24.1.13

Django Livre é Mais um Show de Tarantino



Ao desfrutar de qualquer uma das obras primas de Quentin Tarantino, sabemos o que esperar. E ele nunca decepciona seus admiradores. É impossível não assistir a qualquer cena filmada por ele sem perceber, imediatamente, quem a concebeu. Diretores desse tipo, com marca e estética próprias, há pouquíssimos atualmente. Talvez Woody Allen e Pedro Almodóvar sejam os outros dois.

Em Django Livre, Tarantino, mais uma vez, demonstra o inquestionável talento que já exibiu nas joias em forma de celulóide: Bastardos Inglórios, Kill Bill, Cães de Aluguel, Pulp Ficcion e Jackie Brown.

O tema da escravidão é ainda uma ferida não totalmente cicatrizada na cultura norte-americana e poucas vezes ela foi retratada no cinema com as cores reais, com seu caráter violento e vil. Não fosse pela maestria que resultou num filme espetacular, Tarantino já mereceria ser louvado pela coragem em cutucar essa ferida até sangrar. Aliás, alguém discorda que as duas qualidades sejam atributos do diretor? A coragem e a atração pelo sangue e a violência?

Mais do que a violência pura, é o tema da vingança que mobiliza todas as energias de Tarantino, seu leitmotiv pessoal, na estética que homenageia desde os velhos filmes B aos antigos filmes de gangster ou de kung fu de Bruce Lee, passando pela blackspoitation (movimento dos anos 70 de filmes dirigidos e protagonizados por negros) e agora fazendo releitura particular de um western à la Sergio Leone. As películas de Tarantino são adornadas por trilhas sonoras exuberantes, diálogos insólitos de tão coloquiais, violência estilizada, inversões narrativas, planos abertos alternados por closes extremos e uma mistura de tensão, humor e catarse que, invariavelmente, fazem do espectador mais do que um admirador, um cúmplice do diretor.

Destaque merecido para o ator Christoph Waltz, que já levara o Oscar pelo papel do nazista sádico em Bastardos Inglórios, do próprio Tarantino, e agora concorre novamente ao prêmio por Django Livre, já tendo levado para casa o Globo de Ouro este ano pelo papel do caçador de recompensas que liberta o personagem título, interpretado magistralmente por Jamie Foxx, infelizmente esquecido em todas as indicações. Injustamente esquecidos também foram Leonardo diCaprio fazendo excepcionalmente bem o primeiro vilão da sua carreira, e Samuel L Jackson, como um negro que se diverte barbarizando os irmãos de cor.

O filme recebeu muitas críticas de alguns setores culturais dos Estados Unidos, como do diretor Spike Lee, ativista dos direitos dos negros, que anunciou um boicote a Django Livre sem sequer a ele assistir, entre outras coisas, pelo uso excessivo da palavra “nigger”, considerada muito ofensiva pelos negros norte-americanos. No Brasil equivaleria a “crioulo”, como está nas legendas. Spike Lee declarou: “A escravidão americana não foi um western spaghetti de Sergio Leone. Foi um Holocausto. Meus ancestrais foram roubados da África”.

Spike Lee certamente sabe que muitos negros eram escravos de outros negros na própria África antes de ser vendidos a comerciantes brancos, o que não diminui o drama dos seus ancestrais. O problema é que Spike Lee se considera proprietário do assunto “conflito racial” e sempre protesta quando um diretor branco ousa tratar do tema.

Tarantino se defendeu dizendo que “o filme fala sobre a época da escravidão, um período terrível e injusto. Como alguém pode fazer um filme sobre a escravidão sem mostrar as injustiças que eram cometidas?”. Jamie Foxx, que interpreta Django, completou: “Spike é um diretor fantástico, mas ele se torna mesquinho ao atacar seus colegas sem acompanhar o trabalho que está sendo feito. Para mim, isso é irresponsável.”

Vá ver Django e esqueça essa discussão ridícula do politicamente correto, delicie-se com tudo que o filme oferece, torça por Django e dê as merecidas risadas na cena em que os brancos da Ku Klux Klan debatem sobre quão incômodas são as máscaras brancas que usam para esconder os rostos.

2 comments:

Anonymous said...

Goulart,

Eu assisti Django Livre ontem.

O ponto alto do filme para mim é a cena, magistralmente bem dirigida, na qual os brancos altercam contra a má qualidade das máscaras feitas pela esposa de um deles. Eu me pipoquei de rir. Os outros espectadores pareciam não entender a frande sacaneada que o Tarantino deu em cima da Klan.

Tarantino homenageia vários estilos na obra.

De início, Django de Tarantino é o mesmo personagem de uma co-produção franco-italiana de 1967 "Django Mata em Silêncio", que assisti quando era garoto. Western Spaguetti dos bons.

Produção longa, essa do Tarantino, mas, você nem sente o tempo passar.

Também gostei da Atuação de Samuel L. Jackson, que retora ao universo do diretor, irrepreensível no personagem Stephen.

Abraço.

Cláudio Melo.

Unknown said...

É verdade: Tarantino nunca decepciona seus admiradores. "E attendez la creme", Caps!