcoólatra que se envolve com uma mulher misteriosa cujos três maridos morreram em acidentes. Não gostei nem um pouco.

CORAÇÕES CICATRIZADOS - Um filme romeno insuportavelmente chato. Além de usar o recurso da tela quadrada (coisa que nem é mais original, pelo menos três filmes na Mostra já fizeram isso com mais sucesso como Mommy, O Filho de Saul e O Homem das Multidões), para jogar uma pá de cal na chatice usa planos fixos. Em nenhuma das cenas há movimento de câmera e tudo que se move para fora e para dentro do pequeno quadro são os atores e muitos deles estão em camas de um hospital, ou seja, sem movimentos. Enfim, é prá irritar o expectador e assim me irritou tanto que deixei o filme na metade. Se passa em 1937 quando um jovem passa uma temporada numa clínica na costa do mar Negro com tuberculose óssea. Apaixonado por outra paciente, ele narra sua tentativa e a de seus companheiros em aproveitar ao máximo a vida enquanto seus corpos definham.

A DRAGON ARIVES!- Eu não saberia dizer muita coisa sobre esse filme iraniano, apenas que ele é tão chato e insuportável que saí na metade, algo que raramente acontece, principalmente porque eu gosto demais do cinema iraniano, mesmo os que tem uma narrativa bastante arrastada. Aqui não é a narrativa arrastada que me incomodou mas a narrativa empastelada. Não dá pra sabem em que tempo a história se passa, não falo do tempo como época mas de presente, passado ou mais passado. As transições entre os tempos é nenhuma e não se percebe de qual dos tempos estamos falando ou se é um documentário falso ou uma ficção falsa. Pela sinopse trata-se de uma história de um detetive que recebe a missão de investigar o suicídio suspeito de um preso político exilado em um ilha remota. Em um navio abandonado num antigo cemitério no deserto um mistério ainda maior é descoberto. Pelo jeito começa uma mistura de paranoia e alucinação. Cinquenta anos depois, uma antiga caixa é descoberta nos fundos de um armário e seu conteúdo joga uma estranha luz sobre esse enigma. Não tive paciência alguma para compactuar com essa farsa e nenhum interesse em descobrir que enigma era esse. O enigma pra mim foi saber como as pessoas conseguiram assistir esse filme até o final.