Esta é a quinta edição da coluna “Culpa com Feriados Diferentes”. Já espicacei nessas semanas meus amigos cristãos com provocações diversas aos seus ídolos sagrados, mas não fui honrado com uma defesa à altura da sua fé. Como as pessoas têm suas crenças atacados e não as defendem? E olhe que não tenho poupado munição. Onde estão os cristãos? Por que não se defendem de um franco atirador? Será que esta coluna tem textos tão inexpressivos que não merecem uma mísera réplica?.
Já citei na 1ª coluna desta série uma pesquisa realizada nos EUA pelo Gallup que mostra que entre 95% e 80% dos americanos votariam em uma mulher, um católico, um judeu, um negro, um mórmon ou um homossexual para presidente, mas menos de 50% votariam em um ateu.
Pois pesquisa recente encomendada pela VEJA, realizada pela CNT/Sensus, mostra que 84% dos brasileiros votariam em um negro para presidente, 57% dariam o voto a uma mulher, 32% aceitariam votar em um homossexual, mas apenas 13% votariam em um ateu. O levantamento mostra que, entre as minorias (racial, sexual, de gênero...), a mais rejeitada é a anti-religiosa.
A VEJA pergunta: faz sentido rejeitar alguém apenas por não acreditar em Deus? Eu acrescento: e faz sentido rejeitar um negro por ser negro, uma mulher por ser mulher ou um homossexual por ser homossexual? Faz sentido rejeitar alguém por ser o que é?
A historiadora paulista Eliane Moura Silva, especialista em religião, ela própria uma atéia, responde: "O brasileiro ainda entende o ateu como alguém sem caráter, sem ética, sem moral. É um entendimento que se espalha de modo homogêneo por todas as classes sociais.” Em suas aulas sobre ateísmo na Casa do Saber, instituição para intelectuais paulistas ricos, a platéia teve reação fortemente hostil às idéias ateístas.
A neurocientista Silvia Helena Cardoso, doutora em psicobiologia pela Universidade da Califórnia, publicou artigo num jornal de Campinas discutindo se os santos seriam esquizofrênicos, dada a freqüência com que tinham visões – ou alucinações. Recebeu tantas ameaças que abandonou o tema. O professor Antônio Flávio Pierucci, da USP, especialista em sociologia da religião, explica: "Os brasileiros não estão habituados a se confrontar com a realidade do ateu". Por isso os políticos dizem que ninguém é mais temente a Deus do que eles.
VEJA lembra que o Datafolha fez uma pesquisa sobre religiosidade do brasileiro quando Bento XVI esteve por aqui. A pesquisa relevou: 97% acreditam em Deus; 93% crêm que Jesus ressuscitou após a crucificação e 86% concordaram que Maria concebeu sendo virgem. “Com esses números explica-se porque o Brasil está entre os países mais crédulos do mundo. Isso numa era em que abundam descobertas científicas sobre a origem do universo e das espécies. Se a credulidade não se abala diante disso, é lícito questionar que nenhuma prova científica, por mais sólida e contundente, possa abalar a crença no divino.”
Duvido da consistência dessas respostas. Garanto que metade dos que dizem acreditar em Deus não crê em Adão, Eva, dilúvio ou outros dogmas bíblicos. Crer no que diz a Bíblia e no que provou Charles Darwin é como torcer ao mesmo tempo pelo Vasco e pelo Botafogo num jogo. É pior ainda, pois no caso da peleja de Deus X Darwin o empate é o único resultado impossível. Uma pessoa não pode ser criacionista e evolucionista ao mesmo tempo. Crer em Adão, Eva e também nos dinossauros não dá. Mas os cristãos não são exatamente modelos de coerência.
Para os ateus os crentes sempre fazem uma pergunta clichê: “Quem criou o universo?”. E sempre acham que fizerem “a pergunta destruidora”. Os ateus poderiam simplesmente devolver a pergunta com uma outra sob a mesma lógica: “Quem criou o criador?” O impasse é inevitável, mas a ausência de uma explicação natural não exige necessariamente uma explicação sobrenatural. Os religiosos se aproveitam de uma lacuna do conhecimento humano para preenchê-la com o pensamento mágico. A mágica fascina, mas só até descobrirmos o truque. E os truques vêm sendo descobertos e provados pela Ciência há tempos, mesmo sob severa oposição dos Houdinis e Mr. M. de batina.
Mas mesmo assim, acredite, a religião no Brasil está perdendo fôlego. De 1940 a 1970, menos de 1% dos brasileiros se assumiam sem religião. Mas de 1980 para cá esse índice saltou para 7,3%. Os sem-religião (ateus, agnósticos, secularistas, céticos ou aqueles com fé, mas sem-igreja) já são 12,5 milhões, o terceiro maior grupo, atrás apenas de católicos e evangélicos. Na Espanha, Alemanha e Inglaterra, menos da metade da população acredita em Deus. Na França, os crentes não chegam a 30%.
Segundo a pesquisa publicada pela VEJA, a Bahia é o terceiro estado com o maior número de não-religiosos. O Rio está em primeiro lugar. Salvador, entre as capitais, é a campeã nacional: 18% dos soteropolitanos não têm religião. A raiz do fenômeno que irriga a queda dos católicos proporcionalmente ao crescimento de evangélicos e de sem-religião está no fato de que os laços étnicos e culturais dos brasileiros estão se desfazendo como resultado da modernidade, do aumento da escolarização, da profissionalização e da mudança do antigo padrão dominante das famílias com pais quase sagrados de tão crentes e crédulos.
A literatura sobre ateísmo, nesse novo ambiente, tem feito grande sucesso, como é o caso dos best sellers "Deus, um Delírio", do biólogo Richard Dawkins; "Deus Não É Grande", do jornalista Christopher Hitchens, de "Carta a uma Nação Cristã", do filósofo Sam Harris, um manifesto em defesa do ateísmo e do Tratado de Ateologia, do filósofo francês Michel Onfray. Também foi recentemente lançado com grande furor “O Livro Negro do Cristianismo-Dois mil anos de crimes em nome de Deus”. Uma porrada no juízo em qualquer cristão! Não se lê qualquer desses livros impunemente. Ler todos eles e não balançar nas estruturas é coisa para santo.
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