Duas fotos separadas por 12 anos e muitos quilos.
Caetano Veloso foi homenageado em 2012 durante o Grammy
Latino na Cidade do Pecado, mais conhecida como Las
Vegas. Caê escreveu, então, que estava pela primeira vez em Vegas quando, admirado, a comparou com sua Santo Amaro natal.
Os Velosos adoram essas comparações. Há algum tempo, Maria Bethânia, ao chegar pela primeira vez em Paris, declarou que a achou igualzinha a Santo Amaro da Purificação, onde os Velosos reinam como semideuses ao lado do rio Subaé.
O que será que tinha no leite do peito de dona Canô que
fez isso com a mente dos filhos? Bethânia acha Paris igual a Santo Amaro; Caetano acha o mesmo de Las Vegas.
Em seu artigo escrito assim que retornou da viagem, Caetano compara Vegas a Los Angeles: "Tudo em Los Angeles parece um precário esboço de
concentração urbana aberto para o céu, o vazio, a rodovia expressa, o deserto,
os olhos do coiote”. A cidade já servira de inspiração para Caetano na bela canção “Minhas
Lágrimas”, do disco Cê, que diz: “Desolação de Los Angeles,/ a Baixa
Califórnia e uns desertos ilhados por um pacífico turvo/ a asa do
avião/ o tapete cor de poeira de dentro do avião/a lembrança do
branco de uma página/ nada serve de chão onde caiam minhas
lágrimas.”
Finíssima poesia. Pérola bruta.
Para Caetano, Los Angeles não se enquadra no critério de cidade. Assim ele define uma cidade: “Lugar onde a gente entra e se
vê rodeado de sólidas paredes de alvenaria”. Assim seriam Paris, Las Vegas e
Santo Amaro, mas não Los Angeles.
Minha cidade natal tem semelhanças com
o berço dos Veloso, cidadezinha cortada por ruas estreitas, casas coloridas
ou sem reboco, pracinhas, igrejinha, coreto na praça, um rio...Então assimilo o
que Caetano chama de cidade: “território urbano, com calçamento de
paralelepípedo e casas coladas umas às outras: o mundo selvagem das matas, dos
mangues, dos braços de mar ficando fora dos muros”.
A moça do
balcão da Delta no aeroporto de Nova Iorque havia olhado para o meu bilhete e abriu um
enorme sorriso: “Vai para Las Vegas?
Me leve na mala!” E continuou: “Vai lá apostar hein?” Meu acompanhante completou: “Não, nós vamos para um show de Madonna”. Foi a senha para a mulher arregalar os olhos azuis e exclamar: “I Loooo-ve Madonna!!!”. Minha mãe, ao meu lado, não perdeu a deixa e decidiu expor seus vastos conhecimentos da língua de Shakespeare e tascou: "Me too" Ela também ia assistir Madona no imenso cassino MGM.
Eu não pretendia retornar a Vegas após 12 anos da primeira viagem no ano 2000, quando usei a desculpa de conhecer o
Grand Canyon. Desta segunda vez, Madonna serviu de desculpa perfeita, já que nem fui ao
Grand Canyon no ano 2000, tampouco fui no show de Madonna.
Poucas
vezes vi tanta pulsação de vida num lugar só como Las Vegas. Uma cidade
improvável construída no meio do deserto. No meio do nada, surgindo um oásis de
vida, calor e seres humanos. Nunca vi tantas fontes jorrando água ao mesmo tempo, incluindo a
maior do mundo, com gigantescos jatos d’água que
dançam acompanhados de músicas famosas e luzes coloridas.
É quase impossível descrever Las Vegas. Uma vez tentei fazê-lo num texto caretíssimo, chamando-a de cidade de plástico. Como sempre, Oscar Wilde tinha
razão quando disse que “Definir é limitar”.
Não é
somente plástico que define Vegas. Vida é mais adequado. Não é por outra razão
que, nos prédios gigantescos, restaurantes e cassinos
fervilhantes, tantos shows ocorrendo ao mesmo tempo, a vida pulsa.
Não é senão por
conta dos bípedes implumes que
tudo aquilo foi construído, pela nossa infinita fome de luxo, sexo e emoções baratas e caras, que inúmeros homens e mulheres se exibem, apostam fortunas, comem demais, bebem tonéis de álcool, exageram nas muitas drogas. Frenesi de luzes e excessos, do mais brega ao
mais chique; do mais sofisticado ao mais grotesco lado a lado. Parece que algo vai subitamente fugir
do controle...
A sensação é de que absolutamente tudo
pode acontecer em Las Vegas. Encontrei um traço comum no meio daquele quase caos: em todos os rostos olhos brilhavam com um tipo urgente de vida, seja pelo reflexo dos milhões de
lâmpadas dos painéis luminosos de neon, dos semáforos, dos faróis dos carros e limusines, das placas reluzentes de lojas de grife com
roupas que custam fortunas bem na frente a lojinhas que vendem 5 camisetas made in China por U$ 9,99.
Apesar de a cidade oferecer diversões
caríssimas, há muito a se fazer com apenas alguns dólares no bolso, bastando um pouco de criatividade e a companhia certa dos
amigos mais divertidos e dispostos a tudo. Mas para onde tanta
alegria vai quando o sol nasce mas, sobretudo, onde encontro amigos insanamente divertidos para dividir uma
noitada em Las Vegas?
Caetano disse no seu artigo que vai levar os filhos
e netos para verem com ele o show “Love” dos Beatles, um dos vários espetáculos
do Cirque du Soleil.
Não vi “Love”. Preferi “Zumanity”, no hotel-cassino New York, show do mesmo grupo, mas impróprio para menores de 18 anos que
mostra o lado sexual e sensual do Cirque du Soleil. Uma dica para quem deseja
ser eletrificado e vibrar no ritmo alucinado de Las Vegas.
Enquanto isso, minha mãe assistia Madonna
no MGM, hotel-cassino em frente.


1 comment:
Dida Santiago precisa continuar te provocando. Adorei seu texto.
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