Há algum tempo venho me perguntando por que as fabricantes
dos celulares inteligentes, os smartphones, gastam dinheiro com propaganda.
Elas poderiam economizar uma fortuna, pois os maiores garotos propagandas das maravilhas
dos smartphones são seus próprios usuários. Então, se alguém ainda não tem um
smartphone não terá sido por falta de coleguinhas martelando seu
juízo para fazer você se sentir uma espécie de Neandertal por ainda não ter aderido (ou
sucumbido) aos tais aparelhinhos.
Para mim, na medida em que os telefones se tornam mais inteligentes, seus usuários se tornam mais burros. Outro dia, num programa de televisão, quatro
mulheres falavam sobre os tais aplicativos e como eram felizes
por terem à mão aparelhos que medem batimentos cardíacos, identificam uma
música, servem como trenas, lembram-lhe a hora de tomar remédio, tiram fotos,
postam em redes sociais....o diabo. Uma delas chegou a dizer: hoje em
dia todo mundo tem um smartphone. Senti-me o último dos moicanos a quem só
restou um velho Nokia que tem uma câmera que nunca usei e que dá para ouvir
rádio, o que nunca fiz.
Eu nem precisaria ler uma pesquisa que mostra que as
pessoas estão dependentes dessas máquinas, eu vejo isso cotidianamente. Mas
chamou-me a atenção que está comprovado, com base em estudo dos sites Gazelle, Nielsen
ComScore, PRNewswire, Pew Internet e MSNBC, que 65% dos portadores de iPhones dizem
não conseguir viver sem os celulares, 40% deixariam o cafezinho de lado e 18%
deixariam de tomar banho todos os dias. E veja que incrível: 15% preferem
passar o final de semana com seus smartphones a fazer sexo.
Não achei nenhuma novidade saber
que 58% dos smartphonedependentes usam seus celulares em festas ou outros eventos. Vejo isso na minha academia, observo pessoas
hipnotizadas pelos seus aparelhos. Já cheguei a ver pelo menos
dez pessoas, simultaneamente, sentadas nos seus respectivos aparelhos
ou correndo em esteiras e bicicletas, todas futucando alguma coisa nos seus bichinhos
de estimação portáteis. Se tivesse um smartphone, fotografaria a cena e
publicaria imediatamente numa das redes sociais em que pululam fotos de shows,
pratos de comida ou gatinhos fofuchos.
Um dia, num show, ao meu lado vi
uma moça fotografar o artista que cantava para, em seguida, passar os longos
minutos de uma música inteirinha totalmente desconectada do que acontecia no
palco, pois se dedicava a postar em uma rede social a foto que acabara de
tirar, provavelmente retocando alguma coisa (creio que esses aparelhos
inteligentes devem servir para isso também), acrescentar algum comentário com a
interjeição “u-hu”, ou similar e, imediatamente, responder a comentários feitos
online. Enquanto isso, Gilberto Gil e Zeca Baleiro cantavam uma canção linda,
da qual a moça estava totalmente alienada. Aquilo me incomodou e eu passei a
observar o desenrolar da cena que nunca terminava já que mais
comentários pipocavam, exigindo dela respostas. Não resisti e toquei no seu
ombro dizendo: “Ei, o show é ali”, apontando para o palco. Juro que ela me
olhou com uma expressão totalmente vazia, como se não compreendesse o alcance
do meu comentário. Voltou para o que interessava: seu smartphone, deixando Gil só
para mim e os poucos Neandertais que restaram e a quem os smartphone não
abduziram.
Na Coréia do Sul, líder mundial do mercado de
celulares e terra da Samsung, o governo está preocupado com a crescente
dependência das pessoas. "São escravos sem cérebro", diz Kim Nam-Hee,
um dos especialistas que tentam sensibilizar os estudantes sul-coreanos sobre
os perigos dos telefones inteligentes, que viciam crianças cada vez mais novas.
Há casos de crianças que ameaçam se suicidarem se os pais confiscarem seus aparelhos. Na Coréia foi preciso um esforço conjunto dos ministérios da
saúde e da educação para criarem acampamentos de férias e desintoxicar
alunos viciados cujos sintomas são: ansiedade ou
depressão quando não podem ter os aparelhos em mãos, tentativas frustradas de
diminuir o tempo gasto com o aparelho e sensação de felicidade quando se está
conectado. Alguma semelhança com o crack?
Voltando à minha academia, sempre
me intrigou como as pessoas não se preocupam ao deixarem seus telefones caros no chão
ou em cima de uma máquina. Não têm medo de os esquecerem? Depois me toquei: isso
jamais aconteceria com pessoas assim, pois elas não são capazes de se afastar
demais do bicho. Deve haver alguma espécie de ímã ou um aplicativo que emite
sinais diretamente para seus cérebros, impedindo-os de se separarem dos seus smartphones.
A
Universidade americana de Stanford, também comprovou a dependência afirmando que
69% dos jovens disseram ser mais provável esquecer a carteira do que o celular,
75% já tinham adormecido com o iPhone na cama, 71% disseram já ter usado o
aparelho para evitar fazer contato visual. Estudo da Rutgers University, de
Nova Jersey, revelou que um terço dos usuários mostrava sinais de vício
similares aos de alcoólatras.
Outro dia, na TV vi um inventor feliz
da vida porque criou um aplicativo em que o próprio usuário programa seu
aparelho para ficar desligado. Só assim, segundo ele, muitos estudantes puderam terminar um
trabalho, escrever uma dissertação ou concluir um mestrado. Fiquei intrigado. A
pessoa precisa usar um aplicativo que a impeça de usar o aparelho? O que
aconteceu com o botão de desliga? Será que esses aparelhos não possuem esse botão? É
capaz mesmo de não serem possíveis de desligar e exigirem um aplicativo para
isso, na falta de um cérebro que os manuseiem.
3 comments:
Interessantíssimo o tema. Smartphone, Stupiduser. Eu sou admirador da tecnologia, mas vi também muitas cenas iguais àquela descrita no show de Gil. O importante não é o artista, nem a música, nem a própria pessoa, mas postar algo que "pareça" importante, que desperte a atenção dos outros para si, transformando o sentido de sua vida proporcional ao número de curtidas (likes). Sinal dos tempos. Mais uma brilhante abordagem sua.
Parabéns pelo artigo !
Muitíssimo coerente, e de uma importância sem tamanho. Adorei ! Adoro sempre !! :)
beijão
Que interessante seu texto. Abordagem perfeita. Disse com propriedade o que está acontecendo com todos nós (menos vc e alguns neandertais! Rsrsrs). Estou viciada! Tbm sou um deles, apesar de ainda conseguir fazer outras coisas na vida. Brincadeiras à parte, vc nos faz refletir seriamente sobre a influência da tecnologia em nossas vidas. Estamos mesmo nos perdendo de nós e perdendo os nossos filhos, companheiros, amigos...sinto falta do abraço de feliz aniversário da família! Esse ano não fui abraçada por nenhum deles, mas estavam lá as mensagens lindas no Facebook... é, meu amigo, precisamos de ajuda! Bjs e parabéns pelo texto. Adorei!
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