Reconheço,
porém, o potencial de Caçando Carneiros para se igualar a Kafka à Beira-Mar em
ruindade porque Kafka tem insuperáveis 576 páginas da mais pura chatice, enquanto Caçando Carneiros
conseguiu parar em 336 páginas. Ficaria melhor com um corte de
25%.
Aqui temos um personagem jovem e sem nome (e sem qualquer carisma), publicitário dos mais banais, que recebe uma incumbência estranha de encontrar um misterioso carneiro desaparecido no interior do Japão. E mais não digo, pois não há qualquer necessidade já que é tudo uma enrolação.
Se o livro tem uma pegada de realismo
fantástico, fica devendo muito à tradição que nos deu Gabriel Garcia Márquez e Salman
Rushdie, encravado entre o que se chama de literatura de enigma e
literatura do fantástico, vertentes das histórias com
solução racional ou com solução fantasiosa. Murakami fica na metade do
caminho de ambas.
Este livro,
que foi responsável pela grande divulgação do autor pelo mundo e o transformou num
fenômeno literário, foi escrito em 1982, quando Murakami ainda não tinha 30 anos, e fica claro sua atmosfera juvenil, que difere dos seus trabalhos
seguintes mais amadurecidos, já que, felizmente, ele é um escritor muito prolífico.
O trecho a
seguir mostra o tom juvenil que retrata o niilismo do protagonista: “Eu tinha
vinte e nove anos. Dentro de seis meses, diria adeus à casa dos vinte. Uma
década vazia. Nada do que eu conquistara tinha valor, nada do que eu realizara
tinha sentido. Tédio era tudo que eu obtivera.” A presença desse elemento
niilista blasé soa bastante datado no estilo que se convencionou chamar de
ficção pós-moderna, conceito ele próprio também datado e que consiste
basicamente em atirar meio aleatoriamente nas páginas da obra imagens e falas
sem muito sentido, confiando que o leitor por si só dará alguma coesão a tudo. Seria ótimo se a narrativa não passasse de uma sucessão de banalidades.
Na internet
circula uma imagem conhecida como “Bingo de Murakami” (reproduzo) em que bem
humoradamente (ou não) vemos aquelas ideias que são obsessões do autor e
aparecem frequentemente em suas obras como gatos, telefonemas misteriosos,
longas viagens de trem, um milionário enigmático, sexo estranho, cabana
isolada, comida, solidão, música pop, jazz e suicídio.
Murakami
todo ano entra na lista dos candidatos ao Nobel de Literatura e arrasta uma
multidão de fãs pelo mundo inteiro, sendo o autor japonês mais celebrado pelo
planeta. Curiosamente, no próprio Japão seus conterrâneos não entendem esse sucesso comentando que há no país muitos autores tão bons quanto e que
não têm tanta repercussão. Mas não há o que se fazer. O jeito é ler os outros
livros do autor para tentar encontrar o mesmo prazer de ter lido O Incolor
Tsukuru Tazaki e Seus Anos de Peregrinação e Minha Querida Sputnik. Por sorte,
há muitos ainda nas prateleiras.
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