29.6.25

MEMÓRIA DESIMPORTANTE


Depois nasceu meu irmão.

Menos de dois anos foram o suficiente para ameaçar meu mundo. Respondi com calundus, mordidas de tirar sangue e muita manha.

Não lembro. Disseram. E foi suficiente para entrar no imaginário popular dos que se interessaram em lascar com minha vida e poluir as memórias da infância. Não que houvesse muito a ser poluído, deixemos claro.

Mas não era de mim que falava, mas do inoportuno meu irmão, destinatário dos calundus, mordidas de tirar sangue e muitas manhas.

Como conseguir esquecer do episódio: O Remédio do Seu Bidal!

Nem sei se o nome era esse: seu Bidal. Podia ser Vidal, mas a memória registra mesmo um B e um remédio para tosse cuja perda foi atribuída a ele, meu irmão. Um episódio de que ninguém deve se lembrar, mas que não me abandona.

Meu irmão jurava que nem chegou perto do remédio do vizinho da fazenda da nossa infância no interior da história toda, mas meu irmão não era de confiança e seu juramento e nada eram a mesma coisa. Não escapou de muita surra. Ou nem surra mesmo houve, só acusações e defesas vãs. 

Como meu irmão tinha acesso à gaveta onde Seu Bidal guardava seu remédio? O que importa hoje — e sempre —, é saber como é que eu nem sequer tinha visto Seu Bidal e meu irmão tinha acesso até à gaveta dele. A mim é que jamais acusariam já que nem Seu Bidal eu conhecia. 

Ele pode até não ter tocado no remédio, mas criou, certamente, todas as oportunidades para isso.

Onde eu estava? Perdi todas essas oportunidades e muitas outras.

Meus calundus, mordidas de tirar sangue e muita manha podiam até ser memoráveis, mas não deviam ser muito eficientes se nem sequer em um remédio de um vizinho eu era capaz de dar fim.

Mas quem se importa, afinal ? Meu irmão não está mais aqui e ninguém se lembra dessa história sem importância.

Só eu!

27.6.25

OS MELHORES FILMES DO SÉCULO XXI


O Jornal The New York Times divulgou essa semana uma lista dos 100 melhores filmes do século 21 após consulta a mais de 500 diretores, atores e personalidades da indústria cinematográfica mundial. A minha lista seria diferente tanto porque alguns dos meus filmes favoritos não foram citados ou porque os que foram citados não estão na ordem que penso ser a melhor, ou simplesmente porque não os vi ainda.

FILMES DA LISTA QUE EU MUDARIA A CLASSIFICAÇÃO

 

1-Amor à Flor da Pele            era 4º 

2- O Segredo de Brokeback... era 17º

3-Encontros e Desencontros     era 30º

4-Cidade de Deus                         era 15º

5-Kil Bill                                         era 61º

6-Aftersun                                    era 78º

7-Amor                                          era 75º

8-Onde os Fracos Não Têm Vez   era 6º

9-Oldboy                                         era 43º

10-Antes do Pôr-do-Sol                 era 49º

11-Roma                                           era 46º

12-Moonlight                                    era 5º

13-Parasita                                        era 1º

14-Me Chame Pelo Seu Nome       era 37º

15-Cisne Negro                                era 81º


16-Corra!                                         era 8º

17-E Sua Mãe Também                 era 18º

18-Gravidade                                  era 97º

19-Brilho Eterno de uma Mente    era 7º

20-Anatomia de uma Queda        era 26º


20 FILMES QUE NÃO ENTRARAM E QUE EU COLOCARIA NO TOPO


RÉQUIEM PARA UM SONHO E MÃE - De Darren Aronofsky

PINA e DIAS PERFEITOS- De Win Wenders

DANÇANDO NO ESCURO, DOGVILLE e NINFOMANÍACA - De Lars Von Trier

A TRAGÉDIA DE MACBETH e NOMADLAND- Dos irmãos Cohen

AQUARIUS e O SOM AO REDOR- De Kleber Mendonça Filho

CENTRAL DO BRASIL - De Walter Salles

CLOSE e MONSTER – Filmes belga e japonês sobre crianças de 2023

LADY VINGANÇA – De Park Chan-Wook

INCÊNDIOS – De Denis Villeneuve

A PELE QUE HABITO e DOR E GLÓRIA - De Pedro Almodóvar

A GRANDE BELEZA de Paolo Sorrentino

RELATOS SELVAGENS – De Damián Szifron

20 Filmes da Lista do NYT que não vi e alguns não quero ver

A Viagem de Chihiro, O Lobo de Wall Street, Os Excêntricos Tenenbaums, Missão Madrinha de Casamento, Retrato de uma Jovem em Chamas, O Homem Que Mudou o Jogo, Quase Famosos, Wall-e, Embriagado de Amor, O Melhor do Show, Ratatouille, O Ato de Matar, Vidas Passadas, Os Catadores e Eu, Aquário, Conduta de Risco, A Pior Pessoa do Mundo, O Homem Urso, Memórias de um Assassino, Superbad: É Hoje

 

2.6.25

22 LIVROS LIDOS DE JANEIRO A MAIO DE 2025

 


Há 7 anos, publico breves resenhas dos livros lidos durante o ano e divido as postagens em três blocos: Janeiro a Maio, Junho a Setembro e Outubro a Dezembro.

Aqui estão os 22 lidos de Janeiro a Maio deste ano. Esse número ficou na média dos lidos nos mesmos cinco primeiros meses dos últimos anos (27 em 2019; 22 em 2020; 20 em 2021; 21 em 2022; 14 em 2023 e 16 em 2024).


1 - O INSTITUTO – Este foi o 48º livro que li do mestre do terror Stephen King. A obra de 554 páginas tem como vilã não uma pessoa ou entidade, mas um instituto que sequestra crianças com dons de telecinese e telepatia. Nesse local, as crianças sofrem torturas e abusos físicos e mentais. Ficamos sufocados com o nível de maldade que os funcionários do tal Instituto são capazes. Novamente temos o mestre fazendo uma das coisas que faz de melhor: escrever sob o ponto de vista de crianças.
 
 
2- O VALE DO MEDO – Resolvi ler todos os livros escritos pelo autor Sir Arthur Conan Doyle tendo como personagem o mais famoso detetive da literatura: Sherlock Holmes. Já li sete dos nove livros que o autor lançou, entre eles: Um Estudo em Vermelho, O Signo dos Quatro, O Cão dos Baskeville e O Vale do Medo. Neste último romance escrito (os dois volumes seguintes são de contos), Holmes e seu inseparável narrador, o doutor Watson, investigam um assassinato no interior da Inglaterra e somos remetidos à Pensilvânia de 1880 e a um cenário de violência e corrupção comandado por uma organização criminosa secreta de operários de uma mina de carvão.
 
3- UM HOMEM POR INTEIRO – De Tom Wolfe – Segundo livro que li do autor após o excelente A Fogueira das Vaidades, já adaptado para o cinema nos anos 90 pelo diretor Brian de Palma. Aqui, o autor, considerado um expoente do chamado New Journalism americano, em mais der 650 páginas, constrói (e destrói) a figura do bilionário escroque Charles Croker que numa Atlanta do fim dos anos 90 vê seu império ameaçado por poderosos interesses tão inescrupulosos quanto os dele. Foi recentemente adaptada para uma série pela Neflix com Jeff Daniels no papel principal.
 


4 - OS PERSAS – A ERA DOS GRANDES REIS Primeiro livro que li do autor galês Lloyd Llewellyn-Jones, renomado professor de estudos sobre o Irã. Uma fascinante história da Pérsia e seus reis sob o ponto de vista dos próprios persas já que tudo o que sabemos do seu grande império veio por intermédio de escritores gregos como Heródoto. Não havia ainda uma história dos persas baseada em fontes originais que buscasse reconstituir a glória de sua cultura e organização. Um novo olhar sobre reis como Ciro, Xerxes e Dario com detalhes das guerras e curiosidades sobre modo de vida em cidades como Babilônia, Persépolis e Passárgada, passando pela conquista do império por Alexandre. 
 
5 - MOLL FLANDERS – “As aventuras e desventuras da famosa Moll Flanders & Cia. Que nasceu na prisão de Newgate, e ao longo de uma vida de contínuas peripécias, que durou três vintenas de anos, sem considerarmos sua infância, foi por doze anos prostituta, por doze anos ladra, casou-se cinco vezes (uma das quais com o próprio irmão), foi deportada por oito anos para a Virgínia e, enfim, enriqueceu, viveu honestamente e morreu como penitente. Escrito com base em suas próprias memórias”. Com esse impressionante subtítulo, este livro de Daniel Defoe foi publicado em 1722. É surpreendente que um livro escrito no século XVIII por um homem e sobre um tema tão delicado, tenha feito sucesso sem fazer um julgamento moral da personagem.
 
 
6- TREZE CONTOS DE TCHEKHOV – Mais um livro de contos que leio do autor russo Anton Tchekhov, considerado unanimemente como um dos maiores contistas da Literatura. Alguns eu já havia lido em outras coletânias. Aqui temos "História alegre", "A feiticeira", "Fatalidade", "Pesadelo", "Anyuta", "Réquiem", "Um belo tumulto", "O marido", "O caso do champanhe", "Mártires", "O professor de literatura", "O bispo" e "O duelo". Médico, dramaturgo e escritor russo, Tchekhov influenciou diversos artistas modernos com contos que expressam excepcional percepção da condição humana e das relações sociais. Aqui, algumas das suas obras-primas que passeiam entre o cômico e o trágico.
 
 

7- COMO E POR QUE LER
– Há tempos queria ler um livro do famoso crítico literário Harold Bloom. Escrito numa linguagem acessível, Bloom aponta o caminho ideal para o leitor se envolver com as diversas formas literárias e penetrar no mundo criado por escritores como Hemingway, Jane Austen, Dickens, Proust, Dostoievski, Oscar Wilde e, acima de todos, Shakespeare. Ele deixa dicas importantes para quem escreve, como livrar a mente dos chavões profissionais e resgatar a ironia: “Uma vez destituída de ironia, a leitura perde o propósito e a capacidade de surpreender”
 
 
8- POR QUE NÃO PEDIRAM A EVANS ? – É sempre excelente retornar aos livros da Dama do Crime, a autora de quem mais livros li. Aqui temos uma história sem os seus famosos detetives Hercule Poirot e Miss Marple, personagens queridinhos dos leitores. Numa tarde comum do litoral inglês, durante um jogo de golfe, Bobby encontra um homem moribundo, que antes de morrer faz uma pergunta estranha: "Por que não pediram a Evans?". A única pista é a foto de uma jovem na carteira do morto. A partir dessa cena, Bobby e sua amiga Frances Derwent decidem desvendar o enigma que os levará a um quebra-cabeças envolvendo golpes e tramoias perigosas. Agatha Christie sempre consegue surpreender.
 
9 - UM PASSE DE MÁGICA – Mais um livro que li de Agatha Christie dessa vez voltando a ter a queridíssima Miss Marple desvendando um crime. Amiga de infância das irmãs Ruth e Carrie Louise, Miss Marple é chamada por Ruth para investigar os problemas e perigos que a sua irmã estaria correndo em uma mansão repleta de familiares de diversos casamentos e que virou um centro de reabilitação para meninos delinquentes. Após três crimes na casa, Miss Marple resolve o mistério antes que sua amiga seja a próxima vítima. Curiosamente, este foi um dos raros livros da autora que eu desconfiei de cara sobre quem era o assassino.

 
10- 
OS QUATRO GRANDES - Terceiro livro de Agatha Christie que li nestes primeiros meses de 2025. Aqui temos de volta o detetive belga Hercule Poirot que junto ao seu inseparável amigo Hastings são surpreendidos por um homem à beira da morte que denuncia a Poirot um complô internacional de autoria de um chinês um multimilionário norte-americano, uma cientista francesa, e "O Destruidor" Na maior investigação de sua carreira para derrotar essa grande organização, Poirot terá que sacrificar o seu bem mais precioso: seu bigode! O livro poderia ser um pouco mais bem amarrado e isso de deve ao fato de ele ser sido editado a partir de contos anteriormente publicados em um jornal e reunidos de modo um pouco forçado para formar uma história mais ou menos coesa. Algumas pontas soltas ficam evidentes.
 
11- NADANDO NO ESCURO- Primeiro e espetacular livro do jovem autor alemão Tomasz Jedrowski em que ele mescla política e afetos na história de Ludwik e Janusz  dois homens jovens entrelaçados em uma paixão muito maior do que a onda de intolerância e violência que assolou a Polônia em 1980. Livro emocionante e complexo entre duas pessoas em diferentes lados de uma história conturbada. Tristíssimo e lindo, ainda mais com diversas referências a um dos meus livros e autores favoritos, Giovanni, de James Baldwin, que aqui funciona como verdadeiro eco dos dilemas amorosos de dois rapazes lutando ingloriamente contra todo um sistema para fazer valer o seu amor.
 

 
12- PERSUASÃO – Quinto livro que li da excepcional Jane Austen após Orgulho e Preconceito, Razão e Sensibilidade, A Abadia de Northanger e Mansfield Park. Aqui temos mais uma das heroínas de Austen, na figura de Anne Elliot, a sagaz e equilibradíssima filha de um vaidoso baronete que se apaixona por um jovem sem fortuna ou contatos. No passado, Anne sacrificou seu amor por conveniências e se fechou para novos relacionamentos, mas anos depois, o destino faz os dois jovens se reencontrarem dando a Anne uma segunda oportunidade de tentar a felicidade. Ambientado na Inglaterra rural do século XIX, no último romance de Jane Austen a escritora revela sua maturidade literária.
 
 
13- ÓRFÃOS DO ELDORADO – Quarto livro que li do escritor amazonense Milton Hatoum após suas obras Dois Irmãos, Relato de um Certo Oriente e A Cidade Ilhada. Aqui, temos a história de Arminto Cordovil e seu amor por Dinaura que o arrebata afastando-o da riqueza derivada do trabalho de uma vida do seu pai empresário de navegação e exploração da borracha. Arminto destrói tudo que o pai construiu ao longo das décadas pelo amor da órfã filha da floresta.
Dinaura leva com ela as incertezas, a racionalidade de Arminto que a busca, por toda a vida, até a esperada entrada no Eldorado, seu idílio representado pelo amor romântico e pela harmonia filial. Os três livros anteriores que li do autor já foram adaptados para as telas. 
 
14 - O CONDE DE MONTE CRISTO – Considerada uma das obras primas da Literatura mundial, esta monumental obra de Alexandre Dumas, com mais de 1.300 paginas e várias vezes adaptada para o cinema, é um tratado sobre a vingança numa trama protagonizada pelo jovem marinheiro Edmond Dantés, preso injustamente e vítima de um complô. Muitos anos depois, Edmond escapa cinematograficamente da prisão, toma posse de um magnífico tesouro escondido e planeja uma vingança. A obra foi originalmente publicada em capítulos em um jornal francês e obteve gigantesco sucesso elevando Dumas aos píncaros da fama. Com uma coleção de personagens sórdidos e carismáticos e apesar do imenso número de páginas, a leitura jamais é cansativa.
 
 
15- O SEGREDO DO MEU MARIDO – Primeiro livro que li da autora australiana Liane Moriarty que se tornou famosa após a elogiada adaptação pela HBO do seu livro Big Little Lies. Aqui, a autora aborda seu universo favorito: amizades e conflitos entre mulheres. O livro alcançou o 1º lugar na lista dos mais vendidos do New York Times duas semanas após seu lançamento e seus direitos de adaptação para as telas já foram adquiridos. História de três mulheres, entre elas, Cecilia, que tem três filhas perfeitas, um marido adorado e uma vida organizada que será profundamente abalada ao encontrar uma carta escrita pelo marido ainda vivo e que só deve ser lida após sua morte. Um livro com um desenvolvimento surpreendente mas que tem uma capa medonha.
 

16- 
AS CRUZADAS VISTAS PELOS ÁRABES – Do autor libanês Amin Maalouf. Sou fascinado pelas Cruzadas e quase todas as histórias sobre elas foram publicadas ao longo dos séculos sob o ponto de vista cristão e ocidental. É raríssimo encontrar um livro que conte a invasão cristã aos países do oriente médio sob a ótica dos árabes. Os cristãos permaneceram por dois séculos na Terra Santa, saqueando e massacrando para a glória de seu deus. Esta bárbara incursão do Ocidente no coração do mundo muçulmano marca o início de um longo período de decadência e obscurantismo. Ainda hoje é sentida, no Islã, como a pior das violações.
 
17- ISABEL DE CASTELA – A Primeira Grande Rainha da Europa. Primeiro livro que li do historiador Giles Tremlett. Isabel foi a monarca mais relevante de toda a História. Seu reinado começou quando ainda nem existia o país Espanha. O livro de mais de 600 páginas acompanha desde a luta de Isabel para substituir os dois irmãos no trono, passando por guerras civis, o casamento com o poderoso rei Fernando de Aragão, enfrentando também o preconceito por ser uma mulher. Em seguida vemos sua guerra contra os mouros que ocupavam parte do país por 700 anos, o financiamento da conquista da América por Colombo, a Inquisição com suas torturas, a expulsão dos judeus e mouros da Espanha e muito mais. O autor faz com que o leitor se sinta dentro da história.
 
18 e 19 - O MISTÉRIO DE MARIE ROGÊT e A CARTA ROUBADA – de Edgar Allan Poe – Aqui estão os dois últimos contos de Poe tendo como personagem o inconfundível detetive Dupin, sobre quem eu só havia lido o famosíssimo Os Crimes da Rua Morgue. Dupin demonstra novamente sua assustadora capacidade de dedução para desvendar um assassinato utilizando apenas notícias publicadas nos jornais da época sem sequer sair de casa. O conto pode parecer cansativo pela repetição das contradições dos jornais. Poe escreveu a partir do assassinato de Mary Cecilia Rogers, um crime real nunca solucionado, que aconteceu em 1841 em Nova Iorque que ele transferiu para Paris.

Na Carta Roubada, diferente de O Mistério de Marie Rogêt e Os Crimes da Rua Morgue, não há um assassinato, mas justamente o que diz o título, uma carta roubada em que o detetive Chevalier Auguste Dupin, com sua incrível lógica e capacidade de raciocínio analítico, descobre o esconderijo de uma importantíssima carta roubada a partir do conhecimento dos mecanismos de pensamento do autor do roubo. Esse personagem foi tão importante para a literatura policial que originou simplesmente os detetives Poirot de Agatha Christie e Sherlock Holmes de Arthur Conan Doyle.

 
 
20- O REI PESTE, O RETRATO OVAL e A QUEDA DA CADA DE USHER – Três contos clássicos de Edgar Allan Poe com características sobrenaturais. 
O Rei Peste se passa na Inglaterra da Idade Média durante o reinado de Eduardo III. Dois marinheiros bêbados e descritos de modo ridículo, ao fugirem de uma dona de um bar, entram em uma casa abandonada durante uma praga em Londres e encontram uma corte bizarra liderada pelo Rei Peste e sua comitiva grotesca, resultando em eventos estranhos e sombriamente engraçados. Narrativa intrigante que mescla horror com humor.

21- O RETRATO OVAL - C
onto sombrio como é comum nos escritos de Poe sobre um homem ferido que passa a noite num quarto de um castelo onde se impressiona com o retrato de uma bela mulher. Ao pesquisar a respeito, descobre que o marido, pintor apaixonado, resolveu retratar a amada por tanto tempo que não percebeu que ela ficou doente e definhou até a morte.
 
22- A QUEDA DA CADA DE USHER – Conto que já foi adaptado mais de uma vez para o cinema.
Além de ser uma das suas obras mais conhecidas, é uma síntese do estilo literário de Edgar Allan Poe: ambiente decadente, tempestades, personagens perturbados, mulheres frágeis e acontecimentos sobrenaturais. Narrado por um homem que vai passar um tempo na mansão de seu amigo e lá encontra um o ambiente assustador envolvendo os mistérios que ligam a mansão aos seus moradores mórbidos. Logo nas primeiras linhas, o leitor já sabe que vai encontrar problemas para o narrador: “Durante todo um dia pesado, escuro e mudo de outono, em que nuvens baixas amontoavam-se opressivamente no céu, eu percorri a cavalo um trecho de campo de tristeza singular, e finalmente me encontrei, quando as sombras da noite se avizinhavam, à vista da melancólica Casa de Usher. Não sei como foi – mas, ao primeiro olhar que lancei à construção, uma sensação de insuportável angústia invadiu meu espírito.”

30.5.25

+ LICENÇA POÉTICA PARA MATAR CANÇÕES


Publiquei há alguns dias um texto apontando erros gramaticais em músicas conhecidas, lembrando que artistas e público costumam perdoar as falhas alegando “licença poética”.

Licença poética é legítima quando o “erro” é proposital e em função da arte, mas não é aceitável quando é fruto do desconhecimento da norma, principalmente em canções famosas.  Então qualquer um pode escrever uma pedrada e justificar o erro como “licença-poética”.

É perdoável o desvio gramatical nas falas coloquiais ou entre pessoas humildes que não têm obrigação do uso da norma correta. O que me intriga é a legião de politicamente corretos defensores da falha gramatical como em um libelo pela liberdade de expressão.

Pois eu acho o politicamente correto uma das coisas mais chatas e cansativas que existem.

Aqui continuo o primeiro texto apontando músicas com erros imperdoáveis.

Outras, têm erros que só embelezam as canções.

MULHER- ERASMO CARLOS

Essa letra tem dois erros gramaticais. O primeiro no verso (Do barro de que você foi gerada/Me veio inspiração/Pra decantar você nessa canção). Há uma repetição da palavra DO. O certo seria “Do barro que você foi gerada.”

Mas o erro mais gritante está no verso (Mas pra quem deu luz não tem mais jeito). O correto é deu à luzEntendo que a correção feriria a métrica do verso de 10 para 11 sílabas, mas isso poderia ser corrigido com a construção: “Pra quem deu À luz não tem mais jeito”, que respeitaria a métrica e ainda deixaria elegantemente implícito — com uma elipse —, o “mas”, graças ao sentido adversativo da frase. (Quero uma mulher só minha/ “MAS” Pra quem deu À luz não tem mais jeito / Porque um filho quer seu peito.

ONDAS SONORAS- ED MOTTA

Há um erro de conjugação do verbo POR no subjuntivo no seguinte trecho da letra desta canção: Ondas sonoras/ A banhar as tardes, de sol/ E o que mais vier/ Quando ele se por.

O certo seria: Quando ele se puser

Tal erro fica mais evidenciado quando se vê que o lógico seria usar a palavra puser, que rima com o verso anterior (E o que mais vier/ Quando ele se puser). 

NÃO OLHE PRA TRÁS- CAPITAL INICIAL

Aqui há outro erro de conjugação do subjuntivo, mas do verbo VER.

 “Nem tudo é como você quer/ Nem tudo pode ser perfeito/ Pode ser fácil se você/ Ver o mundo de outro jeito”

O certo seria:Pode ser fácil se você/ VIR o mundo de outro jeito”

Tanto no caso de Ondas Sonoras quanto de Não Olhe Pra Trás a correção do tempo do verbo não geraria qualquer problema com a métrica das canções não sendo nada menos do que erro por descaso com a regra e não por licença poética.

COWBOY FORA DA LEI -  RAUL SEIXAS

Essa música tem um erro de interpretação na sua letra. No trecho (Eu não preciso ler jornais/ Mentir sozinho eu sou capaz/ Não quero ir de encontro ao azar).

O autor queria dizer: não quero ir na direção do azar (Não quero IR AO ENCONTRO do azar), mas o que escreveu foi o oposto (Não quero ir DE ENCONTRO ou seja, na direção contrária ao azar).

DE encontro A significa o oposto de AO encontro DE. 

ENTRE TAPAS E BEIJOS – LEANDRO E LEONARDO

Essa música tem um pleonasmo no trecho: Se me manda ir embora/ Eu saio prá fora/Ela chama pra trás.

Reconhecendo o erro, um dos seus autores, o cantor Leonardo, passou a corrigir a frase nas suas apresentações ao vivo quando canta: Se me manda ir embora/ Eu saio lá fora/Ela chama pra trás.

 

NÃO DIGA NADA – PEDRO MARIANO

Essa música tem um erro na conjugação do imperativo: “Olha pra mim/não diga nada...Sonha pra mim...Deixe o vento varrer as palavras).

Há um falar coloquial no Sudeste do Brasil em que se conjuga errado os imperativos, o que não ocorre na Bahia por exemplo. O erro fica mais estranho quando notamos que o autor conjuga, na letra, alguns verbos corretamente e outros não.

Ele deveria unificar a conjugação seja usando o modo imperativo correto ou o incorreto. Então ficaria OLHE pra mim/ NÃO DIGA nada... SONHE pra mim...DEIXE o vento varrer as palavras)

Um exemplo do uso correto do imperativo está na canção TENTE OUTRA VEZ de Raul Seixas (Veja/ Não diga que a canção está perdida/ Tenha fé em Deus, tenha fé na vida/ Tente outra vez/ Beba/ Levante sua mão sedenta e recomece a andar/Queira..) 

ONDE VOCÊ MORA – CIDADE NEGRA

O título da canção está com uso correto do Onde, já que se refere ao verbo morar, que não indica movimento.

Mas há erros nos versos Aonde você mora?/ Aonde você foi morar?/Aonde está você?

O advérbio/pronome interrogativo correto seria, como está no título: ONDE,  já que não se refere a verbos de movimento. 

ADMIRÁVEL CHIP NOVO - PITTY

O mesmo erro da música acima está no trecho dessa canção da cantora baiana nos versos: Pane no sistema, alguém me desconfigurou /AONDE estão meus olhos de robô?

O certo seria o uso do pronome interrogativo ONDE pela mesma razão da música anterior: indica verbo estático. 

ME CHAMA-LOBÃO

Essa música tem dois erros mas ambos podem ser perfeitamente aceitáveis por conta da licença-poética.

O primeiro erro está na falha à regra que diz que não se inicia uma oração com pronomes oblíquos. Porém, isso se tornou tão frequente que é já atribuído ao tom coloquial e regional adequado na canção. Isso se vê nos versos "Me dá vontade de saber/Me telefona/Me chama."

O outro erro está no uso  do imperativo. O correto seria ME CHAME e ME TELEFONE, mas também aqui pode ser aceito por conta da coloquialidade. 


BEIJA EU- MARISA MONTE

Essa canção tem construção que é gramaticalmente desviante da norma, mas com versos muito sofisticados, bem construídos e respeitando a lógica interna da canção como Beija Eu/Molha Eu/Seca Eu/Deita e Aceita Eu.

Caso a construção fosse alterada para a forma correta, a letra perderia o seu aspecto lindo do falar coloquial e também o seu impacto sonoro e estético.

PRINCIPIA – EMICIDA

Essa canção tem letra elaboradíssima, como é comum nas músicas de Emicida e o belo refrão: TUDO QUE NÓIS TEM É NÓIS. É, obviamente, uma fuga da norma padrão que pediria outra construção. 

Mas a perfeição estilística da letra original é tão maravilhosa e reflete tão bem o linguajar das comunidades periféricas paulistanas, contrastando intensamente com a sofisticação do conteúdo dos versos, que tal "erro" embeleza mais ainda a ideia da canção.

DETALHES – Roberto Carlos

Aqui há uma frase interessante (Duvido que ele tenha tanto amor e até os erros do meu Português ruim)

Já li pessoas apontando erro gramatical no uso do verbo duvidar, transitivo indireto, pedindo assim um complemento e que o correto seria DUVIDO DE.

Há gente que diz que há um erro proposital no verso que se justifica no verso seguinte: “Até os erros do meu Português ruim e que seria um recurso metalinguístico de intertextualidade implícita (Por eu ter um Português ruim, uso o verbo duvidar errado).

Seria tudo lindo se não fosse uma bobagem. O verbo duvidar pode sim ser transitivo indireto, mas também pode, noutro contexto, ser transitivo direto e dispensar a preposição DE QUE.

É esse o caso citado: Duvido que ele tenha tanto amor. O verbo está seguido de uma oração completiva (oração que completa o sentido do verbo).

Não temos erro algum aqui e toda a análise poética metalinguística seria linda se não fosse uma viagem de quem interpreta a intenção do autor.

ANDAR COM FÉ- GILBERTO GIL

Aqui os versos: “Andá com fé eu vou/Que a fé não costuma faiá” tem uma sonoridade interessante. O título da música é Andar com fé, mas o verso é andá, bastante regional e coloquial, fazendo uma rima com faiá.

O autor poderia optar pela construção gramaticalmente correta: Andar com fé eu vou/Que a fé não costuma falhar, mas convenhamos que não teria a mesma beleza.


ASA BRANCA – LUIZ GONZAGA

Toda essa canção trás a carga do falar típico do homem nordestino pobre e pouco alfabetizado e isso é uma das coisas mais autênticas e belas da letra. 

Não haveria o mesmo impacto se obedecesse às regras da gramática como nos versos: “Quando OIEI a terra ardendo/QUÁ fogueira de São João/Eu PREGUNTEI a Deus do céu / Nem um pé de PRANTAÇÃO/Por FARTA d'água,  perdi meu gado/ INTÉ mesmo a asa branca/ ENTONCE eu disse: Adeus, Rosinha.”. 

FLOR DA PELE E ALMA NOVA- ZECA BALEIRO

Essas duas canções têm casos interessantes.

Em Flor da Pele o autor escreve (Ando tão à flor da pele/ Qualquer beijo de novela me faz chorar... Às vezes me preservo/ Noutras, suicido.

Há um suposto erro gramatical no uso do verbo suicidar que pode ser escrito “eu suicido” (a origem do verbo é do latim. Sui = a si e cídio = matar). Correta é a construção sem o pronome reflexivo se. Seu uso pode caracterizar até mesmo uma redundância.

Sobre a canção Alma Nova, alguns implicantes apontam cacofonia na frase "Calma alma minha/Calminha, ainda não é hora de partir" e "Calma alma minha/Calminha, você tem muito que aprender"

Realmente, a sonoridade da frase “calma alma minha” parece feio, lembrando a palavra maminha, um clássico caso de cacófono. Pode até soar feio, mas nesse caso há o mérito louvável de brincar com as palavras .