Na mesma semana assisti a dois filmes de diretores completamente
diferentes: Os Oito Odiados, oitavo filme de Quentin Tarantino, e Boi Neon,
segunda ficção do pernambucano Gabriel Mascaro. As coincidências acabam no fato
de ter visto os dois filmes na mesma semana .
No mais, não podem ser mais diferentes.
Assisti a todos os
filmes de Tarantino e sou tiete do seu cinema autoral, repleto das suas marcas
cult: diálogos inspira dos, humor
negro, violência desmedida e cenas repletas de referências a filmes antigos. Já
o cinema de Gabriel Mascaro, para mim, significara apenas sair na metade do seu
filme anterior, Ventos de Agosto, tamanha a chatice e pretensão do filme.
Mas eis que me vejo
apaixonado por Boi Neon e decepcionado com Os Oito Odiados. E eu
preparadíssimo para soltar novos rojões para Tarantino e torcer novamente o
nariz para Mascaro.
Os Oito Odiados tem uma série de problemas, a começar pelas
desnecessárias três horas de durações e longuíssimos diálogos que deixam o
terreno do inspira dor e beira m o falatório tagarela.
O filme tem graves problemas de ritmo. Em um Tarantino, estamos
acostumados a ver um crescendo de tensão até as explosões de violência como em
Cães de Aluguel, Django Livre, Kill Bill e Bastardos Inglórios. Em Os Oito Odiados ,
as cenas iniciais em que os atores praticamente passam quase uma hora dentro de
uma carruagem, refletem pura preguiça do roteiro e pouca criatividade nas
tomadas de câmera.
O diretor parece estar copiando a si mesmo quando emula Cães de
Aluguel, transferindo a ação de um galpão fechado para uma hospedaria isolada e
mesclando outra autocópia ao repetir o tom racista de Django Livre.
Na escalação do elenco, há certa preguiça em repetir o que já
funciona, sem correr riscos. Seria bom ver o diretor apostar em caras novas ao
invés de seguir sua zona de conforto com rostos familiares. Kurt Russell já foi visto em À
Prova de Morte; Tim Roth atuou em Cães de Aluguel, Pulp Ficcion e Quatro
Quartos; Michael Madsen também trabalhou em Cães de Aluguel; e Samuel L.
Jackson é figura carimbada dos filmes do diretor.
O personagem de Bruce Dern, ator excepcional, também figura tarantinesca (Django Livre), está praticamente servindo de figuração de luxo. O bonitão do momento Channing Tatum aparece num desempenho que dá pena, e os sempre excelentes Tim Roth, Demián Bichir e Michael Madsen estão subaproveitados.
Talvez a marca mais interessante seja a acertada escolha de Jennifer Jason Leigh, que andava sumida, para viver a quase única personagem feminina. Assim, Tarantino, pelo menos, mantém um pouco da sua bem sucedida estratégia de resgatar rostos que estavam no limbo do mercado, como fez com John Travoltaem Pulp Ficcion e Pam
Grier em Jackie Brown.
Talvez a marca mais interessante seja a acertada escolha de Jennifer Jason Leigh, que andava sumida, para viver a quase única personagem feminina. Assim, Tarantino, pelo menos, mantém um pouco da sua bem sucedida estratégia de resgatar rostos que estavam no limbo do mercado, como fez com John Travolta
A violência é marca de Tarantino e não se pode reclamar aqui de falta dela. Mas há grandes diferenças das cenas icônicas de violência extrema de seus filmes anteriores, como a quase “inassistível” sequência em que o assaltante de Cães de Aluguel corta a orelha de um policial com uma navalha ou os escalpelamentos de Bastardos Inglórios.
Um roteiro demonstra sua fragilidade quando apela para um
narrador. Isso é ensinado nas primeira s
aulas dos cursos de roteiro e Tarantino apelou para essa solução preguiçosa
para ligar duas cenas na metade do filme e introduzir, subitamente, um novo
personagem saído do nada para iniciar uma nova narrativa.
Já Boi Neon é um
filme-experiência. Uma produção inspira díssima
e que demonstra a grande coragem do seu diretor em explorar os limites dos
estereótipos do masculino e do feminino nas profundezas do sertão. Como diz a Folha, o filme é “uma rota da dissolução de estereótipos de gênero, que ganha
ainda mais força no terreno carregado do campo nordestino”
O filme coleciona
mais de uma dezena de prêmios de prestígio pelo mundo afora. Impossível não se
impressionar com o fato de o diretor Gabriel Mascaro (que também assina o
roteiro) ter recebido os prêmios especiais dos júris dos festivais de Veneza e
Marrakech diretamente das mãos dos diretores Jonathan Demme (O Silêncio dos
Inocentes e Filadélfia) e Francis Ford Coppola (trilogia O Poderoso Chefão).
Quando Cazarré, com
sotaque pernambucano impecável diz, em uma cena, que seu sonho é ser estilista,
em momento algum se vê qualquer fissura na sua masculinidade, refletida logo em
seguida na sua belíssima cena de sexo com uma mulher grávida que além de vender
perfumes, também porta um revólver, já que é vigia de uma fábrica.
Duplo desafio às
identidades de gênero, sem falar no tabu de filmar o sexo com uma grávida. A
cena flerta o explícito e é de uma beleza poética tão genuína, tão espontânea,
que merece entrar para o rol das cenas icônicas do cinema nacional. As únicas
do gênero que lhe chegam perto na cinematografia brasileira
são a de Marília Pera amamentando Pixote no filme de Hector Babenco e a
emblemática cena de sexo de Glória Pires e Alexandre Paternost sobre a mesa de uma
cozinha em O Quatrilho.
Os personagens que
acompanham Iremar são Galega, uma mulher que dirige um caminhão e dança em
cabarés; sua filha, a menina Cacá, que acompanha esse universo quase ambíguo
como se fosse um mini-peão; e Junior, personagem de Vinicius de Oliveira (o
Josué de Central do Brasil), um vaqueiro de longos cabelos alisados à base de
demoradas chapinhas e que usa aparelhos nos dentes porque acha bonito.
1 comment:
Oi Luis, ontem eu vi Boi Neon, achei que fosse gostar mais. Vi que você gostou muito. Achei que a história não se desenvolve,não evolui. O que eu gostei do filme foi a fotografia. A trilha sonora deixa a desejar. Dei duas estrelas para o filme de um total de cinco :) Pessoalmente te falo mais coisas!! NOé
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